No início da manhã desta quarta-feira (3), o tenente-coronel Mauro Cid Barbosa, que foi ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, foi preso, em Brasília. A detenção ocorreu durante a Operação Venire, deflagrada pela Polícia Federal (PF).
Ao longo da manhã, a corporação cumpriu seis mandados de prisão preventiva e 16 de busca e apreensão, em Brasília e no Rio de Janeiro. Um dos alvos de buscas foi uma casa do ex-presidente, na capital federal.
O foco da operação da PF é sobre a inserção de dados falsos de vacinação contra covid-19 no sistema do Ministério da Saúde. O celular do ex-presidente foi apreendido — inicialmente, havia a notícia de que o aparelho da ex-primeira-dama Michelle também havia sido apreendido, mas a PF corrigiu a informação.
Confira o que já se sabe sobre as diligências realizadas nesta quarta-feira.
O que está sendo investigado
Batizada de Venire, a investida desta quarta-feira apura uma suposta "associação criminosa constituída para a prática dos crimes de inserção de dados falsos de vacinação contra a Covid-19 nos sistemas SI-PNI e RNDS do Ministério da Saúde", conforme informou a PF.
De acordo com a PF, os envolvidos teriam emitido certificados falsos de vacinação contra a covid-19, para burlar restrições sanitárias relativas à pandemia. Os crimes teriam sido cometidos entre novembro de 2021 e dezembro de 2022.
"A apuração indica que o objetivo do grupo seria manter coeso o elemento identitário em relação a suas pautas ideológicas, no caso, sustentar o discurso voltado aos ataques à vacinação contra a Covid-19", disse a PF.
Quais crimes estão sob investigação
A ofensiva aberta nesta quarta mira supostos crimes de infração de medida sanitária preventiva, associação criminosa, inserção de dados falsos em sistemas de informação e corrupção de menores, segundo a PF.
Por que os dados de vacinação teriam sido alterados
Conforme a PF, com a mudança dos dados, os beneficiários puderam emitir os respectivos certificados de vacinação e utilizá-los para burlar as restrições sanitárias vigentes no Brasil e nos Estados Unidos.
A investigação da Polícia Federal indicou que o objetivo do grupo com essas modificações seria sustentar em público o discurso voltado aos ataques à vacinação contra a covid-19.
Também conforme a PF, estes fatos poderiam configurar em tese os crimes de infração de medida sanitária preventiva, associação criminosa, inserção de dados falsos em sistemas de informação e corrupção de menores.
Quem teria sido beneficiado
A inserção de dados falsos teria beneficiado Jair Bolsonaro, sua filha de 12 anos, o tenente-coronel Mauro Cid, além da filha e da esposa do antigo ajudante de ordens.
Segundo relatório da Polícia Federal, os registros de vacinação de Bolsonaro e da filha de 12 anos foram inseridos no sistema em 21 de dezembro passado, pouco antes de viajarem para os Estados Unidos.
"Após a data de inserção dos dados falsos de vacinação contra a Covid-19 nos sistemas do Ministério da Saúde, o usuário associado ao ex-presidente Jair Bolsonaro emitiu o certificado de vacinação contra a covid-19, por meio do aplicativo ConecteSUS", afirma o relatório da PF.
Chamou atenção dos policiais federais, ainda, o intervalo de tempo entre a data em que os investigados teriam tomado as vacinas e a data em que os dados foram inseridos no sistema. No caso de Bolsonaro, por exemplo, ele teria recebido as doses em agosto e outubro, conforme dados que constam no relatório da PF. Mas o registro só entrou no sistema em dezembro.
O que disse Bolsonaro
Durante a manhã, Bolsonaro disse a jornalistas, na saída de sua casa, em Brasília, que não foi vacinado, e negou que tenha adulterado qualquer documento.
— Não existe adulteração da minha parte. Não tomei a vacina, ponto final. Nunca neguei isso — enfatizou.
Questionado sobre a suspeita de que teria utilizado um documento falso para conseguir entrar nos Estados Unidos, o ex-presidente afirmou que "nunca me foi pedido cartão de vacina em lugar nenhum". Sobre a filha, o ex-presidente também afirmou que ela não se vacinou.
— Minha filha Laura não tomou vacina — confirmou o ex-presidente, argumentando que decidiu não imunizar a sua filha pois ela teria "um atestado" que a dispensaria desta necessidade.
Durante a manhã, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro fez uma publicação nas redes sociais afirmando que, em sua casa, só ela teria se vacinado.
Bolsonaro teria sido intimado a depor ainda nesta quarta-feira, mas informou à corporação que não compareceria à oitiva, conforme apuração do jornal Folha de S. Paulo.
Quem foi preso
- Mauro Cid Barbosa, tenente-coronel e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro;
- o sargento Luis Marcos dos Reis, ex-membro da equipe de Mauro Cid;
- o ex-major do Exército Ailton Gonçalves Moraes Barros;
- Max Guilherme, policial militar que atuou na segurança de Bolsonaro;
- o militar do Exército Sérgio Cordeiro, que também atuava na proteção pessoal de Bolsonaro;
- João Carlos de Sousa Brecha, secretário municipal de Governo de Duque de Caxias (RJ).
Quem autorizou as buscas na casa de Bolsonaro
A Operação Venire foi autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), no âmbito do inquérito das milícias digitais. Nesta tarde, Moraes retirou o sigilo da decisão que autorizou as buscas na residência de Bolsonaro.
Ao permitir a operação, Moraes considerou "plausível" a linha de investigação que sugere que Bolsonaro possa ter inserido informações falsas sobre vacinas para obter vantagens. Além disso, o ministro mencionou a possibilidade de haver uma "organização criminosa" que altera dados de vacinação.
Segundo o ministro, os sinais de delito são "significativos" e a suposta associação criminosa não somente buscou obter vantagens pessoais, mas também desacreditar o sistema de imunização do país.
Em razão da operação da PF desta quarta, Moraes autorizou a busca e apreensão do passaporte de Bolsonaro para evitar que o ex-presidente saia do país durante as investigações.
Onde Bolsonaro estava na data da suposta vacina
De acordo com o relatório da PF acerca da investigação, Bolsonaro não esteve no local e no município em que teria sido imunizado (Duque de Caxias, no RJ), na data que consta na sua carteira de vacinação.
Conforme auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU), que embasa a investigação da PF, "o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro não esteve no município de Duque de Caxias (RJ) no dia 13/08/2022, data em que teria tomado a primeira dose da vacina da fabricante Pfizer. Permaneceu na cidade do Rio de Janeiro até seu retorno para Brasília (DF), às 21h25min daquele dia".
O que a CGU vinha investigando
Em fevereiro, o ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Vinicius Carvalho, já havia afirmado que era preciso concluir apuração sobre a possibilidade de adulteração do cartão de vacinação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) antes de decidir por divulgar o documento ou manter o sigilo de cem anos imposto pelo governo passado.
A CGU já investigava, na época, se havia algum tipo de adulteração no cartão de vacinação de Bolsonaro. Segundo apuração, o processo verificava se houve inserção ou mesmo retirada de dados do cartão do ex-presidente.