A pandemia, iniciada em 2020 e que avançou por 2021, ceifou mais de 5,6 milhões de vida em todo o mundo, conforme o monitoramento da Universidade Johns Hopkins. Muitas dessas partidas foram de artistas, profissão que mostrou tamanha importância em meio às incertezas geradas pela covid-19 ao proporcionar alento por meio da música, da leitura, do cinema e de outras manifestações culturais.
Expoentes da cultura no Brasil e no mundo nos deixaram também de forma súbita, vítimas de acidentes, como Marília Mendonça, ou por doenças pré-existentes, como o baterista dos Rolling Stones Charlie Watts.
A seguir, homenageamos e recordamos com carinho algumas figuras importantes para as artes que partiram em 2021.
Nacionais
Telmo de Lima Freitas
Cantor e compositor emblemático da música gaúcha, Telmo de Lima Freitas morreu aos 88 anos, em 18 de fevereiro. Nascido em São Borja, foi autor de sucessos como Cantiga de Ronda e Baile de Rancho. Com o título Esquilador, ele venceu a Calhandra de Ouro, maior prêmio na 9ª Califórnia da Canção Nativa, em 1979. Também ganhou, em 2009, o prêmio de melhor compositor e melhor CD regional no Prêmio Açorianos com o trabalho A Mesma Fuça.
Agnaldo Timóteo
Agnaldo Timóteo foi uma das perdas por conta da pandemia. O cantor estava com 84 anos quando faleceu, em 3 de abril. Mineiro de Caratinga, Timóteo começou a trajetória musical cantando em circos no interior do seu Estado. Em 1960, partiu de mudança para o Rio de Janeiro e sua carreira na música popular brasileira começou a se consolidar com aparições em programas musicais da TV e do rádio.
Paulo Gustavo
Ator e comediante, Paulo Gustavo morreu em 4 de maio, aos 42 anos, vítima do coronavírus. Ele estava internado desde março. O humorista deixou os filhos gêmeos Romeu e Gael, um ano, e o marido Thales Bretas, pai, irmãos e a mãe Déa Lúcia, inspiração para Dona Hermínia, seu personagem mais famoso, que ganhou adaptação para o cinema em três filmes. Na televisão, atuou nos humorísticos Vai Que Cola e 220 Volts.
Eva Wilma
A atriz Eva Wilma morreu em 15 de maio, aos 87 anos, em decorrência de um câncer no ovário. Ao longo de seus 66 anos de carreira, a atriz se destacou por oscilar entre mocinhas e vilãs. Uma das personagens inesquecíveis de Eva é Altiva, a vilã de A Indomada (1997), que lhe rendeu vários prêmios. A Dra. Martha, do seriado Mulher (1998), e Íris, de Fina Estampa (2011) também são atuações memoráveis da artista, que marcou presença em novelas como Pedra sobre Pedra (1992), O Rei do Gado (1996) e Começar de Novo (2004).
MC Kevin
O funkeiro Kevin Nascimento Bueno, conhecido como MC Kevin morreu em 16 de maio, aos 23 anos, após cair de uma altura de aproximadamente 18 metros de um hotel na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Ele chegou a ser levado ao hospital municipal Miguel Couto, no Leblon, mas não resistiu. Grande sucesso no funk de São Paulo, MC Kevin foi inspiração para milhões de fãs que viam em seu repertório a representação da superação. Seu primeiro hit veio em 2014, Prepara Novinha, em parceria com MC Pedrinho. Já com MC Davi, ele criou o funk Pra Inveja é Tchau, que conseguiu mais de 200 milhões de visualizações.
Nelson Sargento
O compositor, cantor, pintor, ator e presidente de honra da Estação Primeira de Mangueira, Nelson Sargento também não resistiu à covid-19 e partiu aos 96 anos, em 27 de maio. Apesar da carreira musical consolidada, Sargento só lançou seu primeiro disco solo em 1979. Sonho de Um Sambista reunia Agoniza mas não morre, lançada no ano anterior por Beth Carvalho, Primavera, Falso Amor Sincero (outra música de muito sucesso) e outras nove canções. Além de compor mais de 400 canções, Sargento pintou quadros, escreveu livros de prosa e poesias e atuou como ator.
Paulo José
Um dos mais celebrados nomes da dramaturgia brasileira, Paulo José morreu em 11 de agosto, aos 84 anos, em decorrência de uma pneumonia. Um dos maiores artistas brasileiros, construiu uma trajetória de grande relevância no teatro, no cinema e na televisão. Durante toda a sua vida, o artista fez questão de manter contato com o Rio Grande do Sul. Tinha por hábito passar o Carnaval em Lavras do Sul.
Tarcísio Meira
Tarcísio Meira foi mais uma vítima da covid-19. Ele tinha 85 anos e morreu em 12 de agosto. A esposa Glória Menezes também foi acometida pelo vírus e estava internada quando o companheiro faleceu, mas ela conseguiu se recuperar. Tarcísio estreou no teatro em 1957, e seguiu a carreira pela televisão e cinema. Em 1985, na minissérie O Tempo e o Vento, o ator interpretou um dos mais famosos personagens da cultura gaúcha: Capitão Rodrigo Cambará.
O ator morreu em 3 de setembro, aos 82 anos. Sérgio Mamberti estava entubado, com infecção pulmonar, e faleceu em decorrência de falência múltipla de órgãos. O pontapé inicial da carreira foi no teatro, em 1962, com a peça Antígone América, escrita por Carlos Henrique Escobar, produzida por Ruth Escobar e dirigida por Antônio Abujamra. Na TV, destacou-se ao interpretar o mordomo Eugênio em Vale Tudo, na Globo, e doutor Vitor no clássico Castelo Rá-Tim-Bum, da TV Cultura.
Airton Machado
Vocalista e fundador do grupo Garotos de Ouro, Airton Machado morreu em um acidente com o ônibus da banda em 13 de setembro, aos 62 anos. Junto com o irmão Ivonir, fundou o grupo que revolucionou a música gaúcha. O primeiro grande sucesso veio com o terceiro LP, Quando o Estouro é um Estouro, de 1986, emplacando sucessos como Barraca Armada, Poupança da Gordinha e Peão Farrapo.
Luis Gustavo
Morto em 19 de setembro, em decorrência de um câncer de intestino, Luis Gustavo estava com 87 anos. Nascido na Suécia em 1934, começou sua carreira de ator nos anos 1950. Viveu personagens marcantes, como o costureiro Ariclenes Almeida/Victor Valentin na primeira versão de Ti-Ti-Ti, o playboy Ricardo em Anjo Mau, o radialista corrupto Juca Pirama em O Salvador da Pátria e, mais recentemente, Vavá, de Sai de Baixo. Seu papel mais memorável foi o atrapalhado detetive particular Mário Fofoca, de Elas por Elas.
Gilberto Braga
O autor de novelas tinha 75 anos, e morreu em 26 de outubro. Gilberto Braga sofria de mal de Alzheimer e enfrentava uma infecção sistêmica após ter tido uma perfuração de esôfago. Entre as novelas mais marcantes de Braga estão Vale Tudo, Dono do Mundo, Dancing Days, Corpo a Corpo, Anos Dourados e Celebridade. Uma das características marcantes da teledramaturgia de Gilberto Braga foi a predileção por adaptações de obras clássicas. Entre suas principais obras nesse filão estão as adaptações dos romances Helena, de Machado de Assis, e Senhora, de José de Alencar, bem como Escrava Isaura, sucesso de 1976 inspirada no livro de Bernardo Guimarães.
Marília Mendonça
A cantora de música sertaneja morreu com apenas 26 anos, após queda de um avião no interior de Minas Gerais, em 5 de novembro. Com quatro álbuns lançados — Marília Mendonça: Ao Vivo (2016), Realidade (2017), Todos os Cantos (2019) e Nosso Amor Envelheceu (2021) —, Marília Mendonça somou mais de 20 prêmios por seus trabalhos, entre os quais estão três Troféus Imprensa e quatro Prêmios Multishow de Música Brasileira.
Internacionais
Phil Spector
Famoso produtor musical americano morreu em 16 de janeiro, aos 81 anos, enquanto cumpria pena por homicídio. Phil Spector foi diagnosticado com coronavírus quatro semanas antes e transferido de sua cela na cadeia para um hospital. Preso pelo assassinato da atriz Lana Clarkson, o polêmico produtor introduziu métodos inovadores como a "parede de som", trabalhou com diversas estrelas da música, como os Beatles em seu álbum Let it Be, e com os Ramones no disco End of the Century. Em seu auge na década de 1960, tornou-se um dos produtores de pop e rock de seu tempo, cujo trabalho ajudou a definir o otimismo sem limites de uma geração.
Larry King
O apresentador americano Larry King morreu aos 87 anos, em 23 de janeiro. Conhecido pelo programa de entrevistas Larry King Live, do qual esteve à frente por 25 anos, ele foi internado no final de dezembro de 2020 para tratar a covid-19, segundo a imprensa norte-americana. O anúncio, porém, não especificou a causa da morte. Um dos apresentadores mais emblemáticos da televisão americana, King era conhecido pelas entrevistas com políticos e celebridades.
Lawrence Ferlinghetti
Apontado como o último da geração beat, Lawrence Ferlinghetti morreu e 22 de fevereiro aos 101 anos, por causa de uma doença pulmonar. Ferlinghetti passou a ter destaque nos anos 1950, quando publicou o poema-manifesto Uivo, de Allen Ginsenberg. O lançamento acabou por atrair a atenção para toda a geração beat de poetas, artistas que questionavam o conservadorismo da época por meio da literatura. O episódio também trouxe ao poeta a imagem de um defensor heroico da liberdade de expressão. Ao longo de sua trajetória, ele escreveu dezenas de livros. Entre eles, A Coney Island of the Mind (1958), um dos volumes de poesia mais vendidos na história americana. A obra é carregada de crítica e ironia em relação à cultura dos Estados Unidos.
DMX
O rapper DMX morreu em 9 de abril, aos 50 anos, após ficar internado em razão de uma parada cardíaca. DMX era considerado um dos maiores nomes do hip-hop nova-iorquino, tendo se destacado no final dos anos 1990 e início dos anos 2000. Indicado a três prêmios Grammy ao longo de sua carreira, o músico fez sucesso com canções como Give It To Ya e Party Up.
Dusty Hill
Um dos fundadores da banda ZZ Top, Dusty Hill morreu em 28 de julho, aos 72 anos. A causa não foi revelada. O ZZ Top foi fundado em 1969 e ficou conhecido como uma das primeiras bandas a misturar hard rock com country e blues. Entre suas canções mais famosas estão La Grange, Sharp Dressed Man e Gimme All Your Lovin. O trio veio ao Brasil uma única vez, em 2010, tendo se apresentado em Porto Alegre, no Pepsi On Stage, em 23 de maio.
Charlie Watts
Baterista dos Rolling Stones, uma das maiores bandas de rock do mundo e ainda em atividade, Charlie Watts morreu aos 80 anos em 24 de agosto. A causa não foi revelada. Em 2004, Watts havia enfrentado um câncer. O músico juntou-se aos Rolling Stones em 1963. Tocava bateria desde a adolescência, quando era praticante do skiffle, gênero inglês inspirado nas jazz bands norte-americanas dos anos 1920. Apesar de integrar uma das principais bandas da história, o músico era grande fã de jazz, R&B e blues. Ao longo das décadas, sempre teve o costume de se apresentar com outros músicos nos períodos em que não estava em turnê com os Rolling Stones, além de frequentar o Ronnie Scott's, um dos principais clubes de jazz do Reino Unido.
Lee "Scratch" Perry
Considerado um dos pais do gênero dub e figura histórica da música reggae jamaicana, Lee 'Scratch' Perry morreu aos 85 anos, em 29 de agosto. Trabalhou com nomes importantes ao longo das décadas, como Bob Marley, Peter Tosh, Bunny Wailer, The Congos, Max Romeo, Prince Buster, Robbie Shakespeare e Sly Dunbar, além de sua banda, The Upsetters. Nos anos 1960 e 1970, produziu obras de inúmeros músicos de reggae no Black Ark, seu estúdio em Kingston. Lá, fazia remixes adicionando efeitos como ecos, recortes e distorções em materiais já produzidos, misturando diferentes artistas.
Anne Rice
A escritora norte-americana Anne Rice, conhecida por seus livros de terror e fantasia, em especial seu best-seller Entrevista com o Vampiro, morreu em 12 de dezembro, aos 80 anos, por complicações geradas por um derrame. Com duas formações, ciência política e escrita criativa pela Universidade de São Francisco, a escritora começou a escrever em 1972 após a perda da filha Michele, cinco anos, que morreu de leucemia. A romancista é autora de mais de 30 romances góticos.
bell hooks
Nascida Gloria Jean Watkins, bell hooks tinha 69 e faleceu em 15 de dezembro. A causa da morte não foi especificada. A escritora era referência em temas ligados à luta feminina e à comunidade negra. A também ensaísta e professora lançou cerca de 40 livros. Em sua obra, abordava feminismo, racismo, cultura, política, papéis de gênero, amor e espiritualidade. As traduções para o português de trabalhos como Olhares Negros: Raça e Representação, Ensinando a Transgredir: A Educação como Prática da Liberdade e O Feminismo é para Todo Mundo reforçaram o potencial das ideias de bell no Brasil.
Produção de Homero Pivotto Jr.