O feminismo negro perdeu nesta quarta-feira (15) uma de suas grandes forças na literatura: bell hooks. A escritora estadunidense, cujo nome oficial era Gloria Jean Watkins, tinha 69 anos e, conforme anunciado pela sobrinha dela Ebony e por um comunicado da família divulgado nas redes sociais, ela faleceu em casa.
"A autora, professora, crítica e feminista fez sua transição cedo nesta manhã, em casa, cercada pela família e amigos", escreveu Ebony.
A faculdade onde ela lecionava, Berea College, também prestou homenagem à educadora em seu site e nas redes sociais da instituição. "A Faculdade Berea está profundamente entristecida com a morte de bell boooks. (...) Autora prodigiosa, intelectual pública e uma das principais estudiosas feministas do país", diz o texto.
Responsável por traduzir para o português obras de bell hooks, o escritor, artista e tradutor Vinícius da Silva estuda a ativista desde 2018, com ênfase em ética do amor, crítica cultural e masculinidades, além de ter várias publicações sobre ela.
— Desde que comecei a estudar seu pensamento, aprendi com hooks o poder da consciência crítica, do feminismo enquanto projeto de justiça social e da compreensão dos sistemas de dominação para que, por meio da mutualidade revolucionária, como costuma dizer, possamos transformar coletivamente a sociedade. Com hooks, aprendi o poder do amor, de viver o luto e de escrever nosso próprio presente, a partir das nossas próprias visões de mundo — avalia.
Vinícius também comentou o legado da autora:
— bell hooks construiu um legado imenso em torno da pedagogia crítica, do amor, da teoria feminista, da crítica cultural e de arte e de diversos outros temas que atravessam seu pensamento, de forma fractal. O convite que a obra de hooks nos faz é um convite para pensar. hooks busca interlocutores, difusores dos temas por ela trabalhados e agentes da transformação social. Por meio da sala de aula, o legado de hooks permitiu com que vislumbrássemos um mundo onde a diferença cultural não organizaria sistemas de dominação. E mesmo diante das adversidades, nunca abriu mão do amor como categoria ética e política.
bell hooks assinava com letras minúsculas pois acreditava que seu trabalho deveria ser mais importante do que seu nome. Sua primeira publicação sob a alcunha em homenagem à bisavó (Bell Blair Hooks), foi o livro de poemas And There We Wept, em 1978. No decorrer de sua trajetória, escreveu 40 obras, lançadas em 15 idiomas. Os principais temas de seus escritos foram feminismo, racismo, cultura, política, papéis de gênero, amor e espiritualidade.
As traduções para o português de trabalhos como Olhares Negros: Raça e Representação, Ensinando a Transgredir: A Educação como Prática da Liberdade e O Feminismo é para Todo Mundo reforçaram o potencial das ideias de bell no Brasil.
Ela é considerada uma das vozes mais contundentes sobre a luta das mulheres e figura entre as teóricas mais representativas de sua geração. Seus textos conseguiam transitar com propriedade desde a análise de um videoclipe até a representação da comunidade negra dos Estados Unidos no cinema. Em 2014, a autora fundou o bell hooks Institute com o objetivo de registrar suas ações como feminista e intelectual negra.
bell passou por escolas segregadas no Condado de Christian, no Estado do Kentucky. Em seguida, estudou na Universidade de Stanford, na Califórnia, e fez mestrado em inglês na Universidade de Wisconsin. Obteve, ainda, doutorado em literatura na Universidade da Califórnia, em Santa Cruz.