Segue a escalada do conflito no Oriente Médio após os ataques do grupo terrorista Hamas e a declaração de guerra de Israel contra a organização. Nos últimos dias, aumentou a tensão na fronteira israelense com o Líbano. O grupo Hezbollah, com forte atuação no sul libanês, também troca ameaças com Israel. Essa disputa pode abrir uma nova frente de guerra.
A animosidade entre Israel e Hezbollah não é novidade. O confronto ocorre pelo menos desde meados dos anos 1980, após a ocupação de Israel no sul do Líbano para combater guerrilheiros palestinos, e teve um capítulo à parte durante a guerra de 2006.
O Hezbollah
Origem
O Hezbollah surgiu em 1982, durante a Guerra Civil do Líbano e como uma resposta à presença israelense no sul do país. Desde então, cresceu como organização política e paramilitar. Em parte do mundo islâmico, é visto como um movimento de resistência legítimo. Já em parcela do mundo ocidental e entre os sunitas (segmento do Islã que defende a escolha do líder da religião por meio de eleição), é categorizado como organização terrorista.
— Parte do objetivo da criação deles era a resistência em relação à ocupação de Israel. Não é à toa que a base ou espaço onde ele está em maior ascensão é justamente no sul do Líbano, perto da fronteira com Israel — destaca o professor Leonardo Paz, da FGV.
O docente afirma que o Hezbollah é mais sofisticado militarmente em relação ao Hamas, o que pode aumentar o conflito armado e a tensão na área.
Que parte do Líbano o grupo controla?
O grupo controla o sul do Líbano, principalmente na região de Jabal Amil. O Hezbollah também tem atuação nos subúrbios de Beirute, em especial nos pontos mais pobres e carentes, no Vale do Beca, área conhecida pela agricultura, e em Baalbek, no Norte.
A organização também tem atuação direta na coalizão do presidente Bashar Al-Assad no conflito sírio, segundo Issam Menem, doutorando em Estudos Estratégicos Internacionais pela UFRGS, com pesquisa sobre os grupos militares xiitas no Líbano.
Por que o Hezbollah está instalado principalmente nessas regiões?
Os locais de atuação do Hezbollah têm relação com a presença da vertente xiita do islamismo (que defende os familiares de Maomé como herdeiros da religião).
— O Hezbollah reflete muito a localização da comunidade xiita no Líbano — explica Issam Menem.
Como o grupo também oferece serviços como saúde e educação, costuma ter apoio de comunidades mais carentes.
O sul do Líbano é considerado importante pelo grupo nessa queda de braço com o país vizinho porque o local já foi ocupado por Israel. O Sul também é o núcleo histórico dos xiitas libaneses, segundo Menem.
Confrontos com Israel
O Hezbollah ganhou mais popularidade no mundo muçulmano xiita após a saída de Israel do sul do Líbano em 2000. Em 2006, o grupo entrou em confronto contra Israel na Guerra do Líbano. Em 2019, a organização também realizou ações de combate à presença israelense no Oriente Médio.
Qual a situação atual do Líbano?
O país sofre há anos com uma grave crise econômica. O Líbano enfrenta problemas como insegurança alimentar, crises sanitárias e desemprego. A explosão do porto de Beirute, em 2020, também afetou a economia local, porque atingiu um dos principais eixos de importação e exportação do país. Diante de toda essa instabilidade econômica e política, grupos como o Hezbollah e demais organizações xiitas ganham espaço na sociedade. A guerra na Ucrânia também afetou o país, com a quebra na importação de trigo, base para os principais alimentos no Líbano.
Quem governa o restante do país?
O Líbano é um regime parlamentarista. Em 2021, o parlamento do país aprovou o novo governo, liderado pelo primeiro-ministro, Najib Mikati, do movimento AZM. O presidente do parlamento é Nabih Berri. Como partido político, o Hezbollah faz parte do Congresso, mas atualmente não tem maioria na Casa.
Qual a posição do governo libanês em relação a Israel?
Não há relação diplomática entre os dois países. Nos últimos anos, o Líbano tratou Israel como inimigo. Nos primeiros dias após o início do conflito envolvendo Hamas e Israel, o primeiro-ministro, Najib Mikati, afirmou que o Líbano não queria entrar nessa guerra. Como o Hezbollah atua de maneira autônoma na fronteira sul, o governo libanês monitora a situação, mas sem muitas intervenções.
Fontes ouvidas pela reportagem de GZH : professores Leonardo Paz, pesquisador do Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional da FGV (FGV NPII); Kai Enno Lehmann, do Instituto de Relações Internacionais da USP; e Issam Menem, doutorando em Estudos Estratégicos Internacionais pela UFRGS com tese sobre os grupos militares xiitas no Líbano.