"Um dos melhores filmes que eu já vi." Assim Professor Polvo (My Octopus Teacher, 2020), documentário sul-africano em cartaz na Netflix e um dos cinco indicados ao Oscar da categoria, foi definido pela psicanalista Diana Corso.
As credenciais da sensibilidade e da experiência não lhe faltam, afinal, na companhia do marido, o também psicanalista Mário Corso, ela é autora dos livros Fadas no Divã: Psicanálise nas Histórias Infantis (2005), Psicanálise na Terra do Nunca: Ensaios Sobre a Fantasia (2016) e Adolescência em Cartaz: Filmes e Psicanálise para Entendê-la (2017).
De fato, Professor Polvo é um filme extraordinário. E que vem colhendo prêmios. Ganhou o troféu Pare Lorentz, o principal da International Documentary Associaciation (IDA), e o troféu da Associação dos Produtores dos Estados Unidos (PGA). Além do Oscar, foi indicado ao Bafta, a premiação britânica do cinema e da televisão.
Os diretores Pippa Ehrlich e James Reed retratam a história de aproximação entre um homem e um animal da espécie Octopus vulgaris (a mais comum, como o nome científico sugere) em uma floresta de algas na costa da África do Sul. Para além de oferecer imagens fabulosas captadas no fundo do mar — e algumas surpresas registradas na superfície da água —, o documentário tem muito a nos ensinar.
E não apenas sobre os polvos, essas criaturas tentaculares cheias de ventosas — são cerca de 2 mil! Cada uma delas é capaz de desempenhar uma função específica, ou seja, para comandá-las, o molusco precisa mesmo ter um cérebro bem desenvolvido. A inteligência é uma das grandes armas de defesa e de ataque do animal, assim como sua estonteante arte da camuflagem.
Essa capacidade, é verdade, não impediu que fosse avistado, rastreado e acompanhado pelo ser humano da equação, o documentarista Craig Foster. Sua história de vida ilustra algumas lições velhas, mas nem sempre aprendidas, como a de que, se descuidarmos, o trabalho pode nos devorar e a de que não somos visitantes, mas integrantes da natureza: precisamos dela como ela precisa de nós, precisamos praticar o respeito e encontrar a harmonia.
Ao mergulhar nas proximidades da Cidade do Cabo, Foster redescobriu a paz interior, fundamental para ser um esposo melhor e um pai melhor para o filho que vinha crescendo. Reaprendeu como o contato com a natureza pode ressensibilizar as pessoas. Retomou as aulas sobre adaptação que o reino animal tem a oferecer.
O filme espanta e encanta pela simbiose entre discurso ambientalista e reflexão sentimental. Não há exagero em nenhuma dessas partes, tudo flui como se fosse o curso natural das coisas. E é por respeitar tanto o ambiente quanto uma ética documentarista que Craig Foster não interfere nos momentos em que ela — como o sul-africano se refere ao polvo — corre perigo (tubarões-pijama são predadores chatos, persistentes). Por conta disso, o filme se torna ainda mais surpreendente: por um lado, tal qual Foster, não sabemos o que vamos ver no dia seguinte; por outro, também como Foster, vamos aprendendo mais e mais sobre os mecanismos de sobrevivência desse exótico animal.
Enfim: Professor Polvo é um desses tesouros escondidos no fundo (ok, nem tão fundo assim) da Netflix. Mergulhe de cabeça. E de coração.