O maciço apoio empresarial dado ao presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) não impediu que fracassassem tentativas de evitar decisões contrárias a seus interesses. A não inclusão da Indústria e Comércio no superministério da Economia foi um dos primeiros pedidos ao ainda candidato, que pareceu acatar a sugestão.
Nesta terça-feira (30), justo no dia de posse na Confederação Nacional da Indústria (CNI), o futuro governo confirmou a concentração de poderes nas mãos de Paulo Guedes. O presidente da entidade, Robson Andrade, que assumirá mais um mandato, havia afirmado há duas semanas, que a indústria não poderia “estar ligada a alguém que pensa apenas no aumento da receita ou na redução das despesas”. Ontem, ao ser lembrado dessa e de outras objeções, o futuro superministro reagiu com irritação:
– Nós vamos salvar a indústria brasileira, apesar dos industriais.
A fusão dos ministérios de Agricultura e Meio Ambiente também é motivo de preocupação no meio empresarial. A união não é consenso sequer na bancada ruralista, que teme barreiras à exportação de produtos agropecuários brasileiros sob o argumento da falta de compromisso com proteção ambiental. Barreiras desse tipo estão em alta em todo o mundo.
Como o Brasil é forte competidor nessa área, a fusão pode se tornar a desculpa perfeita dos concorrentes para impor restrições à venda de grãos, carnes e outros produtos nacionais no Exterior. O ex-ministro da Fazenda Rubens Ricupero, disse à coluna na semana passada:
– A fusão do meio ambiente com a Agricultura pode isolar muito o Brasil e criar muitos problemas, inclusive comerciais.
Diante das advertências, Bolsonaro havia recuado. A reação já começou: antes da festa da posse, a CNI emitou nota reiterando sua oposição ao superministério (veja abaixo). Haverá espaço para negociação ao eleitorado cativo?
CNI se manifesta contra extinção do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) manifestou nesta terça-feira (30/10) que é contrária à extinção do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) e sua anunciada fusão com os Ministérios da Fazenda e do Planejamento.
"Tendo em vista a importância do setor industrial para o Brasil, que é responsável por 21% do PIB nacional e pelo recolhimento de 32% dos impostos federais, precisamos de um ministério com um papel específico, que não seja atrelado à Fazenda, mais preocupada em arrecadar impostos e administrar as contas públicas", justifica o presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, acrescentando que indústria gera cerca de 10 milhões de empregos no país e é responsável por 51% das exportações nacionais. Além disso, acrescenta, a excessiva concentração de funções em um único ministério reduziria a atenção sobre temas que são cruciais para a indústria, que ficariam diluídos em meio aos incêndios que cotidianamente desafiam a gestão macroeconômica.
Para Robson Andrade, o próximo governo tem o desafio incontornável de recolocar o Brasil no caminho do desenvolvimento econômico e social. Para isso, segundo ele, o país precisa ter uma indústria forte. Daí, ser imprescindível que o país tenha um ministério independente para elaborar, executar e coordenar as políticas públicas para o setor industrial e monitorar seus impactos. "Nenhuma grande economia do mundo abre mão de ter um ministério responsável pela indústria e pelo comércio exterior forte e atuante", afirma.
O presidente da CNI destaca ainda que, desde a crise de 2008 e o impacto da Indústria 4.0, aumentou o número de países com ministérios específicos e estratégias industriais. A Inglaterra, por exemplo, voltou a incluir um dos seus órgãos estatais voltados para temas empresariais — seu nome é Departamento para os Negócios, Energia e Estratégia Industrial. Os Estados Unidos, que são tidos como referência de liberalismo econômico, empreendem uma política industrial ampla e consistente, com um Departamento de Comércio que foi reforçado pelo governo Donald Trump para, justamente, cumprir essa função.
"A eventual perda de status do MDIC colocaria o Brasil, portanto, na contramão dessa tendência e reduziria a nossa capacidade em negociações internacionais", ressalta Robson Andrade.