Na RBS TV, o Dia das Bruxas já começou. O Supercine deste fim de semana, à 0h40min de domingo (16), vai exibir Morto Não Fala (2018), filme de terror que se passa na periferia de São Paulo, mas foi realizado em Porto Alegre.
A cidade é visível e audível no filme. Embora o protagonista e os personagens coadjuvantes morem na suburbana Vila Gustavo, por onde circulam rabecões com o logotipo do governo paulista e notícias sobre briga entre torcedores do Corinthians e do Palmeiras, o espectador porto-alegrense poderá reconhecer alguns cenários, como o Cemitério da Santa Casa, no bairro Azenha, ruas do Morro da Cruz e o Parque Saint Hilaire, em Viamão. Ainda que o elenco principal seja todo importado (Daniel de Oliveira, Fabíula Nascimento, Marco Ricca e Bianca Comparato), há um punhado de atores nossos em cena, como Roberto Oliveira, Nelson Diniz, Marcos Contreras e Gabriela Greco.
Afinal, trata-se de uma coprodução entre Globo e Casa de Cinema de Porto Alegre, com direção de Dennison Ramalho, paulista que viveu na capital gaúcha dos sete aos 25 anos. Foi aqui que ele deu seus primeiros passos cinematográficos, o curta-metragem Nocturnu (1998). Não por acaso, é tido e chamado de gaúcho no centro do país (ele próprio se considera um filho do Rio Grande do Sul).
Morto Não Fala investe no terror sobrenatural. Dennison Ramalho evita explicações ou rituais sobre a mediunidade de Stênio, o plantonista de necrotério vivido com muita entrega e seriedade por Daniel de Oliveira. Assim que ele se vê a sós com o cadáver que acaba de costurar, desata a conversar com o morto (que se expressa sob dispensáveis efeitos sonoros). Eis um personagem que não é ilibado, mas acaba conquistando nossa empatia. Só que ele vai enfrentar a básica lei de talião, de reciprocidade. Stênio quebra uma regra: usa uma informação do além, e o pior, para empreender uma vingança.
Dennison conjuga os sustos e a sanguinolência a doses generosas de crítica social. Baseado em um conto do repórter policial Marco de Castro e coescrito por Dennison e Cláudia Jouvin, Morto Não Fala traduz o cotidiano violento das periferias. Abundam no Instituto Médico Legal (IML) jovens (negros, na maioria) vitimados pela guerra do tráfico ou pelas disputas de poder entre torcidas organizadas — espaços de identificação e possibilidade de ascensão para um contingente sem muitos referenciais nem muitas perspectivas. À medida que a narrativa avança, o filme se torna mais particular, tanto no plano dramático (com Stênio cada vez mais enredado na arapuca que armou para si próprio) quanto na sua condução — com Dennison cada vez mais propenso a exibir virtudes técnicas suas e de sua equipe. Aliás, a direção de fotografia de André Faccioli, a montagem de Jair Peres e a trilha sonora de Paulo Beto merecem aplausos.