A Câmara dos Deputados aprovou a minirreforma eleitoral, projeto que altera o Código Eleitoral, a Lei da Ficha Limpa e fragiliza a transparência eleitoral e a prestação de contas. Além de encurtar a inelegibilidade de candidatos cassados, o texto aprovado promete um "liberou geral" na propaganda e gastos eleitorais com as propagandas cruzadas entre partidos que não são federados nem coligados.
Siglas podem financiar as campanhas umas das outras, o que significa que um candidato a deputado de um partido pode aparecer junto com um candidato de outra legenda, mesmo que rivais. Será permitido, por exemplo, anúncios partilhados de candidatos do PT, de Luiz Inácio Lula da Silva, e do PL, de Jair Bolsonaro.
A votação foi dividida em duas partes – uma finalizada na quarta-feira (14), e outra nesta quinta-feira (15). Na primeira, a Casa aprovou com 367 votos favoráveis, 86 contra e uma abstenção. Nesta quinta-feira, a Câmara deu 345 votos sim, 55 não. Um deputado se absteve. A matéria vai ao Senado.
O texto altera as regras de contagem de tempo para um político condenado ser impedido de disputar eleição e fixa o prazo limite em oito anos. Pela regra atual, um deputado que hoje é cassado na Câmara fica inelegível pelo resto do mandato e por mais oito anos seguidos. Se ele for punido no 1º ano do mandato, por exemplo, fica inelegível por 11 anos.
O projeto também flexibiliza o prazo de inelegibilidade ao presidente, a governadores e prefeitos que renunciarem aos cargos. O novo texto diz que a contagem de oito anos começa a partir da data da renúncia. Atualmente, o período começa a partir do que seria o fim do mandato do incumbente.
Além da inelegibilidade e da propaganda cruzada, o texto aprovado hoje também fixa o prazo de desincompatibilização, isto é, o período necessário para que algumas profissões precisem abandonar o cargo para poder candidatar-se. No atual modelo, o prazo pode variar entre quatro a seis meses. O texto fixa o período em um semestre.
União Brasil tentou antecipar anistia a partidos em emenda
O União Brasil pediu para adicionar um trecho no texto da minirreforma que poderia anistiar dívidas pretéritas de partidos políticos. Diferentemente da proposta de emenda à Constituição (PEC) da Anistia – também em tramitação na casa e que pode perdoar até R$ 23 bilhões dos débitos dos partidos – todas as legendas foram contrárias.
— Se aprovarmos esse destaque, passaremos uma péssima imagem para a sociedade brasileira através das multas dos partidos — disse o deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB).
A emenda mais controversa entre os partidos trata da divisão das sobras. O texto original pretende trazer o modelo 100/10. As sobras são vagas a preencher após a definição de candidatos eleitos pelo quociente partidário no Legislativo, definido a partir de um cálculo de médias.
Neste modelo o candidato precisa uma exigência mínima de 10% do quórum eleitoral tanto na primeira fase de distribuição de vagas e desconsidera a cláusula de exclusão. O partido precisa ter 100%.
Partidos menores afirmam que isso poderá os retirar da disputa, já que podem ter candidatos únicos com votações expressivas, contrariamente ao partido — protestaram, em especial, o PSOL, o Novo e o Podemos.
— É um sarrafo altíssimo — afirmou Chico Alencar (PSOL-RJ).
O modelo em vigor, o 80/20, facilitaria a vida deles no certame. O modelo 100/10 prosperou, mesmo com o protesto das legendas menores. A proposta é defendida por Lira.
Em uma derrota para o governo a oposição derrubou, por emenda, a existência de mandatos coletivos, que consiste na divisão de um mandato parlamentar entre várias pessoas, proposta que tem adesão para o PSOL.
Veja os principais pontos da minirreforma:
Flexibilização na transparência
Projeto veda aos candidatos apresentarem dados sobre subcontratados em caso de compra de serviço de empresa terceirizada. Órgãos de controle não saberão quem foi contratado, qual a função desempenhada ou quanto trabalharam.
A minirreforma também cria uma nova redação para punições no caso da falta de prestação de contas de partidos. O novo trecho apenas quer punir as legendas com a suspensão de novas cotas do fundo partidário (e não do eleitoral) enquanto perdurar o não-pagamento. Antigamente a legislação permitiria o cancelamento de registro civil caso fique provada a não-prestação de contas à Justiça Eleitoral.
Critérios diferentes nas federações possibilita que partidos possam preencher a cota de gênero sem apresentar candidatas
O porcentual mínimo de candidaturas por gênero, previsto em 30%, deverá ser analisado na lista federação e não em cada partido. Isso quer dizer que é possível cumprir a cota se houver 30% de candidaturas femininas no somatório geral das candidaturas apresentadas pelos partidos, o que significa que uma legenda, individualmente, pode não apresentar nenhuma mulher como candidata, desde que as demais siglas consigam atender a cota de 30% no somatório geral.
O mesmo critério não vale para o caso de sanções. Os partidos individualmente, e não a federação, responderão em caso de infrações passíveis de sanção pela Justiça eleitoral.
Recursos dos partidos não poderão ser dados como garantia
De acordo com o texto, os recursos do Fundo Eleitoral e do Fundo Partidário não poderão mais ser dados em garantia ou bloqueados, veda a determinação judicial de bloqueio dos bens com a única exceção em casos de má administração dos bens.
Neste caso, quem trabalhou ou prestou serviços a um candidato durante o pleito podem ficar sem receber recursos sem serem pagos.
"Nada consta"
O projeto de lei dispensa a apresentação de certidões judiciais de "nada consta" pelos candidatos. Esses documentos acabam revelando a lista de processos quando o político responde a processos judiciais.
Regras para fraude de gênero e ampliação da classificação de violência política
A minirreforma apresenta fatores que caracterizariam fraude à cota de gênero em candidaturas. São estas: a não realização de atos de campanha e a obtenção de votação que revele não ter havido esforço de campanha, com resultado insignificante.
A candidata que desistir da candidatura deverá fazer uma declaração justificada, sem prejuízo de responsabilização da candidata, do partido ou da federação.
O rol de vítimas de violência política contra mulher também será ampliado. Agora, na nova redação, não apenas a candidata, mas a pré-candidata a um cargo, detentora de mandato ou qualquer mulher em razão de atividade partidária política ou eleitoral pode ser enquadrada como vítima de violência política de gênero.