São 365 dias, dezenas de milhares de mortos, mais de 1,7 mil brasileiros retirados da zona de conflito e um novo palco de tensão que se delineia. Nesta segunda-feira (7), a mais recente guerra entre Israel e Hamas completa um ano.
No amanhecer de 7 de outubro de 2023, um sábado, terroristas liderados pelo Hamas cruzaram a fronteira e iniciaram um massacre no território israelense por ar, água e terra. Mataram soldados e cidadãos comuns, além de sequestrar mais de 200 pessoas.
Em resposta, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, declarou guerra ainda em 7 de outubro. No dia seguinte, a declaração oficial foi feita.
Entre os fatos recentes, estão a escalada na violência entre Israel e o grupo Hezbollah, do Líbano, os ataques do Irã com uso de mísseis balísticos e as ameaças de Israel em resposta aos bombardeios.
Zero Hora resume abaixo alguns dos principais momentos deste um ano de conflito.
Ataque do Hamas
O ataque sofrido por Israel em 7 de outubro do ano passado — dia de Simchat Torá, uma das principais datas do calendário judaico — foi feito, principalmente, com foguetes lançados a partir da Faixa de Gaza. Segundo o governo israelense, a parte sul foi a mais atingida. Junto aos bombardeios, milicianos se infiltraram em Israel por mar e por terra, invadindo comunidades.
O Hamas, considerado um grupo terrorista por países como Estados Unidos, Reino Unido e Japão, além de nações europeias, reivindicou a autoria do atentado. À época, autoridades do movimento trouxeram, entre as justificativas, a disputa em torno da mesquita de al-Aqsa, em Jerusalém, assim como o cerco à Faixa de Gaza — Israel mantém um bloqueio à região desde que o Hamas assumiu o poder total da área, em 2007.
A agressão dos terroristas foi lançada em um contexto em que Israel e Arábia Saudita, sob mediação dos Estados Unidos, negociavam o estabelecimento de relações bilaterais, uma abordagem condenada pelo Hamas e pelo Irã.
Brasileiros entre as vítimas
Em um dos locais atacados, na parte sul de Israel, a rave Universo Paralello — festa de música eletrônica criada no Brasil pelo pai do DJ Alok — foi interrompida pela onda de violência. Três brasileiros que estavam no evento morreram.
Um deles foi o gaúcho Ranani Glazer, 23 anos, que teve a morte confirmada em 9 de outubro. No dia seguinte, foi a vez da jovem carioca Bruna Valeanu, 24. E no dia 13, a de Karla Stelzer Mendes, 42, também do Rio de Janeiro.
Na rave, pelo menos 370 pessoas foram assassinadas.
Dos ataques realizados no festival e em cidades fronteiriças, os terroristas levaram 251 reféns e corpos para a Faixa de Gaza. Conforme levantamento realizado pela agência de notícias AFP, a estimativa é de que, neste momento, 97 pessoas ainda estejam em cativeiro, embora o exército israelense considere que 33 já tenham morrido.
Em 22 de outubro do ano passado, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil foi informado sobre o desaparecimento de mais um cidadão brasileiro em Israel: Michel Nisembaum, 59. Em 24 de maio deste ano, o corpo dele foi um dos três recuperados pelo exército israelense na Faixa de Gaza.
A contagem de vítimas brasileiras inclui:
- Três brasileiros mortos em Israel: Ranani Glazer, Bruna Valeanu e Karla Stelzer
- Três israelenses com ascendência brasileira mortos em Israel: Gabriel Yishay Barel, Celeste Fishbein e um terceiro sem identificação
- Um brasileiro-israelense morto: Michel Nisembaum
- Dois brasileiros mortos no Líbano: Ali Kamal Abdallah e Mirna Raef Nasser
Resposta israelense
Ainda em 7 de outubro, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, lançou a operação Espadas de Ferro e declarou que o país havia entrado em guerra.
— Cidadãos de Israel, estamos em guerra. Não numa operação, não em rondas, em guerra — disse à população israelense em mensagem de vídeo.
A partir de então, Israel passou a lançar bombardeios em direção à Faixa de Gaza. Diante da resposta, o Hamas ameaçou matar um refém para cada bombardeio.
Foram convocados cerca de 300 mil reservistas. Militares israelenses se posicionaram ao longo da fronteira à espera de uma ordem para entrar por terra na zona de conflito. Em 13 de outubro, em preparação, o exército ordenou que os 1,1 milhão de habitantes do norte da Faixa de Gaza partissem para o sul.
Desde o início, o objetivo, segundo Netanyahu, é aniquilar o Hamas e resgatar os reféns.
Em contrapartida, Hamas e aliados seguem realizando ataques contra Israel e tentativas de invasão. Em dezembro, na primeira declaração pública desde 7 de outubro, Yahya Sinwar, líder do Hamas, declarou que o grupo enfrentava uma "batalha feroz, violenta e sem precedentes" e ressaltou que não desistirá.
Entrada por terra
*Vídeo publicado em 12 de outubro de 2023
No fim de outubro, as tropas israelenses entraram por terra na Faixa de Gaza. Até então, a última ação deste tipo feita por Israel na região, em grande escala, havia sido em 2014, durante uma guerra de 50 dias contra o Hamas.
No início de novembro, o cerco se acirrou no norte da Faixa de Gaza — esta parte era o enfoque da primeira fase da ofensiva. Em dezembro, a estratégia militar incluiu a metade sul do território, onde milhares de civis se refugiavam.
Israel passou a ordenar que os cidadãos saíssem de Khan Younis, a segunda maior cidade da Faixa de Gaza, e de áreas próximas — um alerta de que operações ocorreriam ali. E, no fim daquele mês, os ataques foram intensificados nesta região e em áreas mais centrais do território.
No primeiro dia de 2024, o exército retirou algumas tropas e tanques da Faixa de Gaza, como parte da tática para o conflito no novo ano, que incluiria justamente a redução do poderio militar na região. Dias depois, os militares afirmaram que haviam concluído as operações na parte norte, focando no sul e na área central. Em abril, foi a vez de retirar parte das tropas da região sul.
Com mais de 1 milhão de pessoas, a cidade de Rafah se tornou, então, um novo alvo e suscitou o alarme global, inclusive do principal aliado de Israel, os Estados Unidos, que exigiram um plano para que civis fossem protegidos. Rafah fica no extremo-sul da Faixa de Gaza e é a única saída da região fora do controle israelense. Em maio, a operação se expandiu para lá.
Desde o princípio, de acordo com os militares, as operações miram estruturas do Hamas, além dos integrantes do grupo. Sob essa justificativa, em uma das ocasiões, Israel invadiu o maior hospital da Faixa de Gaza, o Al Shifa e, em outra, uma escola da Agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para os Refugiados Palestinos.
Voos de resgate
Com o início do conflito, brasileiros passaram a pedir auxílio do governo federal para sair da zona de conflito. Com apoio da Força Aérea Brasileira (FAB), 1.560 pessoas foram resgatadas de Israel, Cisjordânia e Faixa de Gaza.
O primeiro avião com esse objetivo decolou do Brasil em 8 de outubro com destino a Roma, na Itália. O ponto seguinte foi Tel Aviv, em Israel, de onde partiu no dia 10, com 211 passageiros. A aeronave pousou em solo brasileiro na madrugada de 11 de outubro. Um dos resgatados chegou a declarar:
— Agora eu quero o abraço da família.
Incertezas na passagem de Rafah
*Vídeo publicado em 1º de novembro de 2023
Ainda no início de outubro, Egito, Israel e Estados Unidos concordaram em permitir que estrangeiros na Faixa de Gaza saíssem da região, pelo posto de fronteira de Rafah, rumo ao Egito. Segundo um funcionário do governo egípcio, o Catar esteve envolvido nas negociações e houve aprovação do Hamas e da Jihad Islâmica, grupo também inimigo de Israel e apoiado pelo Irã.
Os primeiros estrangeiros — nenhum brasileiro — conseguiram atravessar a fronteira em 1º de novembro. Naquele momento, listas de autorizações iam sendo divulgadas. Mais de uma vez, a fronteira foi fechada.
A saída dos brasileiros foi permitida em 10 de novembro, mais de um mês após o início da guerra. Mas o grupo de 32 pessoas só conseguiu atravessar a passagem dois dias depois. O voo em que foram acomodados tocou o solo brasileiro em 13 de novembro, em escala no Recife, chegando na noite do mesmo dia em Brasília.
— Além de estar feliz, também estou preocupada porque eu já perdi muitos familiares e muitas amigas. Queria muito poder ajudar a tirar nossos familiares de lá — disse uma das resgatadas.
Ao todo, segundo o Ministério das Relações Exteriores do Brasil, 13 voos foram realizados para trazer brasileiros e parentes ao país. Oito vieram de Israel, um da Cisjordânia e quatro da Faixa de Gaza. A última saída foi em 8 de fevereiro.
Mas, em setembro de 2024, com os bombardeios entre Israel e Hezbollah, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou que voos de repatriação FAB também tragam os brasileiros que estão no Líbano. Uma primeira aeronave trouxe 229 repatriados.
Semana de cessar-fogo
Após semanas de negociações, Israel e Hamas chegaram a um acordo em 21 de novembro, prevendo a libertação de 50 reféns em troca da interrupção dos ataques aéreos e terrestres na Faixa de Gaza e da soltura de cerca de 150 palestinos detidos em Israel. No mês anterior, algumas reféns chegaram a ser liberadas, mas em baixo número.
A trégua de novembro teve início na manhã do dia 24, uma sexta-feira. Naquele dia, o Hamas libertou 24 reféns em troca de 39 palestinos presos em Israel.
Os quatro dias de trégua foram prorrogados duas vezes, até que o acordo expirou em 1º de dezembro, com trocas de acusações sobre violação dos termos. Uma das situações que gerou impasse foi a morte de pelo menos três pessoas em um ataque com arma de fogo em Jerusalém, um dia antes do fim da trégua, reivindicado pelo Hamas.
Durante o breve cessar-fogo, 80 reféns israelenses foram liberados em troca de 240 prisioneiros. Mais de 20 estrangeiros, a maioria tailandeses, também foram liberados, mas fora do acordo.
Ajuda humanitária
Com o conflito deflagrado, a Faixa de Gaza teve o cerco reforçado por Israel. A região começou a registrar falta de alimentos, água e remédios, além de eletricidade, combustíveis e internet.
Devido às condições, o governo do Egito passou a permitir a entrada de ajuda humanitária na região, via fronteira de Rafah. Uma primeira passagem de 20 caminhões, ocorrida em 21 de outubro, foi aceita após negociações entre Egito e Israel intermediadas pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.
Ainda em outubro, a Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinos relatou que uma multidão de residentes invadiu armazéns e centros de distribuição em busca de farinha e itens essenciais na Faixa de Gaza.
A trégua de novembro permitiu a entrada de mais ajuda humanitária, mas insuficiente. O Programa Alimentar Mundial chegou a alertar para "risco de fome", e a Organização Mundial da Saúde (OMS) afirmou ter registado um "aumento massivo" de doenças contagiosas, em um momento em que diversos hospitais na Faixa de Gaza estavam inoperantes.
Falta de consenso internacional
Considerado o colegiado mais importante das Nações Unidas, o Conselho de Segurança iniciou ainda em outubro do ano passado reuniões para discutir propostas de resolução da guerra. A entidade é formada por cinco membros-permanentes (Estados Unidos, França, Reino Unido, Rússia e China) e 10 rotativos, incluindo o Brasil. O órgão é dedicado a mediar e resolver conflitos internacionais.
Para aprovar uma resolução, é preciso o apoio de nove dos 15 membros. Nenhum dos permanentes pode vetar o texto. Em outubro de 2023, quando o conflito foi deflagrado, o Brasil presidia o grupo.
A primeira proposta de resolução da guerra partiu da Rússia e foi para votação em 16 de outubro. O texto falava em cessar-fogo imediato, abertura de corredores humanitários e liberação de reféns, mas não condenava diretamente o Hamas pelos atos de violência cometidos. A proposta não teve votos a favor suficientes para ser aprovada. Nos dias seguintes, Brasil, Rússia e Estados Unidos também apresentaram seus planos, todos rejeitados.
Até que, em 15 de novembro, o Conselho de Segurança aprovou o texto apresentado por Malta. A proposta pedia pausas, corredores humanitários e liberação de reféns. Foi a primeira vez que o órgão adotou uma resolução sobre o conflito envolvendo Israel e Palestina desde 2016.
Após outras propostas serem frustradas, incluindo uma dos Estados Unidos, o Conselho de Segurança aprovou, em março de 2024, a primeira resolução que pedia cessar-fogo imediato. No mês seguinte, um novo texto americano também foi aprovado, pedindo que o cessar-fogo fosse implementado imediatamente e sem condições.
As ações tomadas pelo conselho são obrigatórias para todos os países membros da ONU, segundo a entidade, que pode também impor sanções.
Outras manifestações internacionais:
- Diante dos impasses do Conselho de Segurança, em 27 de outubro, a Assembleia Geral da ONU decidiu adotar uma resolução que pedia trégua humanitária imediata e acesso de ajuda à Faixa de Gaza, além da proteção aos civis. Em dezembro, a assembleia aprovou uma resolução que pedia cessar-fogo e libertação imediata dos reféns.
- Ainda em novembro, a União Europeia condenou o Hamas por usar "hospitais e civis como escudos humanos" na Faixa de Gaza e pediu que Israel priorizasse a proteção de civis em incursões e bombardeios no enclave palestino.
- No mesmo mês, dirigentes árabes e muçulmanos, durante a cúpula da Liga Árabe e da Organização de Cooperação Islâmica, negaram que Israel estivesse agindo em legítima defesa na Faixa de Gaza e exigiram o fim imediato das operações militares na região.
- Em reunião também em novembro, os ministros das Relações Exteriores do G7 — sete nações mais industrializadas do mundo — expressaram apoio às "pausas e corredores humanitários" no conflito, mas sem pedir um cessar-fogo.
- Em janeiro de 2024, o órgão máximo judicial da ONU, a Corte Internacional de Justiça, instou Israel a evitar qualquer possível ato de genocídio durante a ofensiva militar na Faixa de Gaza, mas evitou pedir formalmente um cessar-fogo.
- Em abril, os governos de Brasil, Estados Unidos, Argentina e outros, em um total de 18 países, divulgaram nota conjunta na qual pediram a libertação de todos os reféns na Faixa de Gaza.
- Em maio, a Corte Internacional de Justiça ordenou que Israel suspendesse "imediatamente" a ofensiva em Rafah. O tribunal, porém, não tem força policial para fazer que suas ordens sejam cumpridas.
Extensão do conflito
Receio de especialistas e governos e pauta do Conselho de Segurança das Nações Unidas, a expansão do conflito para fora dos limites entre Israel e Faixa de Gaza foi ganhando força.
Desde o início da guerra, por exemplo, houve confrontos na Cisjordânia. O território fica entre Israel e Jordânia e é disputado por palestinos e israelenses desde 1948, sendo ocupado por Israel desde 1967. Em agosto de 2024, uma operação israelense, em grande escala, começou a mirar grupos armados na região.
Nas águas, os rebeldes houthis, grupo do Iêmen, já fizeram diversos ataques a navios, principalmente no Mar Vermelho, para prejudicar o tráfego marítimo internacional. Estados Unidos e Reino Unido revidaram as agressões, com apoio de outros países.
Os houthis alegam atuar em solidariedade ao Hamas. Em julho, também reivindicaram um ataque com drone em Tel Aviv, em Israel.
Ainda em apoio ao Hamas, o Irã atacou o território israelense com drones e mísseis em 13 de abril. Foi uma retaliação a um bombardeio contra o seu consulado em Damasco, capital da Síria, em 1º de abril, atribuído a Israel.
Na fronteira norte israelense, uma outra zona de duelos quase diários: o grupo Hezbollah, organização muçulmana xiita com base no Líbano, apoiada pelo Irã e aliada do Hamas, desde o princípio realiza ataques com tiros e mísseis contra Israel.
Houthis, Hamas e Hezbollah são alguns dos membros do autoproclamado "eixo de resistência", grupo de movimentos armados hostis a Israel e apoiados pelo Irã.
Hezbollah e Irã
Embora as agressões sejam constantes desde 7 de outubro de 2023, os confrontos entre Hezbollah e Israel se acirraram nas últimas semanas.
Em 25 de agosto, um momento de destaque: o Hezbollah promoveu um ataque com drones e foguetes em larga escala contra Israel em retaliação ao assassinato de um de seus líderes. Em resposta, o governo israelense bombardeou o sul do Líbano, reduto do Hezbollah, e declarou situação de emergência.
Desde agosto, o Itamaraty recomenda que brasileiros abandonem a região ou não viajem ao Líbano nesse momento.
Em 17 de setembro, pelo menos 12 pessoas morreram e cerca de 2,8 mil ficaram feridas devido a explosões de dispositivos de mensagem pagers pertencentes a membros do Hezbollah no Líbano, segundo o Ministério da Saúde local. No dia seguinte, walkie-talkies explodiram em redutos do Hezbollah, deixando 25 mortos.
Israel absteve-se de comentar as explosões, que começaram horas depois de ter anunciado a extensão de seus objetivos de guerra até a fronteira com o Líbano.
Os bombardeios dos dois lados são frequentes. Na madrugada de 1º de outubro (ainda noite de segunda no Brasil), o exército israelense anunciou o início de "incursões terrestres seletivas" no sul do Líbano. Segundo os militares, as ações, junto a ataques aéreos e de artilharia, têm como alvo combatentes do grupo Hezbollah "em povoados próximos à fronteira" com Israel.
Entre as vítimas, pelo menos dois brasileiros morreram durante bombardeios.
Em 1º de outubro, as forças de defesa de Israel informam que o Irã lançou os primeiros mísseis balísticos contra o país. A Guarda Revolucionária do Irã afirmou que o ataque foi feito em resposta às mortes de diversos líderes do Hezbollah, incluindo o chefe do grupo, Hassan Nasrallah. Teerã diz que lançará novos ataques se o Irã for atacado.