Isa Pitanga, 37 anos, também não precisou trocar de ramo. No Porto, mantém-se como designer e já está se colocando bem no mercado, apesar do pouco tempo – ela, o filho, Eduardo Stahl Rezende Ramos, 15 anos, e uma amiga chegaram em novembro, depois de uma expedição pelo país para decidir onde se estabeleceriam. Bastaram cinco dias para que se apaixonassem pelo toque medieval da cidade às margens do Oceano Atlântico e do Rio Douro, a segunda maior do país. Retornaram ao Brasil com pastéis de nata congelados na mala e uma certeza: era para lá que voltariam.
– O pôr do sol no Douro lembra um pouco o lindo pôr do sol do Guaíba – compara Isa.
Outras semelhanças trazem à memória a pátria que ficou para trás. Isa sugeriu como local para a entrevista a Rotunda da Boa Vista, que, na sua opinião, é aparentada com o Parque da Redenção (e se parecem mesmo!). No final de tarde da quarta-feira, 16 de maio, mãe e filho discorreram sobre os primeiros meses da nova vida celebrando o que consideram uma de suas maiores conquistas: o tempo. Eles conseguem ficar mais horas juntos, passear, sair para um lanche, curtir programas culturais.
– Tem muitos parques para tomar chimarrão. Sempre encontro outros gaúchos com saudades do Rio Grande para partilhar um chimas no fim de tarde – conta ela, agora uma estudante de design de interiores.
Na contramão de muitos de seus conterrâneos, Isa elogia a gentileza dos moradores locais. Os portuenses adoram conversar e ajudar, segundo ela. Um dia, em um autocarro (ônibus), ela questionou o motorista sobre o lugar aonde precisava ir. Uma passageira entreouviu a conversa e se prontificou:
– Deixa estar, vou contigo. Meu caminho é por ali.
Não era verdade. A senhora desviou do próprio trajeto só porque queria ter certeza de que Isa não se perderia. A designer também se encanta com a limpeza das ruas, a qualidade do transporte público, da saúde e do ensino e, claro, a segurança. Certa vez, enquanto ainda residia na capital gaúcha, Isa, a caminho de um ponto de ônibus no Cristal, escapou de um tiro pela distância de apenas dois passos – o disparo que lhe cortou a frente estilhaçou o muro ao lado do qual andava.
Ao contrário da pequena Sofia, de Maia, Eduardo, no nono ano do Ensino Fundamental de uma escola pública – bem melhor do que a particular de Porto Alegre, frisa a mãe –, teve uma integração mais serena. No primeiro dia, o guri se sentia assustado e perdido, sem saber para onde ir, mas os colegas não demoraram a lhe perguntar se toparia participar de uma partida de futebol. Lendo gibis, uma ideia para se enturmar que ele mesmo teve, o adolescente introjeta as gírias: fixe (legal), giro (bonito, engraçado, interessante). Quanto às mesóclises (construções como “amá-lo-ei”, por exemplo), Eduardo tenta, mas não consegue usá-las. É hábito da turma ir ao shopping ou ao cinema depois do último período. Questiono se ele considera já ter amigos.
– Tem pessoas que, quando não vou à aula, perguntam por mim. Considero isso uma amizade – responde. – No Brasil, quando eu chegava a um colégio novo, demorava uma semana até alguém me convidar para fazer alguma coisa – exemplifica.
Também escritora, Isa está transformando em livro sua “maior aventura”. Em De Porto a Porto – A Cada Escolha, uma Renúncia, ela narra: “Eu moro no Porto. Eu vivo em Portugal. Eu tomo vinho quase todos os dias. Eu vou até a Ribeira e me sento num café. Como nos filmes que via na infância, há uma esplanada com mesinhas e cadeiras. Um vasinho de flor no centro. Posso escolher, porque há muitas à beira do passeio e o meu único esforço é pedir uma taça de vinho e um café para mais tarde. Às vezes, basta-me um café. Mas isso é outra história. Respiro fundo. O ar está perfumado porque estamos na primavera e hoje está um bom dia para viver”.