Cada vitória no Oscar resulta em pelo menos quatro derrotas — ou nove, no caso da categoria de melhor filme.
Algumas dessas derrotas se fazem sentir mais. Em 2022, na 94ª edição do troféu concedido pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, tivemos três que pesaram bastante.
A primeira derrota foi da cerimônia em si: o tapa que Will Smith desferiu em Chris Rock, após uma piada de mau gosto do comediante em referência à esposa do ator, Jada Pinkett Smith, ofuscou a premiação. Fala-se muito mais nesse episódio do que nos ganhadores. O irônico é que a Academia e a rede de TV ABC estavam empenhadas em tornar o Oscar um evento atrativo, na luta contra a queda de audiência das transmissões — mas não estava no roteiro o momento de tensão e agressividade que acabou atraindo mais telespectadores, curiosos para saber o desfecho da situação (e alguns, incrédulos, ainda esperançosos de que tudo fosse só uma armação): Smith seria expulso da festa? O que ele diria no provável triunfo como melhor ator por King Richard: Criando Campeãs?
A segunda grande derrota foi de Ataque dos Cães. Era o campeão de indicações, com 12, e já tinha conquistado o Globo de Ouro, o Bafta e o Critic's Choice, mas acabou saindo do Dolby Theatre com apenas um prêmio nas mãos, o de melhor direção, para Jane Campion. Na prática, o faroeste sobre desejos reprimidos repetiu o fracasso de Momento de Decisão (1977) e A Cor Púrpura (1985), títulos que receberam 11 indicações e não ganharam nada.
O insucesso de Ataque dos Cães simboliza a terceira derrota rotunda deste Oscar. Foi a da Netflix, que, pelo terceiro ano consecutivo, era a empresa recordista em indicações. Foram 24 em 2020 (superando a Disney, com 23, e a Sony, com 20), 35 em 2021 (bem à frente do Amazon Studios, com 12) e 27 em 2022 (a Disney ficou em segundo, com 23, e a Warner teve 16). Mas dos 27 candidatos, somente Campion ganhou. Não Olhe para Cima, que concorria a quatro prêmios, não levou nenhum, assim como A Filha Perdida, que disputava três.
Em 2020, a Netflix obteve duas vitórias (Laura Dern como atriz coadjuvante, por História de um Casamento, e Indústria Americana, melhor documentário). Em 2021, sete (fotografia e design de produção, com Mank, figurinos e maquiagem e cabelos, com A Voz Suprema do Blues, documentário, com Professor Polvo, curta de ficção, com Dois Estranhos, e curta de animação, com Se Algo Acontecer... Te Amo).
Para deixar o travo de 2022 ainda mais amargo, a Netflix viu uma concorrente, a Apple TV+, quebrar um tabu e levar para casa o primeiro Oscar de melhor filme concedido a uma plataforma de streaming, por No Ritmo do Coração. Que, no Brasil, está em exibição em outro serviço, o Amazon Prime Video.