Os últimos meses têm sido tensos ao sul da linha do Equador. Ruas ocupadas, confrontos políticos e mortes em protestos atingem sete países na América Latina – Argentina, Bolívia, Chile, Equador, Paraguai, Peru e Venezuela.
Bolívia e Chile foram os países em destaque nesta semana. Para os bolivianos, as manifestações estão relacionadas à suspeita de fraude na disputa que elegeu Evo Morales pela quarta vez. Já entre os chilenos, o aumento da tarifa de metrô despertou protestos que ultrapassaram para outras pautas, como o encarecimento do custo de vida e o empobrecimento das aposentadorias.
Saiba, abaixo, quais são as crises, os seus motivos e impactos.
Argentina
Os argentinos vão às urnas no próximo domingo (27) para escolher o novo presidente. No pano de fundo das eleições, está o cenário econômico em crise. Nos últimos 12 meses, a inflação acumulada foi de 55%, a população perdeu o poder de compra e 2,7 milhões de pessoas entraram na linha da pobreza.
Em setembro, movimentos sociais saíram às ruas de Buenos Aires para pressionar o presidente Mauricio Macri a declarar emergência alimentar para combater a pobreza. O Congresso, por sua vez, aprovou um projeto de lei para aumentar os recursos destinados a programas sociais.
Em agosto, Macri declarou moratória e pediu ao Fundo Monetário Internacional (FMI) prazos mais largos para pagar a dívida bilionária do país. Semanas antes, o presidente havia sido derrotado nas primárias pelo opositor Alberto Fernández, que tem Cristina Kirchner como vice.
Bolívia
Depois de uma controversa contagem de votos, a vitória de Evo Morales no primeiro turno das eleições presidenciais gerou uma onda de protestos no país. Inicialmente, a apuração apontava que haveria segundo turno, mas, depois, passou a indicar mais uma reeleição de Morales, a quarta seguida.
Diante da suspeita de fraude, teve início uma greve geral, na última quarta-feira (23). Protestos, incêndios, confrontos com a polícia e saques aconteceram em diversas cidades, como Sucre, Cochabamba e La Paz. Manifestantes queimaram quatro escritórios regionais do Tribunal Supremo Eleitoral.
A Organização dos Estados Americanos (OEA) expressou "preocupação" e "surpresa" com o resultado eleitoral. Morales decretou estado de emergência e disse que "está em marcha uma tentativa de golpe de Estado" contra ele. Porém, não apresentou evidências.
Chile
A onda de protestos no Chile começou com atos contra o aumento das tarifas de metrô, mas evoluiu para um movimento mais amplo. A população demonstra insatisfação com a condição de vida no país, que incluem problemas nas áreas de saúde e educação, a defasagem nos valores da aposentadoria e o agravamento da desigualdade social.
Pelo menos 18 pessoas morreram em decorrência dos atos. O governo decretou estado de emergência, e os militares foram às ruas pela primeira vez desde o fim da ditadura de Augusto Pinochet, em 1990, e declarou toque de recolher.
Lideradas por estudantes, as manifestações continuaram mesmo depois de o presidente Sebástian Piñera ter revertido a alta no valor da passagem e anunciado uma série de medidas para conter o caos. Entre elas, o reajuste nas pensões e nos benefícios sociais e a revogação do aumento nas tarifas elétricas. Mas a oposição e alguns aliados de Piñera avaliam que ele reagiu tarde à crise.
Equador
Neste mês, o país enfrentou protestos violentos após o presidente Lenín Moreno anunciar o fim de um subsídio aos combustíveis para cumprir parte de um pacote de metas com o FMI. O fim do benefício, que existia há 40 anos, provocou aumento de até 123% nos preços.
Em resposta, o governo decretou "estado de exceção" e mudou temporariamente a sede do governo da capital Quito para Guayaquil. A crise, que é considerada a maior no país nos últimos anos, deixou sete mortos, mais de 1,3 mil feridos e 1,1 mil presos, além de causar desabastecimento em algumas regiões por conta dos bloqueios de estradas.
No dia 14 de outubro, Moreno anunciou a revogação da medida que cortava o subsídio. Nesta quarta-feira (23), o movimento indígena, que vinha negociando com o governo, anunciou a suspensão do diálogo com o presidente devido à "perseguição" aos seus dirigentes.
Paraguai
O presidente Mario Abdo Benítez escapou de um processo de impeachment apresentado pela oposição por causa de um acordo firmado em maio com o Brasil sobre a energia produzida na Usina de Itaipu. Os adversários acusavam Benítez de trair os interesses nacionais.
No documento, o Paraguai se comprometeu a comprar energia mais cara do que o usual. Desde que o acordo foi tornado público pela imprensa paraguaia, o país eclodiu em uma crise política, com manifestações espalhadas pelo país e queda de funcionários públicos.
O acordo foi cancelado, e o clima acalmou. Sem apoio político suficiente para derrubar Benítez, o movimento pelo impeachment arrefeceu. Em 2017, manifestantes haviam queimado o Congresso em protesto contra os políticos do país.
Peru
Depois de sofrer uma derrota no Congresso, no fim de setembro, o presidente Martín Vizcarra dissolveu a legislatura e convocou novas eleições. Apesar de ser liberada pela Constituição, a medida é pouco comum e levantou temores de golpe.
Os congressistas chegaram a votar pela suspensão de Vizcarra e nomearam a vice, Mercedes Aráoz, para o cargo. Porém, ela renunciou e o presidente seguiu no comando do país.
A crise peruana tem origem no escândalo ligado à Odebrecht, que colocou em xeque a classe política do país.
Venezuela
Há anos, os venezuelanos enfrentam uma recessão econômica acompanhada de aumento da inflação. Apoiado pelos militares, o presidente Nicolás Maduro impôs uma dura repressão policial sobre os movimentos que questionam a sua legitimidade. Em Caracas, houve confrontos violentos com morte.
Diante da pobreza e da escassez de produtos básicos, a crise tem provocado uma saída em massa de venezuelanos do país. A Organização das Nações Unidas (ONU) já abriu uma investigação para apurar violações de direitos humanos por parte do governo local desde 2014.
Em janeiro, o líder da oposição, Juan Guaidó, se autoproclamou presidente em janeiro e foi apoiado pela comunidade internacional, entre eles, Estados Unidos e União Europeia. Meses depois, Guaidó tentou deflagrar um levante para derrubar Maduro. Ele foi seguido por alguns militares, mas a maioria permaneceu fiel ao regime chavista.