Será realizado, nesta segunda-feira (12), mais um júri do caso de assassinato do secretário da Saúde de Porto Alegre Eliseu Santos, em 2010. Desta vez, os três réus são acusados de corrupção, um esquema que teria sido interrompido por Eliseu e, por vingança, resultado na morte da vítima, de acordo com o Ministério Público (MP). Irão a júri os réus Marco Antônio de Souza Bernardes (na época, assessor jurídico da pasta), Cássio Medeiros de Abreu (enteado de Bernardes) e José Carlos Elmer Brack (então presidente do PTB na Capital, que atuava na secretaria na ocasião).
A sessão está prevista para iniciar às 9h30min de segunda, no plenário de grandes júris, no 2° andar do Foro Central de Porto Alegre. A previsão é que o julgamento dure dois dias. O júri será presidido pelo juiz Thomas Vinícius Schons.
De acordo com a acusação do Ministério Público, os três réus faziam parte de um esquema de corrupção que ocorria na secretaria na época, e envolvia a empresa Reação, que fazia a segurança de postos de saúde da cidade. A Reação teria entrado no esquema e pagava propina a integrantes da pasta, para que os contratos com a prefeitura fossem mantidos. Naquele ano, Eliseu estava à frente da secretaria e teria descoberto a corrupção, encerrando o contrato com a empresa – que acabou entrando em falência em razão de dívidas e demais problemas.
Os donos da Reação eram Jorge Renato Hordoff de Mello e Marcelo Machado Pio, que teriam então ordenado a morte de Eliseu por vingança, segundo o MP. Os dois também viraram réus no caso e foram condenados em júris feitos neste ano.
Na época, o réu José Carlos Elmer Brack era presidente do diretório do PTB da Capital e atuava na Secretaria de Saúde. Conforme o MP, parte da propina paga pela Reação ficava com ele. Brack responde por corrupção.
Marco Antônio de Souza Bernardes é advogado e, na época, atuava como assessor jurídico da secretaria dirigida por Eliseu. Ele seria o responsável por cobrar propina da empresa, segundo a acusação. O terceiro réu, Cássio Medeiros de Abreu, é enteado de Bernardes e era comerciante. Assim como o padrasto, ele é acusado de corrupção porque intermediaria o recebimento de propina da Reação.
— Bernardes é quem acertou os detalhes dessa propina e, às vezes, mandava o Abreu, que é enteado dele, buscar o dinheiro (junto à Reação). Já o Brack, segundo o próprio réu Mello (sócio da empresa e já condenado), recebia parte desses valores, enquanto atuava na secretaria — afirma a promotora de Justiça Lúcia Helena de Lima Callegari.
O MP explica que os três não tiveram ligação com o assassinato de Eliseu, e sim com o esquema de pagamento de propina. Eles irão a júri – que serve para julgar casos de crimes dolosos contra a vida – porque o processo principal se trata de do homicídio contra Eliseu.
— A corrupção é um crime conexo nesse caso, aliado ao processo principal, de homicídio, e por isso irão também a júri — explica Lúcia Helena.
Na época do crime, houve divergência entre a conclusão da Polícia Civil e do MP. A polícia apontou que os criminosos estavam tentando roubar o carro de Eliseu, o que configuraria latrocínio. O grupo o teria abordado de forma aleatória, em um assalto, e o inquérito policial foi remetido à Justiça dessa forma. Para o MP, no entanto, a morte trata-se de execução, motivada por vingança, por causa do papel de Eliseu na denúncia do esquema de corrução. Na Justiça, prevaleceu esta última versão.
Testemunhas
Foram arroladas 19 testemunhas. Algumas delas já foram ouvidas em outros julgamentos do caso, como o policial civil Sylvio Edmundo dos Santos Júnior, que reforça a tese do Ministério Público de que Eliseu foi vítima de homicídio, e não de um latrocínio (roubo com morte) como concluiu a Polícia Civil. A divergência entre as instituições causou mal-estar na época.
Outra testemunha de acusação que já depôs anteriormente é o advogado e jornalista Leudo Costa. Ele afirma ter entregue à polícia, na época, um HD com imagens e documentos que poderiam ajudar nas investigações e que mostrariam irregularidades envolvendo a Reação e a secretaria.
Entre as testemunhas de defesa estão alguns nomes conhecidos da política gaúcha, como o ex-prefeito da Capital, José Fortunati, e o atual secretário municipal de Governança Local e Coordenação Política, Cassio Trogildo.
Cinco condenados
Este é o quinto júri do caso e último previsto até o momento. Há dois réus que estão com processo em fase de instrução, quando são juntadas provas, e ainda não se sabe se irão ou não a julgamento.
Até agora, cinco pessoas já foram condenadas em sessões anteriores. Uma foi absolvida. No total, treze pessoas foram denunciadas no caso — uma já faleceu e em outro caso o crime prescreveu.
Outros réus já condenados
- Eliseu Pompeu Gomes e Fernando Junior Treib Krol: foram sentenciados a 27 anos de prisão em 2016. Seriam os executores da morte.
- Robinson Teixeira dos Santos: condenado a 33 anos, cinco meses e 15 dias de prisão em 23 de setembro de 2022. Robinson dirigia o carro que levou os atiradores até o local do crime e esperou para fugirem.
- Jorge Renato Hordoff de Mello: condenado a 42 anos e dois meses de prisão, pelos crimes de homicídio quadruplamente qualificado como mandante, por adulteração de sinal identificador de veículo automotor e por corrupção ativa. Ele é um dos sócios da empresa Reação e apontado como mandante do crime.
- Marcelo Machado Pio: condenado por homicídio qualificado, receptação, adulteração do sinal identificador, fraude processual e bando armado. A pena somada diz respeito a 35 anos e 15 dias de reclusão, mais 1 ano e 8 meses de detenção. Era sócio da empresa Reação e é apontado como mandante do crime.
O assassinato
Eliseu Felippe dos Santos, 63 anos, foi morto na noite de 26 de fevereiro de 2010. Ex-vice-prefeito da Capital, ele era secretário municipal de Saúde à época e se preparava para entrar no carro dele, acompanhado da esposa e da filha, na Rua Hoffmann, no bairro Floresta, minutos após deixar um culto. Santos foi abordado por criminosos e chegou a sacar uma pistola, tentando se defender, mas acabou atingido por uma sequência de disparos e não resistiu.
Eliseu era médico traumatologista e ortopedista. Natural de Porto Alegre, foi vereador e deputado estadual pelo PTB, além de vice-prefeito e secretário municipal.
Contrapontos
Ex-presidente do diretório do PTB da Capital, José Carlos Elmer Brack afirmou que não tinha envolvimento no esquema e que o Ministério Público precisará provar o que levou a sua acusação. Advogado, ele fará sua própria defesa.
Cássio Medeiros de Abreu é atendido pela Defensoria Pública de Estado, que afirmou que só irá se manifestar no plenário do júri.
GZH tentou contato com a defesa de Marco Antônio de Souza Bernardes, mas não obteve retorno até o fechamento desta reportagem.