As informações preliminares da Polícia Federal (PF) sobre a operação na qual foi preso o tenente-coronel Mauro Cid e outras cinco pessoas ligadas ao ex-presidente Jair Bolsonaro indicam que estamos diante de um escândalo que pode ser chamado de "vacina-papel".
Crítico das vacinas que fizeram cessar a mortandade por covid-19 no mundo, Bolsonaro cantou em prosa e verso que não vacinaria a filha Laura, 12 anos, e assim estimulou outros pais a não vacinarem os filhos.
Como a falta de comprovante de vacinação impedia brasileiros de entrarem nos Estados Unidos e em outros países, o coronel Mauro Cid, faz-tudo da família Bolsonaro, teria resolvido o problema a seu modo, encontrando alguém que inserisse dados falsos no sistema do Ministério da Saúde, para garantir um certificado e enganar as autoridades.
Cid foi preso porque a PF descobriu que ele falsificou a própria carteirinha e também a da esposa e da filha.
Ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Cid é o mesmo que coordenou a frustrada tentativa de resgatar as joias de R$ 16,5 milhões oferecidas pelo governo da Arábia Saudita à então primeira-dama Michelle. Com entraram no país ilegalmente, as joias foram apreendidas pela Polícia Federal no aeroporto de Guarulhos, e Bolsonaro tentou resgatá-las até os estertores do seu mandato.
Ainda de acordo com a investigação, os dados falsos foram inseridos no sistema do SUS e apagados depois da emissão dos certificados que poderiam ser apresentados como prova de que a pessoa foi vacinada. Além do crime de falsidade ideológica, a PF identificou corrupção de menores e fraude em relação às leis de um país estrangeiro.
A exigência do comprovante de vacinação para entrar em um país, medida também adotada no Brasil sob a Presidência de Bolsonaro, não era um simples capricho. Foi adotada na maioria dos países para reduzir os riscos de um turista infectado contaminar outras pessoas. Questão de saúde pública.
Nesta quarta-feira, Bolsonaro voltou a garantir que não se vacinou porque leu a bula da Pfizer. A combinação entre ignorância e delinquência produziu uma investigação que pode custar caro ao ex-presidente. Seu celular foi apreendido na operação e, mesmo que parte do conteúdo já tenha sido apagado, a perícia tem condições de recuperar informações pretéritas.
ALIÁS
O que está mal explicado é o fato de a investigação sobre possível adulteração da carteira de vacinação, sobre a qual Bolsonaro havia imposto sigilo de cem anos, ter sido pendurada no inquérito das milícias digitais. Deveria ser uma investigação à parte, para não misturar as cartas.