Os projetos para autorizar a venda das três estatais que pode significar o passaporte do Rio Grande do Sul para o regime de recuperação fiscal (RRF) são propositalmente vagos. Só permitem privatizar, sem estabelecer condições. Os detalhes, como o governo do Estado vem sinalizando, serão conhecidos na definição do formato de oferta (modelagem) que ficará sob responsabilidade do BNDES. Em tese, está em muito boas mãos.
Perguntado pela coluna sobre qual será o destino da dívida da CEEE – se ao menos parte também será “privatizada”, junto com os ativos da empresa –, o governador Eduardo Leite ponderou que o tema será definido depois do due dilligence (processo de levantamento de todos os dados de desempenho da empresa) que fará parte das tarefas do BNDES. Mas já se vacinou:
– Tudo o que se colocar de passivo para o comprador vai ser descontado do preço a ser pago.
Argumentou que, se todo o passivo fosse repassado, existiria o risco de não aparecer interessado.
A coluna ficou reconfortada, porém, porque o governador conhece bem o caso da Celg, estatal de Goiás, que teve parte dos passivos incluída na bem-sucedida privatização em 2017. Só em passivo a descoberto – contas a pagar que não são compensadas pelo valor de todos os ativos –, o braço de distribuição da CEEE (CEEE-D) tem pendências de R$ 2,97 bilhões.
E só de ICMS, conforme o próprio governador, a distribuidora deve cerca de R$ 1,5 bilhão. Há 22 anos, quando dois terços da empresa foram privatizados, fazendo surgir a RGE e a AES Sul, os novos controladores assumiram negócios “limpinhos”, sem penduricalhos. Parte do aprofundamento da crise da CEEE tem origem nesse movimento. Agora, dependendo da modelagem, não haverá estatal remanescente na qual dependurar a conta. Será de todos os gaúchos.
É por isso que o destino do rombo da CEEE não é um tema menor no debate sobre privatização. É fato que não há mais solução para a empresa de energia, a não ser buscar um investidor privado que tenha bala na agulha para aportar recursos tanto no saneamento financeiro quanto na melhora dos serviços que presta. No entanto, é crucial para a saúde das finanças públicas do Rio Grande do Sul que a solução seja a mais engenhosa possível. Caso contrário, estaremos trocando pagamento de débitos de curto prazo por dívidas de longo prazo, ou seja, apenas trocando cronograma de encrencas.