Para muita gente (como eu), janeiro coincide com as férias. Surge um tempo livre para colocar em dia o hábito de ver séries.
Mas não muito longas nem com várias temporadas, afinal, o período é propício para curtir o mar, a piscina, quem sabe até um friozinho na Serra ou no Exterior, e descansar o corpo e também a cabeça.
Por isso, fiz uma lista com 30 (na verdade, 31) das melhores minisséries disponíveis em sete plataformas de streaming: Amazon Prime Video, Apple TV+, Disney+, Globoplay, HBO Max, Netflix e Star+. Dá para assistir uma a cada dia. Clique nos links se quiser saber mais. Nos vemos de novo a partir de 23 de janeiro!
12 Jurados (2019)
Falada em holandês, a minissérie belga gira em torno de Frie Palmers (Maaike Cafmeyer), mulher acusada de ter assassinado sua melhor amiga, em 2000, e sua própria filha, 16 anos depois. É uma série de tribunal, mas esse não é o único cenário da trama criada por Sanne Nuyens e Bert Van Dael. E 12 Jurados não se concentra apenas na investigação sobre os crimes: há múltiplos personagens e múltiplos enigmas. Enquanto depoimentos no julgamento e flashbacks reconstituem as circunstâncias das mortes de Brechtje Vindevogel, a melhor amiga, e Roos, a filha, descobrimos o passado de Frie e o papel desempenhado por seu ex-marido e pelo pai da primeira vítima, um ambientalista rico e famoso, somos apresentados aos dramas particulares de uma meia dúzia de jurados. Entre eles, estão a herdeira de um casal brutalmente assassinado, um fotógrafo que frequenta reuniões de viciados em sexo e um empreiteiro enrascado porque seu irmão e sócio contrata operários ilegais — inclusive um brasileiro. Mas talvez a grande personagem seja uma jurada substituta, Delphine (Maaike Neuville), mãe de três crianças e casada com um marido extremamente ciumento e abusivo. (10 episódios, Netflix)
Areia Movediça (2019)
Tem alguma semelhança com 12 Jurados. Também foca um julgamento de um crime chocante: a protagonista, Maja (pronuncia-se Maia), uma estudante do Ensino Médio, é acusada de participar de uma chacina em uma escola bacana de Estocolmo, na Suécia, onde, entre outras vítimas, foram mortos o namorado e a melhor amiga dela. Como na minissérie belga, a sueca alterna a narrativa entre o presente e o passado — quando surgem indícios tanto a favor quanto contra a personagem principal. Em meio a temas como bullying, xenofobia e relacionamentos abusivos, a trajetória de Maja é recuperada desde a aproximação com Sebastian, um garoto negligenciado pelo pai rico. Eis o pano de fundo, ou quem sabe a verdadeira questão de Areia Movediça: o que os adolescentes fazem longe do olhar de pais que não querem vê-los. (6 episódios, Netflix)
Band of Brothers (2001)
A minissérie se baseia no livro homônimo de Stephen E. Ambrose e tem entre os produtores Steven Spielberg e Tom Hanks (que dirigiu o quinto capítulo). É uma dramatização da história da Companhia Easy, desde o seu treinamento nos Estados Unidos para a invasão da Normandia até a capitulação da Alemanha na Segunda Guerra Mundial. Vencedora de seis Emmys, Band of Brothers encontra o equilíbrio entre a grande História e as pequenas vidas de um grupo de soldados. O herói é o tenente Winters (personagem de Damian Lewis), que enfrenta o horror e faz o que é preciso fazer sem perder a sua noção do que seja humano ou correto. (10 episódios, HBO Max)
Bandidos na TV (2019)
Esta minissérie documental faz valer o dito do escritor Mark Twain (1835-1910): a verdade é mais estranha do que a ficção. O diretor britânico-paraguaio Daniel Bogado conta a história do apresentador de TV Wallace Souza, que se elegeu três vezes deputado estadual no Amazonas, em 1998, em 2002 e em 2006, graças a sua suposta luta contra o tráfico de drogas, mote de um programa sensacionalista e sangrento, o Canal Livre. Suposta porque, segundo um delator, Wallace comandava uma organização criminosa — a suspeita é de que ele próprio planejava os homicídios que alavancavam a audiência do programa. Bandidos na TV mostra a comoção causada junto à mídia e à opinião pública (dividida quanto à culpabilidade dos acusados), a sucessão de viradas na trama, as desconcertantes contradições dos principais personagens e as ramificações que acabam por pintar um retrato do país. (7 episódios, Netflix)
Black Bird (2022)
O protagonista desta minissérie baseada em uma história real é Taron Egerton, ator indicado ao Globo de Ouro por Rocketman, a cinebiografia do cantor Elton John. Ele interpreta James Keene, o Jimmy, um filho de policial (o último papel de Ray Liotta) e um promissor jogador de futebol americano que enveredou para o tráfico de drogas. Dono de um pequeno império em Chicago, ele acaba preso em uma operação do FBI. Enquanto isso, vemos o surgimento dos outros dois personagens importantes. Um é o detetive vivido por Greg Kinnear, que investiga o desaparecimento — e provável assassinato — de jovens mulheres. O outro é o principal suspeito, Larry Hall, um tipo excêntrico que adora participar de reencenações da Guerra Civil e é encarnado por Paul Walter Hauser (de Eu, Tonya e O Caso Richard Jewell). A combinação de seu físico roliço com a voz estridente e as costeletas suíças do personagem transformam Larry em um sujeito ora bizarro, ora patético, ora perigoso. Essas duas narrativas, a de Jimmy e a de Larry, são cruzadas pelo escritor policial Dennis Lehane, autor dos livros que inspiraram filmes como Sobre Meninos e Lobos, de Clint Eastwood, e Ilha do Medo, de Martin Scorsese. (6 episódios, Apple TV+)
Chernobyl (2019)
Criada por Craig Mazin, apresenta uma versão ficcional do pior acidente nuclear da história, o da usina de Chernobyl, ocorrido entre 25 e 26 de abril de 1986 perto da cidade de Pripyat, na Ucrânia. Ao reconstituir suas consequências imediatas e as primeiras ações tomadas pelo governo soviético, a obra ganhou assustadora atualidade durante a pandemia: cenas e falas parecem refletir o que vimos e ouvimos desde o surgimento do coronavírus. Chernobyl arrebatou 10 prêmios Emmy, incluindo melhor minissérie, e concorria a outros nove, entre eles ator (Jared Harris, no papel do renomado químico Valery Legasov), atriz coadjuvante (Emily Watson, como a fictícia cientista Ulana Khomyuk) e ator coadjuvante (Stellan Skarsgård, que interpretou Boris Shcherbina, vice-presidente do Conselho de Ministros da URSS de 1984 a 1989, designado para supervisionar a gestão da crise). O elenco multifacetado — que inclui Jessie Buckley como a esposa grávida de um bombeiro e Paul Ritter como o engenheiro que comandou o fatídico teste na usina — permite enxergarmos as dimensões científica, política e humana do desastre. (5 episódios, HBO Max)
A Cidade É Nossa (2022)
Não chega a ser uma continuação de The Wire (2002-2008), ou A Escuta, recentemente eleita a melhor série do século 21 segundo 206 críticos, acadêmicos e profissionais de TV ouvidos pela BBC. Mas esta minissérie também foi criada pelo ex-repórter policial David Simon (aqui, na companhia do escritor George Pelecanos); também se passa em Baltimore, cidade no Estado de Maryland que é, estatisticamente, uma das mais violentas no mundo; e também retrata a atuação da polícia local. Enquanto alguns tentam fazer alguma coisa contra o narcotráfico e o crime organizado, mesmo sabendo que suas chances estão entre mínimas e nenhuma, outros apostam na truculência e/ou enveredam para a corrupção. Dirigida por Reinaldo Marcus Green, do filme King Richard (2021), A Cidade É Nossa tem uma estrutura narrativa que requer atenção, com vários núcleos de personagens e alternâncias não muito claras entre o passado e o presente. Mas a recompensa é alta para quem curte histórias sobre os meandros policiais. O elenco é uma atração à parte: Jon Bernthal interpreta o sujo sargento Wayne Jenkins, figura central no força-tarefa do combate às armas. Wunmi Mosaku é Nicole Steele, uma advogada designada pela Justiça federal para apurar casos de desrespeito aos direitos civis. Jamie Hector faz Sean Suiter, um detetive de Homicídios que acaba se envolvendo com Jenkins. Josh Charles encarna Daniel Hersl, sobre o qual pesam várias denúncias de maus-tratos. E Dagmara Dominczyk está no papel de Erika Jensen, uma agente do FBI que investiga as ações de Jenkins e companhia. (6 episódios, HBO Max)
Dopesick (2021)
Com idas e vindas no tempo, mostra como a Purdue Pharma promoveu de forma agressiva e mentirosa o OxyContin, analgésico considerado responsável pela crise de opioides que provocou 500 mil mortes nos EUA a partir de 1999. Há cinco núcleos narrativos em Dopesick. O principal é o de Finch Creek, uma fictícia cidade onde moram o médico Samuel Finnix (Michael Keaton, premiado no Emmy, pelo Sindicato dos Atores dos EUA e no Globo de Ouro) e a jovem Betsy Mallum (Kaitlyn Dever), operária em uma mina de carvão. Em outras duas pontas, estão personagens reais. Dona da farmacêutica, a família Sackler vive em meio a intrigas e disputas por conta da ambição de Richard Sackler (Michael Stuhlbarg). E Rick Mountcastle (Peter Sarsgaard) e Randy Ramseyer são dois promotores públicos que querem investigar e levar a empresa ao tribunal. (8 episódios, Star+)
The Dropout (2022)
Forma com Inventando Anna (Netflix) uma espécie de díptico: ambas são mais ou menos contemporâneas; as duas protagonistas são mulheres brancas com autoconfiança, energia e talento para a mentira, trinômio que abriu portas no mundo dos negócios e na alta sociedade; ambas cultivam excentricidades — a jovem golpista Anna Sorokin (Julia Garner) tem um sotaque indetectável, Elizabeth Holmes (Amanda Seyfried, ganhadora do Emmy) emprega uma voz grave e baixa quando quer proferir uma frase de efeito); e as duas obras mostram como seus castelos de areia desmoronaram. Mas Inventando Anna é longa e enrolada demais, parecendo mais interessada na lenda do que na pessoa. The Dropout, embora recorra a flashbacks, vai direto ao ponto. O foco está na pressa de Elizabeth para conquistar algo, no seu narcisismo que ameaça vidas alheias, no seu desconforto para o convívio social. (8 episódios, Star+)
Felizes para Sempre? (2015)
É uma releitura da minissérie Quem Ama Não Mata (1982), pelo mesmo autor, Euclydes Marinho. O cineasta Fernando Meirelles dirige a trama, agora ambientada em Brasília para mostrar as relações entre sexo e poder. Em foco, os dilemas de cinco casais de uma mesma família. Entre os personagens da minissérie, está a restauradora de arte Marília (Maria Fernanda Cândido), que vive um casamento socialmente perfeito com Cláudio (Enrique Díaz) — em casa, eles mal se falam. A crise conjugal vai acabar por levá-los ao encontro da prostituta de luxo Denise (Paolla Oliveira), a Danny Bond, que é bissexual. Em outra ponta, o engenheiro Hugo (João Miguel), irmão de Cláudio, vê seu casamento sólido com a cirurgiã plástica Tânia (Adriana Esteves) começar a ruir quando perde o emprego e descobre ser estéril. O desejo, a mentira, a ambição e a traição culminam em um crime passional, e todos os personagens têm motivos para matar ou morrer. (10 episódios, Globoplay)
O Gambito da Rainha (2020)
Desenvolvida por Scott Frank e Allan Scott a partir de um romance escrito por Walter Tevis, é uma das minisséries mais premiadas dos últimos anos: recebeu 11 Emmys, dois Globos de Ouro, o troféu do Sindicato dos Atores e o prêmio da Associação dos Diretores. A atriz Anya Taylor-Joy dá xeque-mate no espectador como uma órfã que se torna jogadora de xadrez nos Estados Unidos da década de 1960. Beth Harmon tem de enfrentar mais do que grandes campeões e o preconceito contra as mulheres: precisa lidar com seus próprios traumas e vícios — no caso, em remédios e em álcool. (7 episódios, Netflix)
O Homem das Castanhas (2021)
Não se deixe enganar pelo nome simpático: a minisssérie dinamarquesa baseada no romance homônimo de Soren Sveistrup (também autor das histórias da série The Killing e do filme Boneco de Neve) é um típico exemplar do noir nórdico, cru e violento quando necessário. Em Copenhague, nos dias atuais, uma jovem mãe é brutalmente assassinada. Seu corpo é encontrado em um parque, sem uma das mãos. Próximo do corpo há um pequeno boneco feito de castanhas. Essa é a principal pista para a investigadora Naia Thulin (Danica Curcic), uma mãe solteira que agora conta com um novo parceiro policial, o instável Mark Hess (Mikkel Boe Folsgaard). Paralelamente, acompanhamos o difícil recomeço da ministra Rosa Hartung (Iben Dorner) — um ano antes, sua filha adolescente desapareceu. (6 episódios, Netflix)
I May Destroy You (2020)
A atriz e roteirista inglesa de pais ganeses Michaela Coel transforma-se em Arabella nesta autoficção que, apesar de lidar com um assunto doloroso, encontra espaço para o humor, o afeto e a diversão. Escritora de um livro de sucesso, ela corre contra o prazo e contra uma crise criativa para entregar o segundo romance a uma grande editora de Londres. Para espairecer, resolve sair para a balada com uns amigos. No dia seguinte, já de volta ao trabalho, Arabella vê sua memória assaltada por imagens de um estupro praticado por um homem desconhecido. A partir daí, I May Destroy You mostra como a violência sexual pode paralisar o presente, alterar o futuro e ressignificar o passado das vítimas. (12 episódios, HBO Max)
O Inocente (2021)
Oriol Paulo e Pablo Vallejo adaptaram para a Espanha um romance do escritor estadunidense Harlan Coben. Mario Casas interpreta Mateo Vidal, o Mat, estudante de Direito que, em uma briga de bar, mata acidentalmente um rapaz. Após quatro anos na prisão, ele reconstrói sua vida e reencontra a mulher que conhecera na festa após ser libertado, Olivia (Aura Garrido). Os dois se casam e estão para se tornarem pais, mas um belo dia ele recebe uma mensagem perturbadora enviada pelo celular dela. O que consta na mensagem? Qual é a relação entre Mat e uma freira que se suicidou em pleno orfanato? Por que o corpo dessa religiosa atrai a atenção da polícia federal? O que Olivia esconde quando se tranca no banheiro? Quem é Anibal? As tramas que correm em paralelo em O Inocente vão preenchendo o quebra-cabeças e reprisando os temas de Coben: o peso do passado e o preço dos segredos. (8 episódios, Netflix)
Irma Vep (2022)
Para falar sobre a minissérie escrita e dirigida pelo francês Olivier Assayas e protagonizada pela sueca Alicia Vikander, passo a palavra ao cineasta e colunista de GZH Carlos Gerbase: "Metalinguística, às vezes confusa, algo irregular, muitas vezes desconcertante, mas sempre no registro de obra de arte, Irma Vep é programa obrigatório para quem gosta de cinema e de televisão de qualidade. (...) Irma Vep, um anagrama de vampire, é a personagem principal da série cinematográfica em 10 episódios Les Vampires, dirigida por Louis Feuillade em 1916. Ela não é uma vampira, não suga o sangue de ninguém. Vivida pela célebre atriz Musidora, faz parte de uma gangue de ladrões, veste um macacão negro colado ao corpo, que só deixa seus olhos de fora, e, mesmo com sapatos de salto alto, é capaz de esgueirar-se com extrema elegância pelos telhados de Paris. Está longe de ser uma heroína. É a precursora das vamps, termo depois adotado por Hollywood para designar mulheres 'do mal' que, usando as armas da sedução, destroem a vida de homens 'de bem'". (8 episódios, HBO Max)
Landscapers (2021)
Como aponta a sequência de abertura de Landscapers, o roteirista Ed Sinclair e o diretor Will Sharpe vão enfatizar os aspectos fantasiosos — ou seriam delirantes? Ou seriam mentirosos? — da vida do casal Susan e Christopher Edwards (interpretados magistralmente por Olivia Colman e David Thewlis). Eles são protagonistas de um célebre e chocante caso policial da Inglaterra (o assassinato, em 1998, dos pais de Susan), são duas pessoas atrapalhadas e machucadas que compartilham o gosto por filmes antigos de Hollywood e astros do cinema como Gary Cooper e Gérard Depardieu, e que procuram construir um mundo no qual possam sobreviver. (4 episódios, HBO Max)
A Maldição da Residência Hill (2018) / Missa da Meia-Noite (2021)
É a dobradinha que faz a lista de 30 se revelar 31. As duas minisséries foram desenvolvidas e dirigidas pelo estadunidense Mike Flanagan, filiam-se ao gênero do terror e estão disponíveis na mesma plataforma. Em A Maldição da Residência Hill, ele adapta o clássico romance de terror A Assombração da Casa da Colina (1959), de Shirley Jackson. A trama alterna duas linhas de tempo: na vida adulta, cinco irmãos continuam lidando com os traumas das experiências paranormais vividas na infância em uma mansão que os pais, Hugh (Henry Thomas) e Olivia (Carla Gugino), iriam reformar para depois vender por um preço mais alto. Eles são Steven (Michiel Huisman), escritor de livros sobre casas mal-assombradas, Shirley (Elizabeth Reaser), que prepara corpos para serem enterrados, Theodora (Kate Siegel, esposa do diretor), psicóloga infantil, e os gêmeos Luke (Oliver Jackson-Cohen), um dependente químico, e Nell (Victoria Pedretti), a mais atormentada quando pequena — por conta da Moça do Pescoço Torto. Cada um deles representa os estágios do luto: negação, raiva, barganha/negociação, depressão e aceitação. (10 episódios, Netflix)
Em Missa da Meia-Noite, Flanagan cruza as trajetórias de dois personagens. Paul Hill (em grande atuação de Hamish Linklater) é um padre que chega à Ilha Crockett, comunidade fictícia e minúscula (tem somente 127 habitantes), para substituir o monsenhor Pruitt, afastado temporariamente por causa de um problema de saúde. Sua chegada coincide com o retorno de Riley Flynn (encarnado por Zach Gilford), que viu sua carreira no mundo das startups ruir quando, ao dirigir embriagado, matou uma adolescente. Ele passou quatro anos na prisão e tenta recomeçar sua vida, contando com o apoio da mãe, Annie (Kristin Lehman), mas enfrentando a relutância do pai, o pescador Ed (Henry Thomas), reencontrando sua namorada dos tempos de escola, a professora Erin Greene (Kate Siegel), e revendo, todas as noites, o fantasma da garota atropelada. Esse não é o único evento fantástico na ilhazinha, mas não convém avançar muito na trama, em que o diretor e roteirista costura, através de longos e belos monólogos, sua educação no catolicismo, seu subsequente ateísmo e sua paixão pelo horror. (7 episódios, Netflix)
Mare of Easttown (2021)
Fascinada com o "quem foi" da minissérie criada por Brad Inglesby, Kate Winslet ressaltou que embarcou no projeto porque "não é só a história de um crime". De fato, o crime descoberto no primeiro capítulo é chocante e misterioso, mas serve sobretudo como catalisador dos dramas pessoais e familiares em cidadezinha dos EUA. A morte traz à tona relações e segredos guardados em vida, imagem reforçada pela ambientação numa estação fria, que obriga os personagens a se esconderem atrás de casacos, mantas e gorros. E — até o final — todos têm o que ocultar ou algo do que não gostam de falar. Praticamente perfeita, Mare of Easttown venceu os Emmys de atriz (Winslet, também premiada no Globo de Ouro, ator coadjuvante (Evan Peters), atriz coadjuvante (Julianne Nicholson) e design de produção. (7 episódios, HBO Max)
Mildred Pierce (2011)
O cineasta Todd Haynes (de Longe do Paraíso e Carol) assina esta nova e marcante adaptação do romance lançado em 1941 por James M. Cain que deu origem ao filme Alma em Suplício (1945). A história se passa durante a Grande Depressão nos EUA. Mildred (Kate Winslet, arrasadora como de hábito) é uma mulher jovem recém divorciada que abre seu próprio restaurante e se apaixona por outro homem, Monty Beragon (Guy Pearce), enquanto tenta ganhar o amor de sua filha mais velha, a mimada e narcisista Veda (Evan Rachel Wood). Conquistou cinco Emmys, incluindo melhor atriz e ator coadjuvante. (5 episódios, HBO Max)
The Night Of (2016)
Filho de imigrantes paquistaneses em Nova York, o jovem universitário Nasir Khan, o Naz (Riz Ahmed), pega "emprestado" do pai o táxi para ir a uma festa. No meio do caminho, em duas ocasiões pessoas tentam embarcar no carro como passageiro. Mais tarde, uma infração de trânsito, um objeto levado da cena de um crime e uma testemunha ocular vão tornar Naz o suspeito número 1. É esse o resumo do primeiro e fabuloso episódio da minissérie criada pelo escritor Richard Price e pelo cineasta Steven Zaillian. Trata-se de um retrato minucioso e muito humano das delegacias de polícia, do sistema judicial e dos presídios estadunidenses. À trama de suspense — a certa altura não saberemos se Naz é uma ovelha ou um lobo —, adiciona conotações culturais, políticas e sociais, refletindo o estado de ânimo nova-iorquino para com os muçulmanos pós-11 de Setembro e mostrando penitenciárias como fábricas de bandidos. À excelência do roteiro e da direção, soma-se a do elenco. Ahmed ganhou o Emmy de melhor ator, categoria em que também competia John Turturro, no papel do advogado de porta de cadeia John Stone. Bill Camp concorreu a coadjuvante na pele do detetive Dennis Box, assim como Michael Kenneth Williams, que faz o presidiário Freddy Knight. Todos trazem uma série de nuances a seus personagens, aumentando o envolvimento do espectador com uma história por si só cheia de matizes sobre o certo e o errado, o bom e o mau, a justiça e a lei, as percepções e as evidências. (8 episódios, HBO Max)
Ninguém Tá Olhando (2019)
Talvez fosse para ser uma série, mas como morreu na primeira temporada — apesar de ter vencido o Emmy Internacional de melhor comédia —, vou considerar como uma minissérie. É é assinada por Daniel Rezende (diretor dos filmes Bingo, o Rei das Manhãs, Turma da Mônica: Laços e Turma da Mônica: Lições) e estrelada pela hoje ex-youtuber Kéfera Buchmann. Ninguém Tá Olhando transforma o mundo dos anjos em uma espécie de repartição pública, cheia de burocracia e tédio. Recém contratado, Ulisses (papel de Victor Lamoglia) vai questionar o sistema enquanto se envolve com a personagem de Kéfera, a humana Miriam, que mistura crenças e erros na vida. Em cartaz na Netflix. (8 episódios, Netflix)
Olive Kitteridge (2014)
Não apenas em sala de aula mas também no ambiente familiar, a professora Olive dá ordens e mantém um olhar amargurado, que afeta principalmente seu marido, um farmacêutico pacato, e o filho. Essa é a protagonista de Olive Kitteridge, adaptação de um romance homônimo de Elizabeth Sprout dirigida pela cineasta Lisa Cholodenko, de Minhas Mães e Meu Pai (2010). Foi um arraso no Emmy, levando oito prêmios: melhor minissérie, direção, atriz (Frances McDormand), ator (Richard Jenkins), ator coadjuvante (Bill Murray), roteiro (Jane Anderson), elenco e edição. (8 episódios, HBO Max)
O Paciente (2022)
É um thriller psicológico escrito por Joel Fields e Joe Weisberg (o criador de The Americans) sobre um terapeuta, Alan Strauss (Steve Carell), que, meio a contragosto, digamos assim, passa a atender um paciente muito singular: Sam Fortner (Domhnall Gleeson) se revela um assassino serial e quer ajuda para conter seus impulsos homicidas. Além de contar com ótimos desempenhos dos dois atores e de incitar reflexões sobre identidade, paternidade e conflitos familiares, a minissérie é um raro caso de suspense que não abusa do tempo do espectador: cada episódio gira em torno de meia hora, às vezes até menos. Não se perde nada nem em tensão, nem em desenvolvimento da trama e dos personagens. (10 episódios, Star+)
Scenes from a Marriage (2021)
O diretor e roteirista israelense Hagai Levi encarou o desafio de modernizar a célebre série de televisão criada pelo cineasta sueco Ingmar Bergman. Na nova versão de Cenas de um Casamento (1973), Oscar Isaac e Jessica Chastain interpretam Jonathan e Mira, que estão juntos há 10 anos e têm uma filhinha. Ele é professor de filosofia e passa a maior parte do tempo em casa. Ela trabalha na área de tecnologia e responde pela maior parte do orçamento familiar. Como no original, Jonathan e Mira são procurados para dar uma entrevista na condição de um casal considerado exemplar. Mas logo nos primeiros minutos da conversa, começam a aparecer fissuras e ressentimentos. Não é à toa que cada um dos episódios mostra, no início, bastidores da produção: é como se o realizador quisesse reforçar o caráter de personagem assumido pelos integrantes de um relacionamento. (5 episódios, HBO Max)
Time (2021)
É possível que o espectador brasileiro calejado pelo noticiário a respeito da violência, da precariedade, da corrupção e da desesperança nos presídios não se impressione com esta série britânica da BBC. Mas esse conhecimento não deve dessensibilizar o público perante os dramas vividos pelos personagens principais — interpretados por Sean Bean e Stephen Graham— e pelos coadjuvantes ao longo dos três episódios escritos por Jimmy McGovern e dirigidos por Lewis Arnold. Bean encarna um professor que atropelou e matou um homem, e agora precisa encarar um ambiente marcado pela privação e pela intimidação. Graham faz um guarda que enfrenta um drama pessoal que não cabe ser revelado aqui. Assista à série e se ponha no lugar dele: o que você faria? (3 episódios, HBO Max)
The Underground Railroad: Os Caminhos para a Liberdade (2021)
Concebida por Barry Jenkins, diretor e roteirista de Moonlight, vencedor do Oscar de melhor filme em 2017, é a adaptação do romance homônimo escrito por Colson Whitehead e ganhador, também em 2017, do prêmio Pulitzer. A trama se passa na metade do século 19, antes da Guerra Civil nos EUA (1861-1865), que tinha como principal causa a escravização da população negra — a maioria dos Estados do Sul queria manter, o Norte era contra. Sua protagonista é Cora (interpretada pela sul-africana Thuso Mbedu, do filme A Mulher Rei), uma jovem escrava que, após relutar, tenta fugir de uma fazenda na Geórgia na companhia do íntegro Caesar (Aaron Pierre). Os dois buscam a Underground Railroad do título, uma rota de fuga que de fato existiu, mas não da maneira que é apresentada na minissérie. No seu encalço, partirá o caçador Arnold Ridgeway (Joel Edgerton), tendo ao lado um surpreendente ajudante: Homer (Chase W. Dillon), um menino negro. É uma das mais belas e contundentes obras já feitas para o streaming ou a televisão. (10 episódios, Amazon Prime Video)
WandaVision (2021)
Diante da minissérie criada por Jac Schaeffer, precisamos conhecer o passado cinematográfico dos personagens para compreender que há algo de muito estranho acontecendo, e precisamos conhecer o passado da TV dos EUA para compreender as referências, que não têm nada de gratuitas: acrescentam camadas, criam expectativas, intensificam o suspense. No primeiro episódio, Wanda Maximoff (Elizabeth Olsen), a Feiticeira Escarlate, e o androide Visão (Paul Bettany) são apresentados como um típico casal dos subúrbios estadunidenses. No caso, Westview, onde os demais 3 mil e poucos moradores desconhecem os superpoderes dos vizinhos. As cenas são em preto e branco, e o tom de comédia romântica é acentuado pelas risadas da plateia, a claque, e pela duração (menos de meia hora). É uma alusão aos clássicos I Love Lucy (1951- 1957) e The Dick Van Dyke Show (1961- 1966). A partir daí, WandaVision vai avançando no tempo, nos costumes e nos mistérios. (9 episódios, Disney+)
Watchmen (2019)
Damon Lindelof pega elementos da clássica HQ de Alan Moore e Dave Gibbons (a chuva de lula, personagens como Ozymandias e Dr. Manhattan) e cria uma trama central totalmente nova e absolutamente atual. Os novos heróis, como a Sister Night (Regina King) e o Looking Glass (Tim Blake Nelson), lidam com a violência contra negros nos EUA. O inimigo é uma organização racista, a Sétima Kavalaria. Desde a abertura, que reencena o Massacre de Tulsa, em 1921, durante anos apagado da história oficial, Watchmen mostra como os traumas da escravidão passam de geração a geração. Foram 11 troféus no Emmy, incluindo melhor minissérie, atriz (Regina King), ator coadjuvante (Yahya Abdul-Mateen II) e trilha sonora (Trent Reznor e Atticus Ross). (9 episódios, HBO Max)
The White Lotus 2 (2022)
Por coincidência, ficou para o final aquela que talvez seja a melhor série para as suas férias: a segunda temporada da premiada The White Lotus. O cenário é a Sicília, na Itália, onde também há um resort de luxo da fictícia rede The White Lotus. Como na temporada inicial da obra criada e dirigida por Mike White, tudo começa com um cadáver não identificado _ eis um dos charmes da porção policial: o espectador é instigado a descobrir não apenas quem matou, mas também quem morreu (e desta vez parece haver mais candidatos a vítima). Se na primeira história havia um caixão sendo transportado de avião, agora surge um corpo boiando na praia. Aí, como na temporada original, a trama volta uma semana no tempo para acompanhar a chegada de novos turistas ao hotel que tem como gerente Valentina (Sabrina Impacciatore). Além de encarar as exigências e os caprichos dos hóspedes, ela precisa lidar com suas próprias _ e escondidas _ vontades e com duas garotas que vivem frequentando indevidamente o estabelecimento: a prostituta Lucia (Simona Tabasco) e a aspirante a cantora Mia (Beatrice Grannò).
O elemento de ligação entre a primeira e a segunda temporada é a milionária carente Tanya (Jennifer Coolidge). A personagem é tão focada no prazer e no luxo e tão sem-noção sobre a vida real, que não desce do salto nem nos momentos de perigo. Ela desembarca em Taormina, na Sicília, acompanhada do agora marido Greg e da assistente, Portia (Haley Lu Richardson), que será obrigada a ficar longe dos olhos do sujeito. Nessa vida em segredo, Portia conhecerá o certinho Albie (Adam DiMarco), que está em viagem com seu pai, Dominic (Michael Imperioli), que levou um "basta" da esposa depois de mais uma traição, e seu avô (F. Murray Abraham), que veio à procura de parentes. Um outro núcleo é formado pelos amigos de universidade e hoje empresários e/ou investidores Cameron (Theo James) e Ethan (Will Sharpe) e suas respectivas esposas: Daphne (Meghann Fahy) e Harper (Aubrey Plaza). Os dois casais vão colecionar atritos, mas também surgirão faíscas de atração sexual. Para mim, as melhores cenas da segunda temporada ocorrem dentro desse núcleo, tendo como temas casamento, sexo, competição masculina, traição e autoengano. A personagem Daphne dá um show à parte. (7 episódios, HBO Max)