Bem-estar, relaxamento e satisfação são algumas das sensações esperadas depois de um bom sexo. No entanto, há quem relate o contrário: apesar de ter tido um orgasmo, a pessoa sente um desânimo e, muitas vezes, até um estranhamento em relação ao parceiro (a). O fenômeno é chamado de disforia pós-sexo (ou disforia pós-coital) e é mais comum do que se imagina.
— É um estado emocional caracterizado por sentimentos negativos intensos, como choro sem motivação, tristeza e irritabilidade, após um intercurso sexual consentido e prazeroso ou após a masturbação. Pesquisadores como Andrea Burri e Peter Hilpert demonstram que outros sintomas podem estar associados, como arrependimento, depressão, frustração e baixa autoestima — cita a ginecologista e obstetra Cleusa da Silva Conceição, especialista em sexualidade humana.
À primeira vista, pode soar contraditório, tendo em vista que essas impressões aparecem mesmo após uma transa com respeito e com quem se ama. Mas o que ocorre é uma desordem psiquiátrica, desencadeada por fatores individuais ou combinados.
Desordem hormonal
De acordo com Maria Flávia Schroeder, psicóloga e especialista em sexualidade humana, há poucos estudos sobre a temática. Entre os existentes, é relatado que uma das explicações para a ocorrência dos sentimentos negativos é uma possível alteração no processo de liberação de hormônios ligados ao sexo.
— Há pesquisas que apontam que pode haver mudanças hormonais. Após o sexo, a pessoa teria um pico da liberação da oxitocina e da prolactina, associadas ao bem-estar, e logo depois um declínio, levando a essa tristeza — afirma.
Expectativas e conexão emocional
Outro ponto citado pela psicóloga é que, muitas vezes, as pessoas criam expectativas irreais em torno do sexo, esperando que o ato traga um nível de conexão emocional para além da transa. Quando isso não ocorre, há uma frustração, dando início ao vazio e à tristeza.
Segundo ela, a relação sexual seria uma das ocasiões em que essa tentativa de conexão se manifesta. Contudo, tal dificuldade ocorre em diferentes âmbitos da vida.
— A disforia pós-sexo está muito ligada à nossa dificuldade de se conectar verdadeiramente com o outro. Hoje, nós vivemos na era da conexão, passamos o tempo todo conectados, de todas as formas. Mas, paradoxalmente, parece que a estamos perdendo a capacidade de estabelecer uma relação mais profunda e verdadeira com o outro — declara.
Além disso, o sexo e o período pós-relação são situações em que as pessoas ficam mais vulneráveis emocionalmente e fisicamente. Afinal, o momento envolve intimidade e exposição do próprio corpo, de sentimentos e de desejos. Esse contexto pode gerar sensações desconfortáveis.
Fatores sociais, ansiedades e traumas
A ginecologista Cleusa da Silva Conceição acrescenta que a disforia pós-sexo também é influenciada por fatores socioculturais, quando são estabelecidas normas, crenças e tabus em torno da sexualidade capazes de gerar culpa e arrependimento.
Outro fator relacionado ao fenômeno são questões emocionais não resolvidas e ansiedades em relação ao ato sexual, como traumas e experiências passadas. Nesse sentido, Cleusa cita os estudos dos psicólogos Joel MacZkowiak e Robert Schweitzer. Eles concluíram que a disforia pós-sexo foi associada, em maior número, a pessoas com níveis de estresse psicológico elevados, a disfunções sexuais e a vítimas de violência sexual.
Como tratar a disforia pós-sexo?
Segundo a psicóloga Maria Flavia, ao identificar uma possível sensação negativa depois de um ato sexual prazeroso, é importante que a pessoa se pergunte o que ela está buscando na relação sexual, entenda o porquê está procurando isso e em que medida essa expectativa está sendo atendida, para tentar identificar como a situação pode ser revertida.
Quando os sentimentos se tornam persistentes, Cleusa orienta que o indivíduo procure ajuda especializada. Muitas vezes, pode ser necessário um acompanhamento multidisciplinar.
— A sexualidade é pilar de qualidade de vida. Saúde sexual é um direito do indivíduo e importa. Se algo está atrapalhando o bem-estar físico e mental, é necessário procurar ajuda, de preferência um profissional especialista em sexualidade. O tratamento precisa ser individualizado. Cada pessoa tem uma história de vida. É necessário que saibamos quem é esse paciente. Precisamos desmistificar mitos, tabus e crenças disfuncionais que ele ou ela possa ter em relação à sexualidade — declara a ginecologista e sexóloga.
Cleusa ainda pontua que a terapia de casal pode ser uma opção entre pessoas que estão em um relacionamento, principalmente se os desconfortos provocados pela disforia pós-sexo não estão sendo compreendidos pela parceria ou se o cenário está afetando a conexão emocional e a intimidade do casal.
*Produção: Carolina Dill