É possível que o espectador brasileiro calejado pelo noticiário a respeito da violência, da precariedade, da corrupção e da desesperança nos presídios não se impressione com Time (2021), série britânica da BBC que estreou recentemente na HBO Max. Mas esse conhecimento não deve dessensibilizar o público perante os dramas vividos pelos personagens principais — interpretados por Sean Bean e Stephen Graham — e pelos coadjuvantes ao longo dos três episódios escritos por Jimmy McGovern e dirigidos por Lewis Arnold.
Presídios são cenários por excelência para obras tensas e angustiantes, nos quais alguns elementos tornaram-se característicos: inocentes injustiçados, informantes infiltrados, carcereiros sádicos, grades intransponíveis, rebeliões violentas, o cotidiano no corredor da morte e presos espertos bolando um engenhoso plano de fuga. Entre os filmes e as séries desse subgênero, estão Alcatraz: Fuga Impossível (1979), Um Sonho de Liberdade (1994), Os Últimos Passos de um Homem (1995), Oz (1997-2003), À Espera de um Milagre (1999), Carandiru (2003), Prison Break (2005-2009/2017), Orange Is the New Black (2013-2019), A Luta por Justiça (2019) e Milagre na Cela 7 (2019).
Inevitavelmente, Time apresenta situações que já viraram clichê, como a do ambiente marcado pela intimidação e a do chefão do crime que cobra favores. O próprio mote da trama não chega a ser novidade: entramos na prisão pelos olhos de um cidadão comum que, numa noite ruim, cometeu um crime violento. O professor — agora "ex-professor", como o personagem gosta de frisar — Mark Cobden atropelou e matou um homem.
Mas desde os instantes iniciais a série mostra virtudes que a colocam em um patamar mais elevado. A primeira delas é a atuação de Sean Bean, 63 anos, o eterno Boromir da trilogia O Senhor dos Anéis (2001-2003) e o coitado Ned Stark de Game of Thrones (2011-2019). No papel do protagonista, ele ganhou o troféu de melhor ator no Bafta, a premiação da academia britânica de cinema e TV, que também laureou Time como a melhor minissérie — só depois foi decidido que haveria uma segunda temporada, com estreia prevista para 2023.
Mark é um estranho no ninho: tudo será ameaçador ou chocante, do roubo de sua comida por um valentão aos ataques e automutilações que testemunha. Mas ele encara as coisas com certo estoicismo. Entende que precisa pagar e que talvez nunca seja perdoado. Talvez nunca se perdoe: dormir é um tormento, pois nos sonhos revê sua vítima. Esse pesadelo também afeta outros presidários, como Daniel (Jack McMullen), encarcerado por assassinar um rapaz durante uma briga de bar — a cena em que ele rememora o crime é uma das mais pungentes, e seu desfecho também afasta Time do ordinário.
Há um outro personagem tão importante quanto Mark Cobden, com uma história tão ou mais interessante. É o guarda Eric McNally, interpretado por Stephen Graham, 49 anos, que encarnou Al Capone na excelente série Boardwalk Empire (2010-2014) e fez o protagonista do ótimo filme O Chef (Boiling Point, 2021). Eric nos surpreende tanto pela personalidade quanto por seu drama pessoal — que, embora seja capital para o andamento de Time, não cabe aqui revelar. Assista à série e se ponha no lugar dele: o que você faria?