Convidamos profissionais de diferentes áreas da gastronomia do Brasil para compartilhar o que será tendência e o que vai movimentar o mercado neste novo ano
DIEGO FABRIS
Sócio e diretor de conteúdo do Destemperados
UM RESTAURANTE
Depois do sucesso dos burgers, a galera do 20barra9 vai lançar um novo conceito de steakhouse, no primeiro semestre de 2018, que tende a ser mais uma sensação na cidade.
UM CHEF
Acredito que vem aí uma nova geração de chefs com uma cabeça mais aberta e que acredita em colaboração. Dentre eles, destaco a Natália Tussi, jovem chef do recéminaugurado Roister, em Porto Alegre. A criatividade, consistência e apresentação dos menus dela são impecáveis.
UM PRATO
O consumidor cansou do menu degustação longo e com porções pequenas. Vejo um comportamento em que os pratos de comfort food para compartilhar vão ganhar espaço. Versões de qualidade de pratos como strogonoff, baião de dois e feijoada devem aparecer por aí.
UM INGREDIENTE
A carne. Depois da crise de credibilidade que passou nos últimos anos, vejo um crescimento da carne de qualidade e com procedência. O consumidor aprendeu a buscar outros tipos de cortes além dos básicos e isso faz a cadeia se desenvolver.
UMA BEBIDA
O espumante brasileiro é a bola da vez. O produto ganhou destaque no cenário internacional e diminuiu o preconceito do consumidor local. A boa safra do último ano vai trazer excelentes rótulos para serem consumidos com menos frescura.
UM TIPO DE CULINÁRIA
O Brasil entendeu que a culinária regional tem que ser valorizada. Acredito no crescimento de todas as culinárias brasileiras. A variedade cultural do país vai ser cada vez mais retratada com produtos frescos e locais.
UM PAÍS
A Rússia. Com a Copa do Mundo de futebol que será realizada no país, a Rússia vai ganhar destaque na mídia e nas redes sociais em todo o mundo. Vamos descobrir que a gastronomia deles vai muito além da vodca.
UMA TECNOLOGIA
O big data chegou na comida. O cruzamento de informações dos consumidores de diferentes bases vai permitir um uso dos dados para criar produtos e chegar ao consumidor de forma mais assertiva.
UM HÁBITO DO CONSUMIDOR
O consumidor vai ficar mais exigente. Com o excesso de ofertas diferentes no mercado e com a enxurrada de conteúdo que recebe de qualquer lugar do mundo na internet, vejo um público que vai exigir um aumento no padrão.
UM PRODUTOR
Acredito no crescimento de vinícolas de pequeno e médio porte que se destacam por produtos e conceitos originais. Destaco a Vinícola Hermann, que surpreende com seu Matiz Alvarinho e o espumante Lírica Crua, que não passa pelo processo de dégorgement.
RAFAEL TONON
Jornalista e editor do blog What the Fork
UM RESTAURANTE
Os que buscam nos lembrar que comida tem que ser divertida e democrática. Que vão contra a ideia da gourmetização que tomou a gastronomia nos últimos anos. Destacaria, nesse caso, o Hot Pork, do chef Jefferson Rueda, de levar cachorroquente de extrema qualidade ao Centro de São Paulo a preços acessíveis.
UM CHEF
Tem uma nova leva de jovens chefs vindo aí que querem transformar a gastronomia de uma forma que me alegra. São questionadores, muito mais preparados em termos de administração de seus objetivos e com uma consciência de gastronomia muito diferente da das gerações anteriores. O Cesar Costa, do Corrutela, que abre as portas em São Paulo no começo do ano, é um deles.
UM PRATO
Acho que a comida popular, cotidiana, vista como “menor” tende a ganhar nova roupagem na mão de chefs criativos. O sorvete de casquinha, o cachorro-quente, o frango frito, o fast food. Me parece um momento incrível para a gastronomia, de ter chefs querendo buscar o inclusivo ao invés do exclusivo.
UM INGREDIENTE
O artesanal. Parece repetitivo dizer assim, mas cada vez mais os chefs tendem a criar tudo o que podem em suas cozinhas, dominando o processo total de suas criações. Da farinha (moída na casa) ao pão, da charcutaria aos próprios refrigerantes. A era do 100% homemade.
UMA BEBIDA
As naturais. A exemplo do que aconteceu com o vinho, e antes com a cerveja artesanal. Gosto do empenho do mercado em se desvencilhar da indústria, dos aromatizantes e dos conservantes.
UM TIPO DE CULINÁRIA
A cozinha étnica, hiperlocal de uma maneira geral. A graça do exclusivo não está mais no ingrediente caro, mas naquele que tem um sentido no seu contexto.
UM PAÍS
Acho que tem muita atenção voltada a países ainda pouco difundidos na Ásia, no Leste Europeu, como a própria Rússia. Mas vou apostar no Brasil, porque faço parte de uma iniciativa recente de clarear a imagem da gastronomia nacional.
UMA TECNOLOGIA
A tecnologia em si, como um dos ingredientes que vai transformar a gastronomia. Com a ajuda da ciência, da inteligência artificial, vamos comer de forma diferente (e melhor).
UM HÁBITO DO CONSUMIDOR
O da consciência. Questionar o que compra, perguntar sobre o que come, deixar a passividade com relação à sua alimentação. Querer saber da procedência a técnicas, do uso de ingredientes e aditivos ao papel mais participativo na cadeia.
UM PRODUTOR
O próprio produtor. Com mais gente deixando a cidade e se voltando ao campo, teremos produtos melhores e um protagonismo inédito do papel do produtor no mercado de gastronomia. Já era hora do chef celebridade dividir o holofote, né?
RODRIGO BELLORA
Chef do restaurante Valle Rústico, em Garibaldi, na Serra
UM RESTAURANTE
O Komah, uma incrível surpresa em São Paulo, que reúne aquilo que acredito ser fundamental em todos os restaurantes de verdade: amor, família, filosofia de trabalho, conhecimento e inovação. A mãe do chef Shin, que normalmente está no restaurante, cultiva sabores essenciais para manter o gostinho da Coreia em cada receita.
UM CHEF
O chef gaúcho responsável com seu papel na sociedade – e não somente preocupado em cozinhar, mas que pretende resgatar e eternizar antigos saberes e sabores à mesa. É de invejar a nova geração de chefs da região Sul, pela união, pelo compartilhamento, pela força e pela dedicação. Juntos, formam um grupo determinado que vai longe!
UM PRATO
A galinhada (com galinha de pasto), o espinhaço de cordeiro, o matambre braseado, a rabada, o tatu recheado, os pratos com história e sabor da estação, com carinho e para compartilhar, pratos que gerem novas relações entre os consumidores.
UM INGREDIENTE
Foco da minha pesquisa no final de 2017, as frutas nativas do RS, como guabiroba, uvaia, jabuticaba, araçá, butiá, pitanga, guabiju e tantas outras vão entrar com tudo no cardápio de 2018 – junto com as PANCS, que já eram tendência para 2017 e agora são realidade.
UMA BEBIDA
O Chá. Vamos entender mais sobre o nosso corpo e, então, reconhecer o papel das ervas medicinais, consumindo muito mais aquilo que realmente nos faz bem.
UM TIPO DE CULINÁRIA
Da nonna! Em palavras mais contemporâneas, comfort food, cozinha de afeto, slow food. Em suma, cozinhar com mais paixão e muito menos complicação.
UM PAÍS
Sou muito local para não achar que é o Brasil – nossa região Sul sem limites e fronteiras, o que inclui Santa Catarina, Paraná, Argentina, Uruguai, entre tantos outros.
UMA TECNOLOGIA
O ancestral. Do cru às longas cocções.
UM HÁBITO DO CONSUMIDOR
Sentir-se humano, se relacionando com o seu instinto mais ancestral: comer e compartilhar.
UM PRODUTOR
Os produtores merecem receber os holofotes da gastronomia, especialmente para quem realmente se preocupa com o ingrediente. Tenho um carinho especial com cada um que trabalha comigo: Carmem, Airton, Michel, Villa, Ronaldo, Elita, Ivandro, Aureo, Gilmar, Vanderlei, entre tantos outros comprometidos em colocar na mesa produtos de qualidade.
CARLA TELLINI
Headchef do Grupo Press Gastronomia
UM RESTAURANTE
Vem aí uma leva de pequenos restaurantes 100% orgânicos, com cardápios criativos, poucas mesas, cozinha aberta, com chef e equipe praticamente junto dos clientes. E nada baratos, porque produtos verdadeiramente orgânicos são bem mais caros.
UM CHEF
Adriano Biasotto. Estudou em duas importantes escolas de gastronomia na Itália e optou por compartilhar todo talento e conhecimento na sua pequena São Marcos – que fica na divisa da Serra com os Campos de cima da Serra. É chef do simpático restaurante do clube local e presenteia a cidade (e seus raros turistas) com uma cozinha serrana genuína, deliciosa e cheia de afeto.
UM PRATO
Xis salada com ovo. Todo mundo ama, e quem não conhece prova e se apaixona. O xis tem personalidade suficiente para fazer frente aos burgers, não só no Brasil, mas no mundo todo.
UM INGREDIENTE
A carne bovina orgânica gaúcha. Nosso Estado tem tudo para produzir a melhor carne, e acredito que em 2018 mais pecuaristas acordarão para esse interesse de quem não abre mão de uma costela, mas não suporta mais a pecuária nociva ao meio ambiente.
UMA BEBIDA
Preparar seu próprio gin em casa, testando diferentes especiarias na infusão, além do tradicional zimbro.
UM TIPO DE CULINÁRIA
Com essência, genuína e corajosa, sem cópia de tendências daqui ou de lá. Cada vez mais as pessoas chegam a um país, uma cidade, e querem provar o que é de raiz, o que tem história.
UM PAÍS
Marrocos. A cozinha marroquina e berbere, mesmo a mais básica, é criativa, sensual e surpreende pelo sabor. Os incríveis e variados Tajines e as receitas de Tangias, feitas em panelas de barro dentro das cinzas, estão sendo cada vez mais apreciados.
UMA TECNOLOGIA
Resgate da insubstituível panela de ferro fundido, que faz bem até para saúde, voltando a ser usada também em restaurantes. Um tatu recheado com ovo e bacon, por exemplo, selado e assado em uma panela de ferro bem antiga, é incomparável.
UM HÁBITO DO CONSUMIDOR
Cada vez mais as pessoas sairão à noite sem carro usando aplicativos para se deslocar para jantar, ficando livres para beber. E por falar em nisso, acredito que o Uber Eats vai se firmar na cidade como alternativa de levar o restaurante até a casa dos clientes, unindo entrega e pagamento em um mesmo aplicativo.
UM PRODUTOR
Os mais de cem produtores de Queijo Serrano da região da Criuva e arredores – é a nossa Serra da Canastra. Além de fazerem o nosso queijo da colônia, vivem em uma região linda, com natureza exuberante e cada vez mais procurada por quem curte turismo de aventura.
LUIZ AMÉRICO CAMARGO
Crítico gastronômico e autor do livro "Pão Nosso"
UM RESTAURANTE
Fechado para Jantar, em São Paulo, justamente porque extrapola o conceito de restaurante formal. Pop-up? Experiência sensorial? Chame como quiser. Inova no sistema de reservas, na comunicação, no serviço. Surpreende com o lugar, o menu, a atmosfera, sempre mutantes.
UM CHEF
Paulo Shin, do Komah (SP). Porque as coisas têm um tempo de maturação: o jovem cozinheiro é cultuado entre os profissionais; seu restaurante serve pratos deliciosos e com ótima relação preço-qualidade; a cozinha coreana, enfim, vai extrapolando fronteiras e indo além da colônia. Por esse processo, aposto num sucesso ainda mais amplo para ele.
UM PRATO
Shakashuka, originário do Norte da África, com suas variações preparadas no Oriente Médio, ou ainda na Espanha/América Latina (como os huevos rancheros): o molho de tomates e pimentões (e outros vegetais), coberto com ovos, cozido até que as claras fiquem branquinhas, mas com gemas moles, vem pipocando cada vez mais, aqui e ali.
UM INGREDIENTE
Azeite brasileiro. Acho que agora vai: o preço é alto, existe uma resistência dos mais céticos, mas o frescor, os aromas, o fato de não viajar longas distâncias, e o reconhecimento de cozinheiros e especialistas vêm criando uma nova percepção para nossos ainda pouco explorados óleos extravirgens.
UMA BEBIDA
Sidra. A bebida frisante elaborada a partir da fermentação da maçã tem baixo teor alcoólico, acompanha bem vários pratos e, mais e mais, as pessoas estão percebendo que se trata de um produto diverso.
UM TIPO DE CULINÁRIA
Vegetariana, cada vez com menos preconceitos, impondo-se mais pelo sabor e pela qualidade, do que pela ideologia. Sem receios em usar legumes feios, sem obrigação de parecer carne, sem querer agradar somente aos veganos.
UM PAÍS
Vou transgredir um pouco: aposto no regionalismo, em localidades. Vai ser um ano de descobrir regiões, biomas brasileiros, culinárias regionais, e não apenas com produtos amazônicos. Coisas simples, mas representativas e saborosas.
UMA TECNOLOGIA
Na cozinha, depender cada vez menos de uma única fonte de calor: usar gás, eletricidade, carvão… No salão, aplicativos e programas que controlam as reservas e filas. Porque é preciso melhorar a organização do tempo e diminuir as demoras.
UM HÁBITO DO CONSUMIDOR
Usar as mãos, para comer pizzas, para empanadas, para várias preparações orientais, e mesmo para porções e bocados da dita alta gastronomia. Um despojamento que, na verdade, traduz apenas a melhor maneira de usufruir de determinados pratos.
UM PRODUTOR
Vou tratar no plural, produtores de queijos e charcutaria. O reconhecimento do público e dos cozinheiros, e os recentes acontecimentos com Roberta Sudbrack e com o queijo mineiro mostraram que chegamos a um limite: não dá mais para marginalizar excelentes artigos por conta de uma legislação que só pensa na grande indústria.