Liberal convicto e dono de patrimônio de R$ 25 milhões, o consultor Mateus Bandeira (Novo) entra na briga pelo comando do Palácio Piratini prometendo bater de frente com sindicatos, extinguir órgãos como a Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR), mexer no plano de carreira do magistério e criar secretaria extraordinária de desestatização.
Presidente do Banrisul e ex-secretário do Planejamento no governo Yeda Crusius (PSDB), de 2007 a 2010, o pelotense de 49 anos apresenta-se como novato na política e diz não temer polêmicas: quer carta branca dos eleitores para privatizar o que for possível — inclusive o banco que dirigiu. Se for eleito, admite seguir atrasando a folha de pagamento do Executivo e passar a fazer o mesmo com os repasses dos demais poderes, para que todos sejam "sócios do ajuste".
— Vamos levar o assunto ao Supremo Tribunal Federal e discutir se alguns são cidadãos de primeira classe e outros de segunda classe. Juiz, promotor e deputado têm precedência sobre professor, policial e profissional da saúde? — questiona. Bandeira é o primeiro entrevistado da série de GaúchaZH sobre o que propõem e como pensam os postulantes ao governo do Estado. A publicação segue a ordem das entrevistas agendadas com as assessorias dos candidatos.
Qual primeira medida o senhor pretende tomar para resolver o que considera o mais grave problema do Estado?
O principal problema é a absoluta desordem das contas públicas. Tão grave quanto isso é a falta de segurança pública. São duas agendas imperiosas e uma não pode esperar a outra. No caso das contas públicas, o único caminho viável de curto prazo é a adesão ao regime de recuperação fiscal, que pressupõe privatizações.
O que fará na semana inicial?
O ano legislativo não terá se iniciado, então não teremos como encaminhar as propostas, mas queremos apresentá-las à sociedade. As primeiras serão muito mais emblemáticas, como a redução drástica do número de secretarias. Vamos trabalhar com 10 e uma ou duas extraordinárias. Uma será a de desestatização, enquanto durar o trabalho de privatizações.
Vender estatais passa por plebiscito ou pela retirada dessa exigência da Constituição. O governo atual tentou e não conseguiu. O que o senhor fará?
Vou fazer campanha falando com franqueza que é preciso, sim, vender estatais. O Estado não deve ser empresário, perdendo recursos, energia e foco para cuidar de segurança pública, saúde de boa qualidade. Se os gaúchos votarem no Mateus, estarão votando em uma proposta que tire o Estado do comando das estatais.
O senhor venderia o Banrisul?
Sim. E vou dizer por quê. Fui presidente do banco. Tem muita gente boa lá que tem o crescimento limitado em razão de indicação política. O banco é alvo de disputa por partidos, assim como todas as estatais. Cumprimos o mandato e entregamos, em 2010, o melhor ano da história do banco no índice de eficiência e o segundo melhor ano em lucratividade, só superado pelo ano seguinte, que obviamente se beneficiou de medidas que a gente tomou.
Não seria o caso de manter o banco e fazê-lo dar mais lucro?
E aí vem outro governo, tem interferência política. Hoje, o banco entrega lucratividade de 11%, 12% sobre o patrimônio empregado. No ano que eu dirigi, era 20%. Hoje, entrega metade do que poderia.
Não tem risco de vender o banco e o dinheiro virar pó pagando despesa corrente?
Tem, e sou contra vender para cobrir despesa corrente. Me opus à venda de ações. Se o argumento para não vender é porque dá lucro e a gente recebe dividendos, não faz sentido vender ações que nos conferem o direito a lucro. A pergunta é: o Estado deve ter um banco?
Mas o que o senhor faria com o dinheiro da venda?
Há várias alternativas. Uma é reduzir a dívida com a União. Vende o controle do banco, fica com 49%, e liquida parte da dívida. Ou forma um fundo garantidor para retomar as parcerias público-privadas.
O senhor não quer usar recurso de privatizações na folha, mas como botar os salários em dia?
A folha não vai ser colocada em dia no primeiro mês e talvez nem no primeiro ano. Quem diz que vai fazer isso ou desconhece os números ou é demagogo. Se o Estado voltar a pagar a dívida com a União, hoje suspensa por liminar, o déficit será de R$ 28 bilhões em quatro anos, média de R$ 7 bilhões por ano, talvez R$ 6 bilhões ano que vem. São três folhas de pagamento. Tem de imediatamente começar a restabelecer o princípio básico das contas: não se gasta mais do que se arrecada. Precisa congelar despesas.
Pensa em não repassar todo o duodécimo dos poderes?
Penso. Existe um dispositivo constitucional dizendo que o governo deve pagar em dia os servidores. Não tem recurso, então não paga. Existe outro dispositivo dizendo que deve repassar o duodécimo todo dia 20. Um ele descumpre, o outro não, talvez porque afete os mais poderosos. O que justifica que um juiz receba em dia, antes de um policial que está nas ruas para nos defender? O que justifica que um deputado receba antes de um professor? Se não houver recursos para a folha, não vou repassar o duodécimo. Todos vão receber no mesmo dia.
O Judiciário não pode determinar sequestro dos recursos?
Pode até mandar me prender. Vamos levar o assunto ao Supremo Tribunal Federal, discutir se alguns são cidadãos de primeira classe e outros de segunda.
O senhor alteraria o plano de carreira dos professores?
Sim. Nenhum governo conseguiu alterar o plano de carreira, nem os de esquerda. Não conseguiram sequer pagar o piso. Aplicar o piso do jeito que o magistério quer, lá no vencimento básico, significa um impacto de R$ 500 milhões mensais. A gente precisa rever esse quadro e temos propostas inovadoras para a educação. Uma delas é a compra de vagas em escolas privadas.
Como fazer isso, se faltam recursos? E como escolher os alunos, deixando uns na escola pública e outros na privada?
Começando com um projeto-piloto e trabalhando para aprovar no Congresso alteração na lei do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica), que não permite uso de recurso público para contratar educação de escolas filantrópicas. Enquanto isso, podemos começar um projeto de escolas comunitárias. Elas funcionam com orçamento do poder público, que se limita a cobrar desempenho e dar transparência. As escolas ficam livres das amarras do Estado e dos sindicatos, têm autonomia para contratar, promover, desligar, criar sistema de incentivo e fazer com que a escola toda esteja voltada para a melhoria da aprendizagem. Gasta-se mais hoje com aposentadoria do que com educação. Aposentadoria do magistério não é educação.
O senhor acha que a educação não tem de ser pública?
A educação pode ser pública, não estatal. É diferente. O papel do Estado não é ser dono da escola, não é contratar professor. O papel do Estado é garantir acesso a boa educação. Se não tiver educação privada em uma cidade do Interior, tudo bem que ele construa a escola, que tenha a escola ou que chame alguém para fazer a escola. Agora, ela não precisa ser estatal. Qual é o papel do Estado? Penso que é garantir chances iguais para todos. Como? Com acesso a boa educação, não necessariamente sendo dono da escola e se tornando refém de um sindicato de professores estaduais.
Mas hoje o Estado é dono de escolas e tem rede com milhares de professores. Dar vouchers em escola privada significa que não se nomearia novos educadores? O quadro ficaria em extinção?
Estamos propondo a introdução de duas medidas inovadoras. Uma é o vale-escola, espécie de Prouni do Ensino Básico. A outra é a das escolas comunitárias, chamando uma entidade filantrópica ou mesmo privada para gerir uma escola. Ela vai ter condições de colocar a melhor gestão, vai ter liberdade para contratar e promover e vai ser fiscalizada pela comunidade. E há mais duas medidas. O número de alunos da rede pública está diminuindo. Temos pouco mais de 900 mil na rede estadual, dos quais 510 mil são de Ensino Fundamental. Nos últimos 15 anos, e a gente já mostrava isso no governo Yeda Crusius (PSDB), existe redução do número de alunos. Nossa ideia é pegar os 510 mil e, por convênio, transferi-los aos municípios que desejarem, que podem receber os alunos e as escolas.
E vai fazer o que com o professor estadual?
O professor também pode ser transferido por convênio, e a receita que vem do Fundeb vai direto para o município. Isso resolve o problema da receita e da despesa. É óbvio que o professor vai se aposentar e voltar para o Estado. Não tem problema, mas pelo menos não agravamos mais a situação.
Foi aprovada nova lei de concessões. Quais estradas o senhor concederia? E o que faria com a Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR)?
A EGR foi um grande erro político. Foi construída para criar uma cortina de fumaça em relação à não renovação dos polos de pedágio. Não vejo o menor sentido na manutenção da EGR. O que a gente precisa fazer para coordenar as concessões ou um programa de PPPs (parcerias público-privadas) pode ser feito através da secretaria (dos Transportes). E todas as rodovias estaduais de grande fluxo são passíveis de concessão. Isoladamente ou em conjunto ou em polos, isso a gente precisa estudar.
Na segurança pública, qual será a sua prioridade?
Temos ações de curto, médio e longo prazo. As primeiras medidas são no sentido de frear o ritmo acelerado de aposentadorias na Brigada. Enquanto não se muda a Constituição e não existe idade mínima para aposentadoria na segurança pública, a gente precisa criar incentivo para que permaneçam mais tempo em atividade.
Abono de permanência existe.
A gente pode aprimorar tanto o abono quanto o incentivo para trazer aqueles que se aposentaram. Hoje, temos cerca de 600 brigadianos no Presídio Central e na PEJ (Penitenciária Estadual do Jacuí). São servidores da ativa, que poderiam estar na rua, patrulhando.
Como encaixar isso na situação financeira do Estado?
Temos um déficit brutal. É óbvio que vamos fazer isso no limite da capacidade. Pode afetar um pouco mais o déficit? Pode, mas segurança pública não pode esperar. Não pode ficar como o Sartori ficou, três anos sem contratar e depois anunciar a contratação de não sei quantos mil brigadianos, até porque não cabe na capacidade de treinamento da BM. Uma das primeiras medidas é um decreto garantindo calendário de reposição de 1,1 mil brigadianos todo ano.
Independentemente do equilíbrio fiscal?
Sim. E, ao mesmo tempo, aquelas medidas para frear o ritmo das aposentadorias.
Qual é seu plano para a situação caótica dos presídios?
O modelo que funciona é o que buscamos implementar em 2009 (no governo Yeda). Fomos inspirados nos modelos mais bem-sucedidos do mundo. Fomos visitar no Reino Unido três penitenciárias regidas por PPPs. Esses são os modelos com os menores índices de reincidência ao crime no mundo.
O presídio ideal abrigaria quantos presos?
O que visitamos no Reino Unido tinha 3 mil divididos em seis pavilhões de 500, em celas individuais.
Seria possível fazer isso aqui?
Seria, mas aí depende. Não sou partidário de uma grande penitenciária com 5 mil pessoas, mas talvez 3 mil. A gente chegou a ter 3 mil no Presídio Central num modelo esquizofrênico (hoje há 4,3 mil detentos no local). A ideia do presídio de Canoas, que não é uma PPP, mas que deveria ser, porque o Tarso Genro (PT) cancelou, era substituir o Central. Prefiro penitenciárias distribuídas, com número menor de presos. Agora, tem de ter escala mínima para que possa dar rentabilidade e permitir que algum investidor tenha interesse.
O Complexo Prisional de Canoas sempre foi citado como modelo diferente no sistema carcerário gaúcho, mas há pouco houve a entrada de facções e o primeiro homicídio. O que deu errado lá e como evitar?
Proponho que um dos presídios que deve ser construído seja dedicado exclusivamente ao regime disciplinar diferenciado, para a gente isolar comandantes de facções, todos em celas individuais sem nenhuma regalia.
De onde viria a verba para essas PPPs?
Parte dos recursos obtidos com privatizações será usada como fundo garantidor.
Se eleito, o senhor pedirá ao governador Sartori para enviar projeto à Assembleia tratando das alíquotas de ICMS? Em que termos seria?
Nos termos em que já me manifestei. A manutenção imediata no patamar em que está, com redução desde o próximo ano, gradual, até o retorno ao patamar anterior, para que a gente ganhe algum fôlego para tomar as medidas sem que se descortine um déficit gigantesco já no primeiro mês.
A alíquota atual até quando?
Até 31 de dezembro de 2019, reduzindo 25%, depois mais 25%, até voltar ao patamar original.
Como convencer a sociedade com seis segundos na propaganda de rádio e TV?
Com o trabalho que a gente está fazendo nas redes sociais e gastando sola de sapato. Sou o candidato com maior número de seguidores nas redes sociais. Só no Facebook tenho 135 mil seguidores, quase o dobro do segundo colocado e tenho mais engajamento do que todos os candidatos somados. O Novo é o partido que tem o maior número de seguidores nas redes sociais, mais de 2 milhões. É o que mais cresce. É assim que a gente vai convencer a sociedade.