Se durante a campanha eleitoral declarações controversas de Jair Bolsonaro sobre política externa entravam na conta da retórica exacerbada da disputa, sua repetição no papel de presidente eleito começa a render dores de cabeça. O primeiro sinal de que as consequências não esperam por medidas práticas foi a reação do governo do Egito, que cancelou visita diplomática brasileira em reação ao mero anúncio de Bolsonaro de que pretende transferir a embaixada do Brasil em Israel de Tel-Aviv para Jerusalém.
Além de provocar a irritação de países árabes, Bolsonaro já despertou preocupação da China, com suas restrições a investimentos no Brasil, e da União Europeia, com a hipótese de abandonar o Acordo de Paris.
O indicado a ministro da Economia foi tão agressivo ao dizer que o Mercosul não seria prioridade no futuro governo que teve de pedir desculpas. Somadas, as exportações a esses países e blocos representam 58% das vendas brasileiras ao Exterior.
Ex-secretário de Comércio Exterior do Brasil, Welber Barral avalia que há risco real de retaliação comercial a produtos nacionais. Assim como o Egito “deu uma desculpa” para cancelar a visita brasileira, eventuais represálias serão facilmente embaladas por barreiras técnicas ou sanitárias.
– Não deve haver retaliação declarada. São 22 países árabes que podem deixar de emitir certificados sanitários ou de habilitar unidades de produção de carne. Podem preferir comprar de outros fornecedores.
Barral detalha que, no principal produto vendido aos árabes, o Brasil concorre com Argentina e Austrália em carne bovina, e com a Tailândia em frango.
– Em percentual de importação em relação ao consumo, os países árabes representam o segundo maior comprador, só atrás da União Europeia. É um mercado premium, que paga bem, e tem grande volume. Mas também se vende para lá açúcar, alimentos processados e móveis – detalha.
O especialista observa que outros presidentes e integrantes de governo não tiveram percepção clara de grandes conflitos internacionais.
– Tendemos a simplificar demais situações que não entendemos totalmente. Isso não quer dizer que o Brasil não possa mudar a cidade da embaixada, mas tem de analisar o custo/benefício. E não vejo benefício.