Prefeito de Canoas por dois mandatos consecutivos, o jornalista Jairo Jorge trocou o PT pelo PDT e pretende governar o Estado com mudanças substantivas na estrutura administrativa. Sua plataforma de campanha propõe substituir as 17 secretarias atuais por 10 escritórios regionais espalhados pelo Estado, diminuindo a burocracia e aproximando os serviços públicos dos cidadãos. Para enfrentar a penúria financeira, Jairo promete reduzir as alíquotas de ICMS e diminuir o tempo de liberação das licenças ambientais para atrair investimentos, dinamizando a economia:
— Reduzi o ISS em Canoas em um terço e a arrecadação geral triplicou de 2008 para 2017.
Contrário à privatizações, o pedetista quer tornar as estatais mais lucrativas e eficientes, rejeita os termos do atual acordo de adesão ao Regime de Recuperação Fiscal e busca um pacto com os servidores públicos. Não garante salários em dia nos primeiros meses de governo, mas acena com uma data fixa para o pagamento integral dos vencimentos do funcionalismo:
— Meu compromisso é servidor público em primeiro lugar. Isso vai depender das finanças.
Jairo é o terceiro entrevistado da série de GaúchaZH sobre o que propõem e como pensam os postulantes ao governo do Estado. A publicação segue a ordem das entrevistas agendadas com as assessorias dos candidatos.
É 1º de janeiro e o senhor acabou de tomar posse. Qual a primeira medida que pretende tomar para tentar solucionar o que considera o mais grave problema do Estado?
Criar uma mesa de diálogo. O governador precisa se conectar com os servidores para criar convergência. Defendo um governo com 10 escritórios e três níveis hierárquicos, menos burocracia e menos impostos. O Estado é inóspito ao empreendedor. Proponho a lei do gatilho: quando aumenta a arrecadação real, dispara um gatilho e diminui a alíquota. Sei que posso fazer porque já fiz e deu certo.
O que essa mesa discutiria?
A pactuação, a melhoria do Estado, as relações do governador com os servidores. Se queremos produtividade, temos de ter transparência e diálogo.
O servidor quer salário em dia. Quando o senhor fará isso?
Não existe solução mágica. Tivemos, no primeiro semestre, déficit de R$ 2,5 bilhões. Minha proposta é acabar com o parcelamento. Garantir o pagamento integral, em data aprazada e trazendo de forma progressiva para o último dia útil do mês. Meu compromisso é servidor público em primeiro lugar. Isso vai depender das finanças.
Mas qual sua fórmula para resolver o problema das finanças?
Aumentar receita e reduzir despesa. Somos o Estado mais burocrático do país. Licenciamento de grandes investimentos não sai em menos de 900 dias. Precisamos diminuir carga tributária. Reduzi o ISS em Canoas em um terço e a arrecadação geral triplicou de 2008 para 2017. Todos os governadores fizeram quatro coisas: ou aumentaram impostos ou venderam estatais ou usaram depósitos judiciais ou o caixa único. Isso não tem mais sustentabilidade.
Reduzir alíquota de ICMS não pode dar errado?
Se não calibrar de forma precisa, tem queda na receita. Se reduzir a alíquota atual de 18% para 17%, perde R$ 3 bilhões. Proponho que, em 1º de julho de 2019, caia para 17,75%. Vamos avaliar por um ano. Aumentou a arrecadação, dispara o gatilho. Se tiver redução nominal, volta a subir. Isso vai gerando um círculo positivo. Já fiz e deu certo.
O senhor defende a criação de escritórios espalhados pelo Estado. Não gera mais despesa e cabide de empregos?
Não, porque vou reestruturar. Em vez das 17 secretarias, proponho 10 escritórios. É uma espécie de força-tarefa, vão garantir sinergia entre as equipes.
O senhor defende a redução de secretarias, mas quando foi reeleito deu posse a 22 secretários, 26 secretários-adjuntos, quatro subprefeitos, 11 coordenadores, cinco presidentes de autarquias e quatro assessores pessoais. Vale a teoria ou a prática?
Essa é a minha reeleição, não a minha eleição. É importante ver como fiz e os incrementos que desenvolvi. Não é problema ter secretário, o problema é a estrutura. A minha experiência permitiu ver que pode ser mais enxuto. Criamos uma empresa de tecnologia, uma fundação para a saúde. As subprefeituras foram uma inovação. Quando assumi formei 15 secretarias. Entendi que era preciso uma mudança.
O senhor tinha 14, 15 partidos no governo. Era necessário uma mudança ou acomodar o apoio político dentro da máquina?
Sempre tive apoio. Me elegi com oito partidos e no governo tive 10. Me reelegi com 17 partidos. Nunca nomeei ninguém sem aprovar o currículo e nenhum partido dominou meu governo. É difícil para um prefeito, um governador, atender todos os despachos.
O senhor mudou o plano de carreira dos professores em Canoas. Pretende mudar o plano do magistério estadual?
A grande preocupação dos professores é manter as conquistas. O plano é de 1975 (1974), precisa ser aperfeiçoado. Vamos sentar, sem trauma. Algumas soluções não vieram da minha equipe, vieram dos próprios professores.
Teria promoção por mérito?
Já fiz isso, com sistema de pontuação. São 1,2 mil pontos e o professor precisa alcançar 1 mil. É um sistema de mérito em que um professor não disputa com outro. Ele é o gerente da própria carreira.
É preciso uma solução pactuada, olhando o futuro.
O senhor se compromete com o pagamento do piso?
É preciso uma solução pactuada, olhando o futuro. Há o risco de um passivo judicial que pode quebrar as finanças do Estado. A sociedade tem de tomar isso como tarefa. Se queremos educação melhor, temos de ter salários melhores.
O senhor é contra a privatização da CEEE. Como tornar a empresa lucrativa?
Hoje os funcionários ex-autárquicos representam R$ 1,8 bilhão. Se privatizar, o Estado vai ficar com esse prejuízo todos os anos. Ano passado, a CEEE teve R$ 320 milhões de lucro. Ela tem participação minoritária em 17 empresas. Minha ideia é vender essas participações, algo em torno de R$ 2 bilhões, injetar na empresa e ter melhoria na gestão. Alguns falam em vender a CEEE por R$ 3 bilhões, mas e o R$ 1,8 bilhão dos autárquicos? Em dois anos como fica? Vamos ter de pagar os salários deles. Não está na minha agenda a privatização.
Nem Sulgás e CRM?
Acho que são empresas que precisam ser convertidas. Dão lucro hoje e precisam dar mais lucro.
E a EGR?
Estou avaliando. Temos três órgãos: EGR, Daer e a Secretaria dos Transportes. Tem de ser só um.
Qual sua proposta sobre parcerias público-privadas (PPPs)?
É preciso ter clareza no marco legal e fundo garantidor, que não temos. Proponho usar a Lei Kandir para formar esse fundo. De R$ 65 bilhões (que a União deveria ter repassado ao Estado como compensação), recebemos R$ 15 bilhões e faltam R$ 50 bilhões. Obviamente vai depender de pactuação.
É muito difícil a União devolver esse dinheiro ao Estado.
O impossível está nas mãos daqueles que nada tentam. Vou sentar com o presidente e pactuar.
Que papel terá o regime de recuperação fiscal?
Vou buscar nova negociação. Os termos atuais engessam o Estado. É necessária customização da dívida.
Que garantias temos de que, mantida a suspensão do pagamento da dívida por três anos, vamos conseguir colocar as finanças em dia?
Não pagar não resolve o problema. Pode piorar a situação do Estado. Temos, sim, de negociar a dívida, mas também não dá para engessar o Estado. Não pode ter o engessamento de só trocar o brigadiano que se aposentar, porque é isso que está escrito lá (na atual proposta do acordo). Em 31 de outubro do ano passado, chegamos ao menor efetivo da Brigada Militar desde 1975: 15.810 brigadianos. Em 1975, eram 15.300. Vamos manter esse efetivo baixo em um quadro de crescimento da violência?
O senhor diz que, para resolver o problema das finanças, tem de aumentar a receita e cortar despesas, mas 93% das despesas são rígidas. Como fazer isso?
Toda e qualquer despesa que a gente reduza é importante, e se reduz de um jeito diferente. Quando assumi (a prefeitura de Canoas), tinha R$ 25 mil em caixa, oito meses sem pagar fornecedores e R$ 175 milhões de dívida para uma receita de R$ 36 milhões mensais. Nunca lamuriei, nunca critiquei o prefeito anterior.
Mas como dar resultados?
Tive redução de custeio de 25% quando assumi a prefeitura, porque fiz diferente. Reduzi os níveis hierárquicos, de sete secretarias-meio para três, reduzi CCs (cargos do confiança), reestruturei a prefeitura. É exatamente em cima da minha experiência que estou propondo, por exemplo, três níveis hierárquicos no Estado.
Como funcionaria isso?
Um nível de elaboração, que é de formulação, o governador e um secretário. Um nível de desenvolvimento, que é um diretor. E um nível de execução, que é um gerente. Por que o Estado precisa ter seis ou sete níveis hierárquicos? Todas as organizações exponenciais do mundo, Google, Amazon, têm dois níveis. Quanto menor for a hierarquia, mais rápido os resultados chegam.
Qual prioridade na segurança?
Redução de homicídios, novo sistema prisional, inteligência, câmeras, monitoramento, tecnologia embarcada nas viaturas, informação. Hoje, não temos a informação a serviço do policial.
O senhor cita o presídio de Canoas, mas as facções começaram a entrar e houve homicídio. Como resolver o déficit prisional e controlar o crime organizado dentro dos presídios?
A experiência é vigorosa. Fui procurar a governadora Yeda Crusius (PSDB), que era de oposição. Doamos 50 hectares para construir um projeto modelar, com uma série de exigências. A prefeitura participa do conselho de administração, tem poder de veto sobre a superlotação e tem de usar esse poder para garantir que os princípios sejam mantidos. Acredito nesse modelo, de trabalho e estudo, sem superlotação. Tem de manter esse sistema e criar um novo a partir dessa experiência, com novos presídios, ir reduzindo a superlotação dos demais. Hoje, as facções dominam.
Dominam porque o celular corre solto nos presídios. Como acabar com isso?
Uma das exigências que não abri mão quando era prefeito é do bloqueador de celular. Não é por acaso que o primeiro presídio com bloqueador de celular é exatamente o de Canoas.
De que forma?
Estou propondo a RS Investimentos, uma empresa que já existe. Vamos adaptá-la e prepará-la para receber todas as áreas de terra e prédios em desuso. A ideia é converter em permuta ou venda, parcerias com o setor privado, e usar os dividendos na construção de presídios. Também criar um presídio com regime disciplinar diferenciado e um conselho de Estado.
Qual a prioridade na saúde?
Temos hoje em torno de 714 mil pessoas aguardando uma consulta, um exame, uma cirurgia. São números preocupantes. Proponho regionalização efetiva, com unicidade territorial. Na média complexidade, policlínicas, sem construir nada, mas usando o que já existe, com atendimento, consultas especializadas e alguns exames. Também estou propondo, e, claro, depende muito das finanças, tem de ser de forma progressiva, a volta do IHOSP (Incentivo de Cofinanciamento da Assistência Hospitalar). É preciso avançar na telemedicina e na celeridade de medicamentos. É preciso também um programa de atenção ao Idoso. Canoas é a cidade que mais UPAs tem e criei lá a primeira UPA Idoso do Brasil.
Estamos entre os piores do Brasil em matéria de aprendizagem. Como mudar?
Os dados de 2016 mostram que a proficiência de matemática no 9º ano do Ensino Fundamental nas escolas do Estado é 17% e, em português, 35%. É preciso uma pedagogia inovadora, criativa. Tem de ter tecnologia na sala de aula, lousas digitais, tablets, smartphones. Hoje, 13% das nossas escolas estaduais, segundo o censo de 2017, não têm biblioteca, 53% não têm laboratório de ciência, 31% não têm quadra de esporte, 87% não têm sala de leitura.
Como transformar isso?
Tem de investir progressivamente. Proponho o fundo de educação. Também precisamos tornar a carreira de professor atrativa, repensar formação e remuneração.
Desde dezembro de 2016, quando o senhor entregou o cargo em Canoas, está sem emprego. Como paga suas contas?
Sou jornalista. Tenho uma empresa que se chama Armazém de Ideias. Produzi programas na TV Urbana e na Bah TV. Não estou em cargo público nem dependo de ninguém. Não recebo do partido.
O senhor é investigado pela Polícia Federal pela apreensão de mais de R$ 500 mil em dinheiro vivo com pessoas ligadas ao senhor nas eleições de 2016 e está com os bens bloqueados pela Justiça. O que houve?
A questão dos recursos da campanha foi uma arrecadação paralela, pessoal. A própria pessoa assumiu. Há uma investigação da Justiça Eleitoral e não sou réu. Quanto ao bloqueio de bens, está relacionado ao processo do teleagendamento. Em 2010, Canoas recebeu um software para marcação de consultas especializadas gratuitamente, e contratamos a empresa. Como ia fazer a licitação de algo novo e inédito? Quatro ou cinco anos depois, teve licitação e a empresa vencedora nem foi a que estava à frente. Estou recorrendo.