A inusitada situação de duas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) paralelas investigarem o mesmo assunto na Câmara de Vereadores de Porto Alegre voltou ao debate na manhã desta segunda-feira (7), quando foram instaladas. A procuradoria jurídica da Casa deu parecer favorável à criação das duas CPIs para apurar supostas irregularidades em compras pela Secretaria Municipal da Educação (Smed), e o presidente da Câmara, Hamilton Sossmeier (PTB), concordou.
O entendimento da procuradoria foi no sentido de que os dois requerimentos — protocolados em 5 de junho — preencheram os requisitos constitucionais para terem andamento. Desta forma, ao final das apurações, dois relatórios de conclusão serão produzidos. Dependendo do que apontarem ou recomendarem, serão remetidos a outros órgãos — como Ministério Público e Tribunal de Contas do Estado — para eventuais apurações que sejam necessárias. O prazo de duração das comissões é de 120 dias, prorrogável por mais 60 dias.
Primeiro a protocolar o pedido de uma comissão, o vereador Idenir Cecchim (MDB), aliado do prefeito Sebastião Melo, voltou a dizer na manhã desta segunda-feira (7) que não concorda com as duas apurações, mas que decidiu não contestar.
— Quisemos mesmo que as duas funcionassem. Não contestamos. O governo não precisa esconder nada — afirmou Cecchim.
O vereador, que preside uma das comissões, defende que os problemas que ocorreram na Smed eram de logística e que o governo municipal já resolveu 80% do que foi apontado em reportagens do Grupo de Investigação da RBS:
— O que o GDI apontou, 80% foi solucionado. A CPI chegou tarde.
Questionado então sobre qual objetivo da comissão, Cecchim falou de responsabilidades.
— Se houver responsáveis, que sejam indicados. Vamos buscar responsáveis — atestou o parlamentar.
O aliado de Melo também chegou a dizer que a CPI dele é para esclarecer e que a comissão proposta por Mari Pimentel (Novo) é para "provocar". As falas de Cecchim sobre a correção de problemas na Smed tomaram como base um balanço parcial que a prefeitura publicou na tarde da sexta-feira (4) e que tratava de medidas adotadas até o momento.
Mari reagiu:
— Queremos esclarecer os fatos. O governo diz que é problema de logística. O governo se autofiscalizou e já trouxe suas próprias conclusões neste relatório. Porto Alegre vai ganhar com a nossa CPI.
A vereadora destacou que não haveria necessidade de duas apurações.
— A CPI é um instrumento de investigação convocado pelas minorias, uma vez que a prefeitura e a base do governo têm as ferramentas para se autoinvestigar. Uma destas CPIs está sendo para controlar a narrativa. A outra sim, que está sendo instaurada pelos órgãos independentes, tem a mim como presidente independente, tem a oposição na relatoria e o governo na vice-presidência. Temos as três partes contempladas na minha CPI e também a proporcionalidade dos partidos da Casa. Uma só CPI daria conta de manter a imparcialidade da investigação — sustentou Mari.
A comissão presidida por Mari terá sessões nas manhãs de segunda-feira. A conduzida por Cecchim funcionará nas manhãs de quinta-feira.
O que foi revelado pelo GDI
- Em 6 de junho de 2023, o Grupo de Investigação da RBS (GDI) começou a publicação de reportagens mostrando que milhares de livros comprados pela Smed estavam acumulados em caixas em escolas e em depósitos da prefeitura, sob condições precárias de acondicionamento, sem uso pelos estudantes da rede municipal
- A partir das reportagens, o prefeito Sebastião Melo admitiu erros na distribuição do material comprado e determinou abertura de auditoria especial na Smed para apurar eventuais irregularidades
- Também ocorreu a troca do comando da pasta, com a saída da então secretária, Sônia da Rosa, e do então secretário-adjunto, Mário de Lima
- O GDI também revelou que parte das compras foi feita com adesão a ata de registro de preço, sem observação de etapas de estudos preliminares, com a contratação de empresas ligadas ao empresário Jailson Ferreira da Silva