O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro decidiu nesta terça-feira (4) manter a decisão que quebrou os sigilos bancário e fiscal do senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ). A decisão foi por dois votos a um, derrotando o desembargador Antônio Carlos Amado, que havia votado na semana passada em favor do senador.
As desembargadoras Mônica Tolledo de Oliveira e Suimei Cavalieri pediram vista do processo. Nesta terça, as duas votaram contra o relator e mantiveram a decisão de abril do juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal.
Os integrantes da 3ª Câmara Criminal do TJ-RJ analisam um habeas corpus no qual os advogados de Flávio apontam ilegalidades na decisão do magistrado de primeira instância, como falta de fundamentação.
A justificativa do juiz Itabaiana para a quebra de sigilo toma um parágrafo do documento, enquanto adota as razões expostas pelo Ministério Público em 87 páginas. Ao quebrar o sigilo de outras oito pessoas, em junho, Itabaiana refez a decisão, fundamentando as razões para autorizar a medida.
No último dia 28, o desembargador Amado negou o habeas corpus pelas razões apresentadas pela defesa, mas apontou outros motivos pelos quais a decisão de primeira instância deveria ser anulada. O magistrado considerou que o senador não teve a oportunidade de se manifestar antes de ter o sigilo quebrado. Ele salientou o fato de o filho do presidente ter peticionado no procedimento um pedido para falar.
Disse ainda que o Ministério Público do Rio afirmou, em seu pedido de quebra de sigilo, que Flávio havia se recusado a falar, o que, para ele, não condiz com a verdade. "O magistrado (Itabaiana) pode ter sido induzido a erro", disse.
Uma petição da defesa do senador, contudo, foi usada pelo Ministério Público para rebater a tese do desembargador. Nela, uma advogada do parlamentar pede para que ele seja ouvido ao final da fase de investigação, quando encerrada a coleta de provas. A representação é do dia 19 de março, antes da quebra ocorrer.
A sessão do julgamento desta terça foi fechada.
Entenda o caso
Flávio é investigado desde janeiro de 2018 sob a suspeita da prática de "rachadinha", que consiste no recolhimento de parte do salário de seus funcionários, na Assembleia Legislativa do Rio de 2007 a 2018, quando o filho do presidente era deputado estadual. A apuração começou após relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) — órgão ligado ao Banco Central — indicar movimentação financeira atípica do ex-assessor do parlamentar, Fabrício Queiroz, no valor de R$ 1,2 milhão de janeiro de 2016 a janeiro de 2017.
Além do volume movimentado, de R$ 1,2 milhão em um ano, chamou a atenção a forma com que as operações se davam: depósitos e saques em dinheiro vivo em datas próximas do pagamento de servidores da Assembleia. Queiroz afirmou que recebia parte dos valores dos salários dos colegas de gabinete. Ele diz que usava esse dinheiro para remunerar assessores informais de Flávio, sem conhecimento do então deputado estadual. A sua defesa, contudo, nunca apontou os beneficiários finais dos valores.
A Promotoria apura suspeitas de peculato, ocultação de bens, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Conforme a Folha de S.Paulo mostrou nesta segunda-feira (3), a Polícia Federal descartou suspeitas do Ministério Público fluminense e concluiu não haver indícios de que Flávio tenha cometido os crimes de lavagem de dinheiro e de falsidade ideológica.
Em julho de 2019, após pedido de Flávio, as apurações do caso foram de novo suspensas por liminar do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli. Depois de decisão do plenário da corte, em dezembro, as investigações foram retomadas.
Em dezembro, o juiz Itabaiana autorizou o cumprimento de mandados de busca e apreensão em 24 locais, incluindo a franquia de loja de chocolates em que o senador é um dos sócios. A Promotoria suspeita que a empresa é usada para lavar dinheiro obtido na "rachadinha". Outro meio de lavagem, avaliam promotores, é a compra de venda de imóveis.
O senador nega desde o fim de 2018 que tenha praticado "rachadinha" em seu gabinete e afirma que não é responsável pela movimentação financeira de seu ex-assessor.