O texto a seguir é uma colaboração de Carlos Roberto Saraiva da Costa Leite, pesquisador e coordenador do setor de imprensa do MuseCom.
“Lila Ripoll (1905–1967), grande intelectual e expressiva figura humana, completaria hoje 114 anos do nascimento. Entre tantas gaúchas que despontaram no campo literário, ela se destacou, com maestria, como poetisa, jornalista, pianista e professora, além de ter realizado importante trabalho no campo político. Sua poesia foi um instrumento de denúncia das mazelas sociais.
Nascida em Quaraí, em 1905, a poetisa era filha do casal Florentino Ripoll e Dora Pinto de Ripoll. A origem da família está ligada a um antepassado espanhol, nascido na cidade de Ripoll, que veio para a América.
Em 1927, seus pais se mudaram para Porto Alegre, buscando o aprimoramento intelectual de sua única filha. Lila estudou no Conservatório de Música, na Escola de Belas Artes. Aos 25 anos, ela começou a lecionar, na Escola Estadual Venezuela, regendo seu Coro Orfeônico e exercendo o magistério com extrema dedicação.
O assassinato de seu primo e irmão adotivo, o advogado e jornalista Waldemar Ripoll (1906–1934) abalou profundamente Lila. Segundo o pesquisador e jornalista João Batista Marçal (1941-2018), ele foi morto a golpes de machado enquanto dormia, por não concordar com a política centralizadora de Getúlio Vargas, além de dar apoio aos paulistas na Revolução Constitucionalista de 1932, e se aproximar da esquerda. Marçal, em sua obra A Imprensa Operária do Rio Grande do Sul, registra também que o crime fora encomendado por figuras ligadas a Flores da Cunha.
Diante desta tragédia, Lila Ripoll se desgostou com a política vigente no país e se filiou ao Partido Comunista Brasileiro (PC), que era clandestino na época.
A partir desta decisão, uma trajetória de desafios e engajamento de cunho sociopolítico e cultural passou a ser vivida de forma intensa por ela. Atuou também no Departamento Cultural do Sindicato dos Metalúrgicos (1935–1939), ministrando aulas de música e literatura, além de realizar espetáculos teatrais e fundar o Coral dos Metalúrgicos. Ao lado de Delmar Mancuso, montou a peça Orfeu da Conceição, de Vinícius de Moraes (1913–1980).
Sua obra constam oito livros editados, entre 1938 e 1965. Na ordem: De mão postas, Céu vazio, Por quê ?, Novos poemas, Primeiro de Maio, Poemas e canções, O Coração descoberto e Águas Móveis. Poemas inéditos foram recuperados e organizados por Alice C. Moreira em Lila Ripoll - Obra completa. A poetisa escreveu também a peça teatral Um colar de vidro, que é um juízo aos valores burgueses, que teve boa receptividade do público e da crítica na capital gaúcha.
De 1949 a 1956, Lila Ripoll manteve uma forte ligação com a revista Horizonte, que reuniu consagrados nomes da cultura regional e nacional. No ano de 1950, chegou a participar do seu comitê editorial. A Horizonte contou com intelectuais ligados à esquerda, como o escritor e médico Dyonélio Machado (1895–1985). No campo da arte, participaram nomes como Carlos Scliar (1920–2001), Iberê Camargo (1914–1994), Vasco Prado (1914–1998), entre outros.
Lila Ripoll, por meio da revista Horizonte, denunciou as desigualdades sociais, suas mazelas e consequências. Na edição nº 27 (1954), está publicado o poema (in memoriam) Angelina, sobre o assassinato da tecelã Angelina Gonçalves durante passeata de operários em Rio Grande, no dia 1º de maio de 1950. A jovem carregava a bandeira do Brasil e trazia pela mão a filha Shirley, de 9 anos, quando foi atingida por um tiro, durante confronto com a polícia. O fato é de profunda consternação na história do movimento operário em nosso Estado.
Como apoio econômico à Horizonte, foi criado, em 1950, o Clube de Gravura de Porto Alegre (CGPA). Este não foi apenas um negócio da revista, pois, ao criar cursos de formação artística e exposições, melhorou o ambiente cultural dos gaúchos. Em 1951, Lila Ripoll participou da organização do 4º Congresso Brasileiro de Escritores.
O Museu de Comunicação Hipólito José da Costa (MuseCom) guarda e preserva em seu acervo algumas edições da Horizonte.
Em 1951, o livro Novos poemas deu a Lila Ripoll, em Praga, na então Tchecoslováquia, o Prêmio Neruda da Paz.
Importante registrar a pesquisa de dissertação, de Luciana Haesbaert Balbueno, A produção de Lila Ripoll na Revista Horizonte (PUCRS 2001). Segundo Luciana, o período mais rico e produtivo de Lila Ripoll foi quando atuava na Horizonte (1949–1956). Em 1965, o escritor Manoelito de Ornellas (1903–1969), na obra Máscaras e Murais da Minha Terra, faz referência elogiosa à Lila Ripoll, declarando que a poesia dela é repleta de sensibilidade e de compreensão quanto aos problemas humanos.
Em 7 de fevereiro de 1967, aos 61 anos, Lila Ripoll morreu acometida por um câncer. Pela importância de sua poesia voltada à construção de uma sociedade mais justa e inclusiva, Lila Ripoll é patrona da cadeira nº 26 da Academia Literária Feminina do Rio Grande do Sul e da sala de eventos no Instituto Estadual do Livro (IEL). Em 2005, foi criado o Prêmio Lila Ripoll de Poesia, promovido, anualmente, pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul”.