O início de 2019 marca o momento em que Jair Bolsonaro (PSL) deixa a figura de crítico de "tudo o que está aí" e passa a ser protagonista na busca de soluções para problemas históricos do país.
A guinada do Brasil à direita inclui extensa pauta conservadora nos costumes e liberal na economia. Entre os desafios, estão a articulação política com o Congresso e a superação da crise fiscal, gerando empregos e capacidade de investimento e reduzindo o rombo da Previdência.
Com a força dos 57,7 milhões de votos dados a Bolsonaro em outubro, aliados veem a popularidade como trunfo na negociação de pautas impopulares que dependem do Legislativo.
A lua de mel com eleitores e apoiadores de última hora pode não ser suficiente. Será preciso trabalhar na Câmara e no Senado para consolidar o apoio para pautas polêmicas, em especial às propostas de emendas à Constituição (PEC). Um exemplo é a reforma da Previdência, que, pelos planos do governo, começará a ser votada ainda no primeiro semestre.
– Bolsonaro vai precisar de bons negociadores. Não me parece que esteja colocando pessoas na articulação que tenham experiência e a confiança do Legislativo – avalia a professora de Ciência Política da Unicamp Andréa Freitas.
A equipe de negociadores será liderada pelo chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e inclui parlamentares que não renovaram seus mandatos na última eleição.
A formação do primeiro escalão não foi negociada com os líderes dos partidos que deverão sustentar a base do governo. Em vez disso, Bolsonaro aceitou indicações de bancadas temáticas, mas esses grupos são mais voláteis em temas que fogem a suas áreas de atuação. Os partidos ganharam maior liberdade para indicar nomes no segundo e terceiro escalões.
No Congresso, a área da segurança trará desafios baseados em promessas de campanha. A redução da maioridade penal só poderá ser feita por PEC. Não menos polêmica, a flexibilização do Estatuto do Desarmamento também entrará na pauta. Apesar da expectativa de intensos e longos debates, especialistas no tema criticam o viés ideológico das discussões.
– No Brasil, direita e esquerda usam muita ideologia na segurança e pouca ciência. Não deveria ser uma questão de gosto, mas do que funciona – pontua o diretor-executivo do Instituto Cidade Segura, Alberto Kopittke.
Cenário externo já mobiliza atenções
Na educação, novas regras para o Fundeb, principal mecanismo de financiamento, deverão ser definidas e votadas por deputados e senadores até o final de 2020. Educadores apontam a medida como a mais importante para equalizar as diferenças regionais no ensino. O projeto Escola Sem Partido, defendido por aliados do governo, deverá voltar aos holofotes depois de ter retornado à estaca zero.
Na política externa, antes de assumir o governo, Bolsonaro criou situações de desconforto com a China, após fazer discursos pró Estados Unidos, e com países do Mercosul. A intenção de mudar a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém gerou mal-estar com parceiros árabes.
Com o apoio das urnas para romper com o sistema político atual, a partir de agora Bolsonaro terá de ir além do discurso ideológico e provar que as receitas que apresentou durante a campanha serão suficientes para enfrentar as carências e desafios do país.
– Bolsonaro terá de compatibilizar expectativas eleitorais, envolvendo a reinvenção de como se faz política no Brasil, e consolidar isso em termos concretos no dia a dia – diz Creomar de Souza, professor de Ciência Política da Universidade Católica de Brasília.