Os mandados de prisão cumpridos pela Polícia Federal (PF), nesta quarta-feira (3), atingem o núcleo mais próximo de assessores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). No caso do tenente-coronel Mauro Cesar Barbosa Cid, conhecido como coronel Cid, a confiança era tamanha que o ex-presidente lhe repassava o aparelho celular, com autonomia para responder mensagens.
Até agora, o coronel — que foi preso — parece ser o mais comprometido pelo esquema desvendado pela PF. Já em posse de registros de mensagens trocadas por ele com outros envolvidos na suposta falsificação de cartões de vacina, os policiais verificaram a formação de uma organização criminosa que teria agido de forma sistemática para alterar diversos registros e depois tentar apagar os rastros.
Além de ajudante de ordens, Cid é amigo pessoal de Bolsonaro. A relação entre eles é antiga e tem conexões com o pai do militar, o general Mauro Cesar Lourena Cid, que foi colega do ex-presidente na formação de oficiais do Exército.
A intimidade com o assessor chegou a gerar episódios de ciúmes em filhos do ex-presidente. Além de permanecer ao seu lado no Palácio do Planalto e no Palácio da Alvorada (a residência oficial da Presidência), Cid o acompanhava nas viagens, opinava e influenciava em decisões de governo.
O tenente-coronel também é investigado em outros casos envolvendo Bolsonaro, como a tentativa de liberar a entrada irregular de joias milionárias oriundas da Arábia Saudita. No Supremo Tribunal Federal (STF), responde por suspeita de envolvimento no vazamento de informações sigilosas sobre um suposto ataque hacker ao sistema do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A prisão, tendo em vista a influência do coronel na vida de Bolsonaro e nas decisões de governo, é uma das principais preocupações do núcleo bolsonarista, mais do que o conteúdo do celular de Bolsonaro, que foi apreendido. Cuidadoso, o ex-presidente trocava de aparelho e de número de telefone com frequência. Segundo aliados, também apagava mensagens imediatamente após a confirmação de leitura pelo interlocutor.
Além de Cid, foram presos ao menos outros dois assessores que acompanham Bolsonaro há vários anos e contam com seu prestígio e confiança: Sérgio Cordeiro e Max Machado. Ambos atuavam como seguranças. O grupo viajou com o então presidente para os Estados Unidos dois dias antes do término do mandato e uma semana após a suposta falsificação.
A operação se chamou Venire em referência ao princípio do direito civil "Venire contra factum proprium", que significa "vir contra seus próprios atos".
Curiosamente, a falsificação buscava justamente a comprovação do cuidado que Bolsonaro se gabou em não possuir. E ao condenar as vacinas que salvaram milhares de vidas, ele arrastou para o negacionismo também os assessores, de quem debochava caso buscassem realmente se imunizar.