Ex-diretor do Banco Central (BC), Alexandre Schwartsman avalia que a economia nacional passa por período de estagnação. Um dos nomes mais influentes do debate nacional na área, afirma que a retomada depende do avanço da reforma da Previdência, mas vê brecha para medidas com capacidade de gerar benefícios pontuais. Em conversa com a coluna, o economista sugere novos cortes pelo BC na taxa básica de juro, a Selic, ao longo do segundo semestre.
Como descreve o atual momento da economia?
A economia está nitidamente perdendo fôlego. O primeiro trimestre foi fraco, o que em si não é um grande problema. Mas parece que a fraqueza desde o final do ano passado está se mostrando mais persistente. É uma perda de fôlego mais ou menos generalizada, não tanto pelo consumo. O consumo segue crescendo, mesmo que mais devagar do que no passado. O país está sentindo muita fraqueza pelo lado da produção. É algo que preocupa. Mostra que a dinâmica de crescimento está bastante prejudicada.
O que explica o fraco desempenho de setores produtivos?
Na indústria, parte do desempenho está relacionada ao desastre de Brumadinho, em Minas Gerais. Sem querer, obviamente, minorar a tragédia, isso afetou a Vale. Em tese, é um efeito pontual, mas está pesando muito. Outro fator fora de controle do governo federal é a recessão na Argentina. O peso é grande, em particular na indústria manufatureira. O setor de automóveis, por exemplo, tem perdido fôlego, porque as vendas para a Argentina são parte importante da demanda. Se fosse só isso, estaria menos preocupado. Mas as indicações são de que o fenômeno não está circunscrito só aos dois problemas.
Quais são essas indicações?
Um pedaço da história é o investimento, que não se recupera. A ausência do investimento tem limitado muito a recuperação do país. O consumo está um pouco melhor. Ainda vemos alguma força. Mas a fraqueza do investimento faz com que o peso para levantar a economia seja muito maior do que a capacidade do consumo neste momento. De maneira geral, quando olhamos para frente, a perspectiva ainda é de crescimento muito baixo ou de estagnação. Concretamente, corremos o risco de ter uma nova contração no PIB (Produto Interno Bruto) no segundo trimestre. É um risco que não pode ser ignorado.
Com dois trimestres seguidos em queda, o país entraria em recessão técnica, segundo definição usada por economistas. O que isso significaria?
Ter dois trimestres de leves contrações não é o que mais me preocupa. Agora, que a economia está estagnada, não há o que discutir. Esse é o grande problema. A economia sofreu uma grande queda, e a recuperação tem sido pífia. Ou seja, não estamos exatamente no fundo do poço, mas estamos bem pertinho dele. Quase não saímos de lá. A economia não tem mostrado capacidade de recuperação.
A recuperação da economia depende de quais medidas?
É um conjunto. É preciso entender por que o investimento está deprimido. Acredito que o investimento esteja deprimido porque o cenário das contas públicas, sem reformas, é bastante complicado. Sabemos que o teto de gastos, que tem ajudado na redução do ritmo de crescimento da dívida, é insustentável em período de três anos sem a reforma da Previdência. Sem avanços nas reformas, não dá para manter o teto de gastos, não dá para manter certa estabilidade da dívida, e correríamos o risco de ter processo inflacionário. Isso trava investimentos. Também há incertezas sobre a capacidade de o governo levar adiante ajuste fiscal estrutural, e não uma coisa que seguraria as pontas por um ano ou dois.
Na sua avaliação, além das reformas, o que mais poderia ser feito?
Há percepção de que, embora o Banco Central tenha cortado bastante o juro, esse corte não parece ser consistente com a ideia de uma economia em recuperação. A inflação provavelmente fechará o ano abaixo do centro da meta. Acho que há espaço para o Banco Central retomar o processo de afrouxamento monetário ao longo da segunda metade do ano. A recuperação cíclica da economia está ligada, provavelmente, a algum afrouxamento adicional no juro.
A taxa básica de juro, a Selic, está em 6,5% ao ano. Poderia cair até qual nível?
Tenho falado em algo no entorno de 5,5% ao ano. Há, aparentemente, algum espaço para corte no juro. Pode dar impulso ao consumo, algum estímulo, em menor escala, para o investimento. Ajudaria a economia a sair do fundo do poço, e não, necessariamente, melhoraria a capacidade de crescimento no longo prazo. A margem fiscal do governo é virtualmente inexistente. Para se usar mais o gasto público, a taxa de juro seria menos acionada. A taxa de juro ainda está muito alta. Não é pelo lado do gasto público que sairíamos das dificuldades. Há discussão sobre liberação do PIS/Pasep, do FGTS. Poderia ajudar um pouco, mas seria algo limitado. Seria um toque no acelerador para dar um pouco de gás. O que se pode usar bastante é a taxa de juro.