Lançado em setembro na Netflix e estrelado por Carrie Coon, Natasha Lyonne e Elizabeth Olsen, As Três Filhas (His Three Daughters, 2023) é um filme lindo que vai dar dor de cabeça nos votantes do Oscar — e talvez tenha criado um problema para si mesmo.
Trata-se do sétimo longa-metragem dirigido pelo nova-iorquino Azazel Jacobs, 52 anos completados na última sexta-feira (27), também autor do roteiro e realizador de Saída à Francesa (2020). Teve sua primeira exibição no Festival de Toronto de 2023, mas a estreia comercial foi no mês passado, por isso que está apto a competir na premiação de 2025 da Academia de Hollywood. E não faltam predicados neste drama com toques cômicos embalado pela música composta e executada pelo brasileiro Rodrigo Amarante, ex-Los Hermanos (que canta em inglês nos créditos finais, com a bela In Time).
A trama se passa quase toda dentro de um apartamento em Nova York. Lá, três irmãs distantes e com personalidades contrastantes reúnem-se para cuidar do pai, Vincent, que está perdendo a batalha para o câncer.
Internado em casa para cuidados paliativos, o pai já é uma figura fantasmagórica: nunca o vemos nem ouvimos, e a câmera jamais entra no quarto do moribundo. Uma das filhas também não consegue cruzar a porta: justamente Rachel, a futura dona do apartamento, que cuidou de Vincent durante muito tempo, mas agora sofre diante de sua morte iminente. Um alívio para ela é fumar maconha, o que gera reprimenda da irmã mais velha, a autoritária e ríspida Katie, que também cobra Rachel por não ter feito o pai assinar uma ordem de não reanimar enquanto ele ainda estava lúcido.
A terceira irmã, Christina, é a mais emotiva e a mais solar, procurando servir como uma ponte entre Rachel e Katie — a propósito, repare que as três personagens raramente são vistas juntas na mesma imagem, uma tradução visual de sua desunião e de suas desavenças. À medida que o filme avança, vamos enxergando melhor os pontos de fissura e aprendendo sobre o passado da família. Ao mesmo passo, As Três Filhas vai ampliando os pontos de identificação, de espelhamento das vidas dos espectadores, sobretudo aqueles que já precisaram lidar com a despedida de um pai ou uma mãe e todas as implicações afetivas, psicológicas e burocráticas que isso envolve. Vale o alerta: o epílogo epifânico pode fazer chorar copiosamente.
Ora duros, ora ternos, os ótimos diálogos escritos por Azazel Jacobs são adornados pelas interpretações nuançadas de suas três atrizes. Rachel é encarnada por Natasha Lyonne, 45 anos, que concorreu ao Emmy pelas séries Orange Is the New Black, Boneca Russa e Poker Face. Katie é o papel de Carrie Coon, 43, que disputou o Emmy por Fargo e A Idade Dourada e brilhou no filme O Refúgio (2020). Christina é vivida por Elizabeth Olsen, 35 anos, que competiu no Emmy por uma minissérie da Marvel, WandaVision. As três fazem por merecer suas primeiras indicações ao Oscar.
E as três, coerentemente, embora Lyonne tenha mais tempo de tela, decidiram fazer campanha para a mesma categoria, a de melhor atriz coadjuvante. Assim, elas se arriscam a enfrentar a divisão de votos, que pode ser um obstáculo não apenas para uma eventual premiação, mas antes ainda, na escolha das cinco indicadas. Foi o que aconteceu, por exemplo, quando Corey Hawkins, O'Shea Jackson Jr. e Jason Mitchell tentaram vaga no Oscar de ator coadjuvante por Straight Outta Compton: A História do N.W.A. (2015): nenhum entrou na lista.
Mas a história mostra que não é tão raro os eleitores da Academia de Hollywood indicarem candidatos do mesmo filme ao mesmo prêmio. Isso chega a ser frequente no Oscar de canção original e nas categorias de coadjuvante. Entre os atores, ocorreu 22 vezes, as últimas delas com Al Pacino e Joe Pesci, de O Irlandês (2019), derrotados por Brad Pitt (Era uma Vez... em Hollywood); Daniel Kaluuya (laureado) e Lakeith Stanfield, de Judas e o Messias Negro (2021); Jesse Plemons e Kodi Smit-McPhee, de Ataque dos Cães (2021), batidos por Troy Kotsur (No Ritmo do Coração); e Brendan Gleeson e Barry Keoghan, de Os Banshees de Inisherin (2022), superados por Ke Huy Quan (Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo). Em três ocasiões, houve tripla indicação: Lee J. Cobb, Karl Malden e Rod Steiger, por Sindicato dos Ladrões (1954), que viram o troféu ir para Edmond O'Brien (A Condessa Descalça); James Caan, Robert Duvall e Al Pacino, por O Poderoso Chefão (1972), que perderam para Joel Grey (Cabaret); e Robert De Niro (premiado), Michael V. Gazzo e Lee Strasberg, por O Poderoso Chefão: Parte II (1974).
Na categoria de atriz coadjuvante, já foram 35 vezes! Nas mais recentes, Emma Stone e Rachel Weisz, de A Favorita (2018), foram derrotadas por Regina King (Se a Rua Beale Falasse), e Jamie Lee Curtis levou a melhor sobre sua colega de elenco em Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo (2022), Stephanie Hsu. A tripla indicação só houve para Diane Cilento, Edith Evans e Joyce Redman, por As Aventuras de Tom Jones (1963), que perderam para Margaret Rutherford (Gente Muito Importante).
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