Por responsabilidade jornalística, não poderia ignorar um dos fenômenos de 2022: Terrifier 2, que entra em cartaz nos cinemas nesta quinta-feira (29) após uma rodada de pré-estreias. Nas bilheterias, o filme de terror escrito e dirigido por Damien Leone arrecadou quase 50 vezes o seu custo: orçado em US$ 250 mil, já faturou US$ 12,15 milhões ao redor do mundo. Nas redes sociais, apareceu em uma porção de notícias, fotos ou memes, tudo por conta do que as cenas de violência estreladas pelo Palhaço Art provocaram nas plateias dos Estados Unidos: há relatos — verídicos ou marqueteiros — de pessoas que vomitaram, desmaiaram e até foram parar no hospital.
"Os espectadores que são fracos do coração, propensos a tonturas ou têm estômagos fracos são aconselhados a ter extrema cautela", avisou o produtor Steve Barton em sua conta do Twitter.
Também recomendo extrema cautela aos espectadores que são impacientes com filmes ruins, propensos a abandonar a sala de cinema fulos da vida pelo dinheiro jogado fora.
Sendo bem sincero e repetindo o título desta coluna, não consegui ver Terrifier 2 até o fim. A mistura de tortura e tédio foi demais para mim.
A franquia criada por Damien Leone investe no filão que ressignifica uma figura alegre do imaginário infantil: o dos palhaços assassinos. Na ficção, existem exemplos clássicos, como o Coringa, arqui-inimigo do Batman, e Pennywise, surgido no livro It: A Coisa, de Stephen King. Infelizmente, também há casos da vida real, o que reforça o poder de assombração desses personagens — John Wayne Gacy (1942-1994) estuprou, torturou e matou pelo menos 33 rapazes com idades de 14 a 21 anos, entre 1972 e 1978. Em Terrifier, Leone, com ironia ou pretensão, dá status de arte a esses tipos, batizando seu protagonista de Art.
Terrifier 2 se passa um ano depois do primeiro filme, lançado em 2016. Em uma interpretação muda do ator David Howard Thornton, mas bastante eloquente nas expressões do rosto, nos gestos e no movimento corporal, o Palhaço Art acorda no necrotério após o massacre promovido na noite de Halloween anterior. Na primeiríssima cena, ele já comete um assassinato de forma brutal.
Parece que o filme vai ser uma sangueira só ao longo de suas duas horas e 19 minutos. Ledo engano.
Muito da duração excessiva de Terrifier 2 deve-se às arrastadas e desinteressantes cenas envolvendo a jovem Sienna (Lauren LaVera) e seu irmão caçula, Jonathan (Elliot Fullam), que se tornam a obsessão de Art. Sienna, obviamente, encarna um arquétipo deste subgênero do terror, o slasher: ela é a final girl, como a Laurie Strode da franquia Halloween, a garota que enfrenta o psicopata assassino e que provavelmente sobrevive para contar sua história — a não ser que Damien Leone seja ainda mais sádico (se ele fosse um diretor francês como Pascal Laugier, eu não apostaria todas as fichas na salvação da personagem).
O protagonismo feminino é um artifício para tentar contrabalançar o peso de outra marca dos slashers: a misoginia. Mulheres — não raro "estúpidas" a ponto de ficarem dando trela ao vilão em vez de chamarem a polícia — são as vítimas preferidas de Art. Com os homens, o palhaço é rápido, quase poupando-os do sofrimento antes da morte. Com elas, demora-se nas mutilações e amputações, joga e espalha ácido na carne exposta. Durante todo esse suplício, a pobre coitada segue viva, gritando de dor, chorando, implorando.
Foi mais ou menos por aí que parei de ver o filme. Faço minhas as palavras do crítico Owen Gleiberman, na revista Variety: Terrifier 2 não usa a crueldade para gerar algum tipo de empatia (como, por exemplo, podemos sentir por Marion Crane na célebre cena do chuveiro em Psicose). Pelo contrário: "Estimula o espectador a ver suas vítimas da maneira como os nazistas viam as deles: como cobaias para um experimento doloroso".