Em tempos de pandemia, mais do que nunca precisamos cuidar da saúde. E não é apenas o aspecto físico que merece atenção: é necessário, também, focar no âmbito mental. Uma prática que vem se tornando cada vez mais popular é a do mindfulness — ou atenção plena, em português.
É um exercício constante que possibilita adquirir maior consciência sobre pensamentos, sensações e emoções. A técnica, segundo o pós-doutor em Ciências do Comportamento na psiquiatria da UFRGS e integrante da Iniciativa Mindfulness, Tiago Tatton, difere da meditação por não ser associada à religião:
— Se você vai meditar num centro budista, vai recitar mantras, ou desejando que os benefícios da meditação se estendam aos seres do universo (...) tem toda essa questão metafísica, religiosa. No mindfulness não, é uma prática científica de treino da atenção. É uma adaptação das práticas de meditação na linguagem científica, sem fins religiosos, de bem estar — explica.
Um dos exemplos desses benefícios citados por ele é que os exercícios do mindfulness fazem com a pessoa perceba as próprias emoções e saiba o que fazer com elas:
— Por exemplo: estou com medo que vou ser demitido ou se vou ter dinheiro. Se percebo que isso está presente, posso reagir a isso: como posso me cuidar melhor agora? Procurar orientação, pegar uma água, ligar para um colega. Você consegue se autorregular melhor — diz. — Mindfulness é uma prática de lucidez — resume.
O especialista afirma que, além trazer a consciência para o momento presente, a prática também pode auxiliar no tratamento de doenças como depressão e ansiedade:
— A Universidade de Oxford já demonstrou que a técnica pode ajudar pessoas com depressão a não terem recaída. Ajudar tanto quanto remédio. Isso foi comprovado por meio de diversos estudos. (...) É uma coisa que não envolve mudança na química cerebral. Ajuda na dor crônica, depressão, insônia, redução de estresse, ansiedade.
Não se trata apenas de reduzir estresse ou ansiedade, mas de ver o mundo com uma nova lente.
ANE SARAIVA
fundadora e professora da Escola Sati Consciência Plena
E os benefícios não param por aí. A fundadora da Escola Sati Consciência Plena, professora Ane Saraiva, conta que "cada aluno que chega no programa, leva aquilo que veio buscar". Ela lista também a melhora na qualidade do sono, consciência emocional ou, simplesmente, aprender a lidar melhor com seus pensamentos e preocupações.
— Quando temos essa maior consciência, podemos agir com mais assertividade e coerência com nossos valores e com a pessoa que desejamos ser — disse. — Não se trata apenas de reduzir estresse ou ansiedade, mas de ver o mundo com uma nova lente. E depois de ver desta forma é difícil de voltar atrás — explica.
Quero praticar, e agora?
Para quem quer começar a prática, Tatton recomenda procurar um instrutor de mindfulness com formação no assunto. Ele diz que aplicativos podem ser uma alternativa, mas usualmente não recomenda o uso, uma vez que a melhor maneira de praticar é em grupo.
Ane, por sua vez, convida primeiro à reflexão: quais os motivos que fazem com que queira começar a prática?
— Depois que você tiver isto bem claro, comece aos poucos, cinco minutos por dia. E vá aumentando alguns minutos a cada semana, sem idealizações de uma prática perfeita, de concentração total, pois isso não existe — sustenta.
— Sente-se de maneira confortável, mantendo os olhos repousados ou semi abertos e leve sua atenção para sua respiração. Conecte-se com esta maravilha de privilégio de poder respirar, perceba a inteligência do seu corpo agindo sem precisar fazer esforço e acompanhe as respiração indo e voltando, apenas isso — orienta.
Com o tempo, explica, a tendência é se distrair cada vez menos. Durante o processo, é importante perceber, sem críticas, quando a mente focar-se em outra coisa e retomar a atenção para a respiração novamente.
O exercício em si pode ser feito de duas formas, de acordo com Ane. Em uma delas se usa um áudio guiado como apoio, com comandos que convidam o ouvinte a prestar atenção em determinadas coisas, como sensações táteis do corpo. A segunda é mais informal: redirecionar a consciência para algo enquanto tomamos o banho ou lavamos louça, por exemplo.
— Prestar atenção pode se tornar um jogo interessante e desafiador devido as atitudes mentais necessárias para nossa prática de Atenção Plena ser legítima: manter a mente aberta, curiosa e sem julgamentos (...) Desta forma estamos não apenas treinamento intensamente nossa percepção através dos órgãos dos sentidos, como estamos treinando uma habilidade caríssima para os tempos atuais: a resiliência — disse Ane.