Vice-governador do Estado de 1999 a 2002, o sociólogo Miguel Rossetto (PT) quer retornar ao Palácio Piratini, desta vez para ocupar o principal gabinete da sede do governo gaúcho. Aos 58 anos, o candidato defende uma agenda de estímulo ao desenvolvimento com investimentos públicos e privados em infraestrutura e logística. Para tanto, Rossetto quer renegociar a dívida com a União, buscar ressarcimentos da Lei Kandir e criar mecanismos de geração de emprego e renda.
— Vou assumir essa responsabilidade e construir uma agenda econômica de desenvolvimento. Temos de atrair investimentos privados, nacionais e internacionais, crédito junto a agências de financiamento — assegura.
Ex-ministro dos governos Lula e Dilma, o petista promete pagar salários em dia já em janeiro de 2019, quer melhorar a qualidade do ensino público e montar centros regionais especializados de tratamento de saúde. É contra a privatização de estatais, mas não descarta concessões à iniciativa privada.
Rossetto é o sexto entrevistado da série de GaúchaZH sobre o que propõem e como pensam os postulantes ao governo do Estado. A publicação segue a ordem das entrevistas agendadas com as assessorias dos candidatos.
É 1º de janeiro e o senhor acabou de tomar posse como novo governador. Qual a primeira medida que pretende tomar para tentar solucionar, a curto ou longo prazo, o que considera o mais grave problema do Estado?
Vou levar a Brasília uma agenda de investimentos para que o emprego volte ao Rio Grande. O governador deve liderar a saída da crise. Vou convidar a sociedade, os partidos, os eleitos, e construir uma pauta do Estado para tratar diretamente com o presidente da República e os líderes do Congresso. Exemplos: o polo naval, o polo carboquímico, a infraestrutura, com as BRs 116, 290, 386, a ferrovia norte-sul, linhas de transmissão. O central aqui é investimento e emprego, gerar crescimento econômico. E vamos tratar também de dívida e Lei Kandir.
O senhor espera receber dinheiro do governo federal?
Claro. Temos experiências positivas. O Estado recebeu grandes investimentos com Lula e Dilma: três universidades, polo naval, duplicação da BR-101, programas na área de energia e biodiesel, agricultura, indústria. Vamos disputar investimentos junto ao governo federal, a todas as instituições financeiras e reposicionar o Estado. Essa é uma pauta muito importante para que o Rio Grande volte a crescer. Estamos há três anos com queda na atividade econômica, quase 8% de recuo, sem contar 2017 porque Sartori conseguiu a proeza de acabar com a FEE e não temos o PIB de 2017.
No Estado, que medidas o senhor pretende tomar para resolver as finanças?
O melhor remédio é crescimento econômico. Gera emprego e arrecadação de tributos. E depende de iniciativa do governo do Estado. O atual foi omisso em todos os temas que envolvem a economia gaúcha: perdemos o polo naval, crise no setor leiteiro, indústria do calçado fechando. Não houve nenhuma iniciativa positiva. Vou assumir essa responsabilidade e construir uma agenda econômica de desenvolvimento. Temos de atrair investimentos privados, nacionais e internacionais, crédito junto a agências de financiamento.
Mas isso não ocorre do dia para a noite. Enquanto não vier esse crescimento, como equalizar as finanças e pagar salários em dia?
A prioridade é o crescimento, é ele que vai ajustar a arrecadação. Vamos melhorar a eficiência na cobrança da dívida ativa, gastar menos, buscar recursos federais, abrir espaço para investimentos. Quando fui eleito vice do governador Olívio Dutra (PT) em 1998, MDB, PSDB e PP diziam que não pagaríamos salários se não vendêssemos o Banrisul e a Corsan. Não vendemos e nunca atrasamos salários.
A situação não era tão caótica, salários foram entregues em dia e o 13º pago. Agora o atraso já dura 33 meses, o 13º vem sendo parcelado. A realidade é mais crítica.
Mas a previsão lá tinha tanta base técnica como a de hoje. Inclusive são os mesmos personagens. Não tenha dúvida de que Sartori governou mal e ampliou essa crise. Vamos assegurar o pagamento em dia a partir do início do meu governo. Não sei o que vou encontrar. Estou assumindo um compromisso claro: nós começamos a pagar em dia a partir de janeiro. Governar é fazer escolhas e a minha está feita. É fundamental retomar o pagamento em dia.
Quem vai deixar de receber?
Não quero que ninguém deixe de receber. Há um dado revelador da ineficiência deste governo. Há um mês o governo anunciou que pagaria os salários no dia 23. Dois dias depois, anunciou que entrou R$ 400 milhões no caixa e vai pagar no dia 12. Óbvio que tem desorganização no caixa. Pagar em dia não é aumentar despesa, é organizar fluxo financeiro, obrigação de um governante. Isso representa credibilidade. Governar um Estado não é governar município. É muito mais complexo. Fui vice-governador num período de grave crise, fui ministro do presidente Lula em 2003 e também o país vivia crise grave. Tenho experiência para governar na crise e tirar governos de crise, sem vender o Estado.
O governo Tarso usou os depósitos judiciais para pagar em dia. Sartori vendeu a folha, antecipou recursos da GM. Essas alternativas estão esgotadas. Como fazer agora?
Todos os governos têm seus desafios e oportunidades. Quando governamos com Olívio e Tarso, fomos atrás. Não só pagamos em dia, criamos a Uergs, os programas Primeiro Emprego, Extensão Empresarial, apoiamos a agricultura familiar, o cooperativismo. Não tenho dúvida da gravidade da situação que irei encontrar, o governo Sartori aprofundou a crise. Ampliou o déficit em mais de R$ 12 bilhões, porque foi no caixa único e não pagou desde julho de 2016 a dívida. Mas me sinto preparado. Por fim, teremos nova realidade política, novo presidente, novo Congresso. Quero mudar a correlação de forças e quero enxergar um país que volte a crescer e ajude o Rio Grande.
Mas a nova realidade política pode ser refratária às suas aspirações. Seja quem for o novo presidente, terá de fazer um ajuste fiscal, o Estado não tem margem para endividamento...
Desculpe, mas é possível continuar com a Emenda Constitucional 95, que congelou os gastos públicos por 20 anos? Não tem Brasil, não tem democracia que aguente isso. Óbvio que a realidade política vai impor a mudança dessa situação. A política de ajuste fiscal contra o povo, contra Estados e municípios, é desastrosa. Estamos vivendo isso hoje.
O que garante que o governo federal abrirá o cofre ao Estado?
A pressão democrática da sociedade.
Teria de abrir a todos.
Óbvio que sim. Temos de repensar a federação. Brasília deixou de assumir sua responsabilidade a partir da Emenda 95, votada por MDB, PSDB e PP. Esses partidos condenam a federação.
Isso não ocorreu nem quando tivemos o que vocês chamavam de alinhamento das estrelas, com os governos Dilma e Tarso.
Avançamos muito. Tarso e Dilma fizeram a renegociação da dívida, reduziram em R$ 22 bilhões. Foi assinada pelo Sartori, mas foi aprovada pelos governos Tarso e Dilma em novembro de 2014. Foi muito importante, abriu espaço fiscal para o Rio Grande do Sul. É preciso avançar mais. Não interessa ao país uma crise federativa, nos Estados e municípios, quem paga é o povo. São os 500 mil gaúchos desempregados que pagam essa conta. Tenho experiência e sei que a autoridade política de um governador será retomada. Não continuaremos com essa postura omissa ou submissa.
Sartori amplia a crise porque trabalha mal, pouco e faz escolhas erradas.
MIGUEL ROSSETTO
Candidato do PT ao Piratini
O senhor diz que a culpa da crise é do Sartori, que diz que é culpa do Tarso, que deixou déficit. Quem fala a verdade?
Sartori amplia a crise porque trabalha mal, pouco e faz escolhas erradas. A crise é aprofundada pelo governo Temer. Por isso, temos de mudar o Brasil e defendo mudança com Lula, Haddad e Manuela. A agenda nacional bate direto no Rio Grande do Sul e é a grande responsável por uma recessão de 8%. Não me parece correto essa afirmação permanente que o Sartori faz. E por uma razão singela: 2015 foi o melhor ano financeiro do Sartori, ele pagou 10 meses em dia, pagou a dívida e não havia aumento de ICMS. A crise aparece em 2016 e 2017.
Sobre o ICMS, o senhor pretende manter a alíquota atual, reduzi-la, aumentá-la?
A redução vai depender da economia gaúcha. Vamos ter de manter todas as alíquotas de ICMS, dos outros tributos do Estado e a diminuição será feita a partir do desempenho da economia.
Dados do Ideb são péssimos. O que fazer para melhorar a qualidade da Educação Básica?
Temos uma política de curto prazo. Primeiro, pagar em dia o professor. Segundo, fazer manutenção básica nas escolas. Terceiro, criar batalhões escolares e corredor de segurança. Alunos deixam de estudar porque têm medo de ir à escola. Em Alvorada, conheci uma que teve 140 notificações de assaltos em 180 dias. São arrastões feitos de manhã. Não posso aceitar que um jovem deixe de ir à escola porque tem medo de ficar numa parada de ônibus. No médio prazo, vamos buscar fundos extraordinários, financiamentos, para, num prazo de 10 anos, qualificar a rede escolar e pedagógica.
O senhor se compromete a pagar o piso do magistério?
Meu compromisso com os professores é pagar em dia os salários.
É possível pagar o piso sem mexer no plano de carreira?
Tenho assumido um compromisso claro: pagar em dia salários dos professores. Vamos ter um ambiente permanente de diálogo com os servidores.
Quais serão suas prioridades na segurança pública?
Precisamos recompor o efetivo. São 5 mil policiais a menos na Brigada, na Polícia Civil, no IGP, na Susepe e no Corpo de Bombeiros. Quero policiamento preventivo, não reativo, com a Brigada num policiamento comunitário em bairros e vilas. Quero a Polícia Civil ampliando a capacidade de investigação contra o tráfico de drogas, roubo de carros e mais integração nos serviços de inteligência. Quero maior integração com as prefeituras, guardas municipais e as estruturas federais. Vamos dialogar com o Judiciário e o Ministério Público. Em torno de 30%, 40% dos apenados não têm sentença definitiva. Temos de avaliar isso. No sistema prisional, facções não vão controlar os presídios.
Como?
Vamos revisar o sistema. Precisamos qualificar a Susepe. Há experiências importantes, como as Apacs (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados), entidades da sociedade civil com resultados positivos para apenados de baixa violência. Presídios têm de ser espaços de socialização.
A Assembleia aprovou há dois anos a lei de concessões de rodovias, mas nada foi feito. Qual é seu plano? Vai manter a EGR?
A EGR é um bom veículo mal pilotado. É um instrumento positivo de pedagiamento a preço reduzido com controle comunitário. A grande virtude eram os conselhos regionais, as comunidades fiscalizavam e definiam os investimentos. O Rio Grande do Sul não que mais viver a experiência de pedágios caros e sem investimento. O atual governo acabou com os conselhos regionais. Vou voltar com eles.
A EGR participaria de uma licitação ou o senhor descarta concessões privadas?
Não descarto. Podem ser instrumentos importantes, desde que o interesse público presida essas concessões. PPPs (parceria público-privada) também. Essa PPP que envolve a Corsan na Região Metropolitana é absolutamente insustentável. Como pode fazer uma PPP em que o usuário não é informado do preço da tarifa? Esse modelo de concessão confuso, pouco claro, açodado, sem definição do preço final é intolerável.
O senhor revogaria essa PPP?
Temos de ter muito cuidado com essas agendas, portanto quero ser claro: esse modelo revogo. Revogo por conta dessas situações absolutamente nebulosas.
O Estado tem atrasado repasses para Santas Casas e hospitais filantrópicos. Como pagar em dia?
O meu segundo movimento será chamar prefeitos, hospitais e o conselho estadual e reorganizar o planejamento financeiro. Tenho visitado muitos hospitais. As prefeituras sustentam o Sistema Único de Saúde, estão assumindo responsabilidades que Brasília deixou. Vamos regularizar os repasses e o governo vai voltar a ter papel de coordenação. Cada região terá seu centro especializado. Vamos aproveitar a própria rede e, numa relação sugerida de consórcios municipais com o governo do Estado, ampliar recursos na área das consultas especializadas. Também precisamos espaços especializados para tratamento de idosos.
Está se discutindo a venda de CEEE, CRM e Sulgás, mas qual seria sua opinião sobre as fundações que foram extintas no governo Sartori? O senhor pretende reativá-las?
Para deixar claro: Banrisul não será privatizado. É um erro estratégico acabar com instituições de pesquisa, de inovação. Vamos recuperar nossas instituições de pesquisa e criar programas fortes, com polos tecnológicos, para transferência desse conhecimento para a indústria gaúcha.
Em maio de 2016, o senhor deixou o governo Dilma e desde então está sem emprego. Como paga suas contas?
Eu trabalho. Hoje é o partido que me paga. Sou profissionalizado pelo partido. Desde o momento que assumi minha candidatura, tenho dedicação direta e sou profissionalizado pelo partido.