Um relacionamento saudável passa, necessariamente, pelo diálogo constante. Afinal, mudar de ideia, de gostos, de opinião, faz parte da vida de qualquer pessoa e, em vários momentos, isso estimula o casal a parar para reavaliar a relação – o que não significa que seja uma tarefa fácil.
— A única coisa em que os casais têm que concordar é em discordar. A gente tem que tolerar o outro não pensar como nós. E isso não (pode) ser um problema — destaca a psicóloga, sexóloga e doutora em Psicologia Lina Wainberg.
Coordenadora da especialização em Sexologia Clínica no Centro de Estudos da Família e do Indivíduo (Cefi), de Porto Alegre, Lina explica que é importante estar atenta às necessidades de cada um para que se desenvolva uma relação harmônica, independentemente de quanto tempo o casal está junto.
Na entrevista a seguir, ela fala sobre a importância do autoconhecimento e indica hábitos que podem tornar a rotina emocional e sexual do casal mais saudável.
Qual a parcela de responsabilidade de cada um para não deixar o relacionamento cair na rotina?
Os dois são responsáveis pela busca do seu prazer, a responsabilidade não é do parceiro. Homens e mulheres têm que se conhecer suficientemente para poder ditar na relação sexual aquilo que funciona para si. Não cabe ao outro ter que adivinhar o que seu parceiro deseja. A comunicação erótica é muito importante, mas para isso é necessário que se tenha autoconhecimento.
Qual é o nível de tolerância que uma relação exige?
Em um relacionamento a dois, é importante os casais concordarem em discordar. Não há necessidade de ter que concordar em tudo. A gente tem que tolerar o outro não pensar como nós, e isso não ser um problema. Quando se aprende a discordar é dado um passo bem importante para o amor maduro. Tentar convencer o outro a pensar como a gente é querer que ele seja igual a mim, não permitir que o outro seja quem ele é.
É importante falar sobre as expectativas de cada um?
Relacionamento a dois dá muito trabalho, requer eternamente que haja conversa e alinhamento de expectativas e necessidades, que vão mudando com o passar da vida. Relacionamento requer muito diálogo, porque só assim se mostra quem é de verdade. É inevitável ter algumas discussões, são elas que vão mostrar a intensidade do desconforto. Às vezes, é preciso ser mais enfático para deixar claro o que está dizendo. E isso não significa ser desrespeitoso nem agressivo, mas ser firme em relação ao que se pensa e sente. Quando se compartilha, a tentativa é de melhorar. Quando se denuncia que algo não vai bem, não significa término, significa reformulação.
Como sociedade, estamos passando por um período de reconfigurações das relações amorosas?
A monogamia vem sendo questionada e existe um grupo cada vez maior de pessoas abrindo os relacionamentos, entendendo que a necessidade sexual não significa criar vínculo amoroso. O desejo sexual tem uma linguagem diferente do amor, requer distância, curiosidade, surpresa, e o amor requer previsibilidade, constância, conhecimento. O grande desafio é justamente conseguir manter o equilíbrio entre o amor e o desejo sem que um apague o outro. A criatividade erótica, o sexo como brincadeira, e não como uma busca incessante de penetração e orgasmo, são importantes para manter o desejo num relacionamento a longo prazo.
Como a pandemia influenciou as relações?
Como no isolamento as pessoas ficaram muito juntas, no início até houve uma certa euforia de poder curtir, mas, com o tempo, esse excesso de participação na vida do outro tornou a questão do desejo mais complicada. Casais começaram a perceber o quanto todos nós precisamos de vida social além do parceiro (a). Relacionamento afetivo não é tudo. Inclusive, um dos principais fatores de longevidade é rede social, é amigos. A esposa, o marido não são as únicas pessoas necessárias na vida.
“A única coisa em que os casais têm que concordar é em discordar. Não há necessidade de ter que concordar em tudo
LINA WAINBERG
psicóloga e sexóloga
No último ano, aumentou o consumo de conteúdo adulto. Essas produções ajudam ou atrapalham a vida sexual do casal?
Depende da medida, da intensidade, da frequência e do efeito que tem sobre a pessoa, pois pode levar a uma comparação desmedida com as cenas sexuais assistidas, que são cinematograficamente montadas e distantes da realidade. Além disso, com a pornografia, a pessoa pode querer ir direto para a “cena” que importa, sem se dedicar a curtir os pormenores, se torna muito imediatista em termos de prazer e passa a não dar valor para a atividade sexual que não leve ao orgasmo.
Para dar um up na vida a dois
Lina cita alguns hábitos que ajudam a melhorar – e aquecer – relacionamentos longevos:
Tenha tempo para namorar
Aqui, vale mandar os filhos para a casa dos avós uma vez por semana, chamar a babá, o que for preciso.
— Não necessariamente tem que terminar em sexo, mas que seja um momento para o casal poder curtir um ao outro. Vida sexual requer dedicação — observa Lina.
Abra espaço para o erotismo
Tão natural quanto ter pensamentos eróticos é sinalizá-los ao parceiro(a).
— Às vezes, um carinho mais quente que possa só lembrar à outra pessoa que a deseja. É preciso deixar o cérebro atento e ativo para as sensações e o erotismo — ressalta a psicóloga.
Amplie o repertório erótico
Aprofundar-se em conteúdo erótico é também se permitir conhecer mais sobre si e sobre o que é excitante para cada um. A sexóloga explica que, culturalmente, os homens são mais expostos a esse tipo de informação, mas que as mulheres têm capacidade de se excitar com um número de situações diversas. Descubra qual é a sua e aproveite!
Explore fantasias
Permita-se entrar no mundo paralelo das fantasias eróticas, colocando em prática ou permanecendo apenas no pensamento.
— A pessoa pode ter um pouco de vergonha, mas, quanto mais puder se autorizar a fazer uso dessas fantasias sem culpa, mais vai conseguir — afirma Lina.