A Batalha dos Aflitos, como ficou conhecido o jogo que valeu ao Grêmio o título da Série B do Brasileirão de 2005 contra o Náutico, reuniu uma série de elementos dignos de um filme de Hollywood sobre esporte. Naquele 26 de novembro de 2005, o time gaúcho foi do inferno ao céu em um intervalo de 71 segundos.
Um pênalti marcado a favor da equipe pernambucana provocou a revolta dos jogadores gaúchos, e três deles acabaram expulsos. Com sete atletas em campo — o mínimo permitido —, o Grêmio, então bicampeão do Brasil e da Libertadores, com o Mundial de 1983 no currículo, estava diante de uma encruzilhada. Se o Náutico convertesse a penalidade, o Tricolor dificilmente teria forças para buscar o empate que o promoveria de volta para a elite do Campeonato Brasileiro.
Mas o goleiro Galatto defendeu a cobrança de Ademar, e, após o escanteio resultante, o Grêmio armou um contra-ataque que culminou no gol de Anderson. Daí em diante, o time se superou para ocupar espaços e garantir o 1 a 0 — uma tarefa menos complicada do que parecia porque o Náutico, mesmo com quatro jogadores a mais, ficou atordoado, sem reação ao que estava acontecendo em campo.
Essa conquista foi tão inacreditável que rendeu um documentário batizado com o mesmo nome. Inacreditável: A Batalha dos Aflitos (2006) tem direção de Beto Souza e foi lançado em DVD em 2006. Para marcar o aniversário de 15 anos, fiz uma lista com 15 filmes de esporte que retratam triunfos inesperados, viradas heroicas, superação e outros tipos de conquistas históricas, todos baseados em histórias reais. Muitos conquistaram ou pelo menos concorreram ao Oscar. E quase todos estão disponíveis em plataformas de streaming.
Atletismo
Carruagens de Fogo (1981) é o grande clássico do atletismo. Dirigido por Hugh Hudson, reconstitui a preparação de dois atletas do Reino Unido para a Olimpíada de 1924, em Paris: Eric Liddel (Ian Charleson) é um missionário escocês que corre por devoção a Deus, e Harold Abrahams (Ben Cross), filho de judeus, quer provar sua capacidade para a comunidade de Cambridge. Ganhou os Oscar de melhor filme, roteiro original, figurinos e trilha sonora — composta por Vangelis e imortalizada em inúmeras citações: virou um clichê dos momentos de superação e das cenas em câmera lenta.
Bem mais recente, Raça (2016) é a a cinebiografia de Jesse Owens, o corredor negro que humilhou Adolf Hitler ao conquistar quatro medalhas de ouro nos Jogos Olímpicos de Berlim, em 1936. Com direção de Stephen Hopkins, é protagonizado por Stephan James (do policial Crime Sem Saída e do seriado Homecoming). Disponível no Google Play e no YouTube.
Automobilismo
Rush — No Limite da Emoção (2013), de Ron Howard, retrata a rivalidade, nos anos 1970, entre os pilotos Niki Lauda, austríaco discreto interpretado pelo alemão Daniel Brühl, e James Hunt, inglês baladeiro encarnado pelo australiano Chris Hemsworth. As cenas de corrida são excelentes. Disponível no Amazon Prime Video.
Em Ford vs Ferrari (2019), o cineasta James Mangold recria o duelo dos anos 1960 entre a montadora americana e a marca italiana na mítica corrida das 24 Horas de Le Mans. Venceu os Oscar de edição e edição de som e concorreu ao prêmio de melhor filme. No elenco, Matt Damon e Christian Bale. Disponível no Telecine, Apple TV, Now e Google Play.
Basquete
Coach Carter: Treino para a Vida (2005) é um filme sobre um treinador de basquete (papel de Samuel L. Jackson) que, em 1999, retorna para sua antiga escola na Califórnia, onde impõe disciplina e regras duras para colocar o time em forma. A direção é de Thomas Carter. Disponível na Netflix, no Google Play e no YouTube.
Beisebol
Brad Pitt protagoniza Moneyball: O Homem que Mudou o Jogo (2011), de Bennett Miller, que conta a história de como Billy Beane, então gerente geral do time de beisebol de Oakland, tentou reduzir o orçamento da equipe usando um programa de computador para escolher seus jogadores. Disputou seis Oscar, incluindo melhor filme, ator, ator coadjuvante (Jonah Hill) e roteiro adaptado. Disponível na Netflix, no Google Play e no YouTube.
Morto em agosto, Chadwick Boseman deixou como legado uma série de filmes em que interpreta personagens históricos e/ou icônicos para a população negra. Um deles foi Jackie Robinson (1919-1972), primeiro jogador afro-americano da Major League do beisebol, biografado em 42: A História de uma Lenda (2013), de Brian Helgeland. Disponível no Google Play e no YouTube.
Boxe
O ringue é um cenário por excelência para filmes que almejam o Oscar. Os títulos sobre boxe costumam focar em personagens que travam não apenas uma luta física (o que é suficiente para render cenas de ação cruas e realistas ou, pelo contrário, inventivas e até poéticas), mas também uma luta psicológica. É um duelo em que só pode haver um ganhador, mas que permite ao perdedor a segunda chance, tema mítico nos Estados Unidos, um país que nasceu de uma segunda chance — a dos pobres e degradados britânicos que partiram para a América no século 17. Os atores, por sua vez, têm a oportunidade de operar as transformações corporais que enchem os olhos da Academia — não apenas a de malhação, mas sobretudo a de Hollywood.
Diante de muitas histórias já contadas, impossível deixar de destacar Touro Indomável (1980), de Martin Scorsese, que também mostra a decadência do pugilista Jake LaMotta (1922-2017), em papel que rendeu o Oscar de melhor ator a Robert de Niro. Uma das obras-primas do cineasta, ganhou também a estatueta dourada de edição e concorreu a melhor filme, diretor, ator coadjuvante (Joe Pesci), atriz coadjuvante (Cathy Moriarty), fotografia e som. Disponível no Apple TV, no Google Play e no YouTube.
Outro filme indispensável é Ali (2001), cinebiografia de Muhammad Ali (ano-ano) dirigida por Michael Mann. Disputou os Oscar de melhor ator (Will Smith) e ator coadjuvante (Jon Voight). Disponível no Amazon Prime Video.
Futebol
Ao contrário do boxe, o futebol é um esporte mais difícil de ser transposto para o cinema. Mas há alguns bons títulos. Um deles é O Milagre de Berna (2003), de Sonke Wortmann, que recria a vitória da seleção alemã na Copa do Mundo de 1954, alcançada em uma virada contra a poderosa Hungria de Puskas.
Meu favorito não chega a ser um filme, digamos, inspirador. É Maldito Futebol Clube (2009), de Tom Hooper, em que o ótimo ator Michael Sheen interpreta o técnico inglês Brian Clough durante seus turbulentos 44 dias no comando do Leeds United, em 1974. Disponível no Google Play e no YouTube.
The English Game (2020) não chega a ser filme e ficcionaliza bastante episódios históricos dos primórdios do futebol, mas a minissérie merece seu lugar na lista por contar como um time de operários sem tempo para treinar enfrentou de igual para igual a equipe da elite. Disponível na Netflix.
Futebol americano
Duelo de Titãs (2000), de Boaz Yakin, se passa no começo da década de 1970. Denzel Washington encarna Herman Boone, técnico negro contratado para comandar o time de futebol americano de uma escola de Ensino Médio da Virgínia forçada a integrar adolescentes afro-americanos a um colégio até então só de brancos (como o personagem de um jovem Ryan Gosling). Disponível no Disney Plus.
Rúgbi
Ambientado após o fim do apartheid na África do Sul, Invictus (2009), de Clint Eastwood conta como o recém-eleito presidente Nelson Mandela (interpretado por Morgan Freeman, indicado ao Oscar de melhor ator) usou as partidas da Copa do Mundo de Rúgbi de 1995 para unir brancos e negros em seu país. Matt Damon faz o capitão da seleção sul-africana, Pienaar, e concorreu ao Oscar de coadjuvante. Disponível na Apple TV, no Google Play e no YouTube.
Turfe
Dirigido por Gary Ross, Seabiscuit: Alma de Herói (2003) narra a trajetória de altos e baixos de três homens e um cavalo durante a Grande Depressão, nos EUA dos anos 1930. Jeff Bridges faz o papel do milionário que, após tragédia em família, descobre o turfe. Ele contrata o excêntrico caubói vivido por Chris Cooper e, para montar o pequeno, maltratado e desobediente cavalo Seabiscuit, surge um sofrido jóquei (Tobey Maguire). Foi indicado a sete Oscar, incluindo melhor filme e roteiro adaptado. Disponível no Google Play e no YouTube.