Conhecido como um pioneiro da doutrina liberal na economia no Brasil, Paulo Rabello de Castro foi presidente do BNDES no governo Michel Temer e é um duro crítico das gestões petistas. Na época, relata, fez uma devassa nos empréstimos concedidos pelo banco público para ter certeza de que não havia ameaças para a instituição – Rabello fundou a primeira agência brasileira de classificação de risco. Diante da insistência do governo Bolsonaro em "abrir a caixa-preta do BNDES", focando em operações feitas em Cuba e na Venezuela, o economista, conhecido pelo verbo implacável, afirmou à coluna:
– É uma busca insana sobre coisa nenhuma, uma espécie de Santo Graal ao contrário, como um filme de Indiana Jones (Santo Graal é uma relíquia lendária, o cálice que Jesus Cristo teria usado em sua última ceia com os apóstolos, que teria poderes milagrosos).
Leia os principais trechos da entrevista:
A caixa-preta do BNDES
"É uma busca insana sobre coisa nenhuma, uma espécie de Santo Graal ao contrário, com um filme de Indiana Jones, só que já encheu o saco. Não estou sendo exagerado não, é que o BNDES é a maior banca de advogados do país, tem . 400 profissionais do Direito lá dentro. Está tudo absolutamente documentado por contratos regidos pela legislação brasileira. Nem um parafuso sai do lugar se não for aprovado. As políticas do BNDES dependem da política do governo."
O desejo de Bolsonaro
"Vai saber o que aquela cabecinha pensa. Não pensa em nada, mas é mais esperto do que todos nós. Sobreviveu à terceira guerra mundial, quando só sobreviveram... alguns guerreiros. Ele está há 30 anos dando e levando botinada. Para ele, esse assunto é mais uma botinada. Não pode estar tão interessado assim no BNDES, o interesse é pela discussão política, especialmente em três palavras: Cuba, Venezuela e mais uma um duas desse tipo. Vai lá atrás nos arquétipos do anticomunismo. Sugere que o BNDES teria sido agente de aproximação desse eixo do mal."
Cuba e Venezuela
"Não existe financiamento para os países. Cuba não pode vir aqui pedir empréstimo. A aprovação (de um financiamento do BNDES) é para uma obra, uma exportação de serviço em que empresas do Brasil, com CNPJ brasileiro, exportam produtos, como guindastes e tratores, e serviços de engenharia. E todo e qualquer centavo desses empréstimos volta para o banco. Não importa se se vende a cama para convento, hotel ou casa de tolerância. A venda da cama é segurada, 100%. Agora, a Odebrecht (uma das beneficiadas por liberação de recursos para obras nos dois países) pediu recuperação judicial (seus débitos, inclusive com bancos como o BNDES, serão reduzidos e parcelados), mas tudo está coberto por seguro."
A cobrança ao novo presidente do banco
"É claro que o rapaz tem o benefício da juventude, mistura audácia com inexperiência. É adequado para o tipo de responsabilidade que assumiu. Mas não tem como não cumprir rigorosamente toda a legislação brasileira presente. O jogo vai ser um empate sem gols. Nem vão deixar que faça bobagens, nem ele vai cometer nenhuma audácia. Estou abrindo meu coração para que as pessoas se desarmem. Quando cheguei lá, vi uma equipe muito mais do que desmotivada, paralisada pelo pânico de decidir qualquer coisa. Um órgão da adminstração pública é um organismo vivo, precisa de motivação, apoio, não de botinada. Mas se houver irregularidades ainda não expostas pelo Livro Verde, que montei na minha chegada ao BNDES, vou ajoelhar no milho na frente do presidente pela minha imbecilidade."