Principal crítico da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Gilmar Mendes pretende esperar novas revelações sobre as conversas do procurador Deltan Dallagnol com o então juiz Sergio Moro para só daí colocar em julgamento um habeas corpus que pode tirar da cadeia o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Gilmar tem em mãos um pedido de suspeição de Moro no processo do triplex do Guarujá e cogita levar o caso à apreciação da 2ª Turma da Corte a partir de 25 de junho.
Nos bastidores do Supremo, é indisfarçável a satisfação de alguns ministros com a divulgação dos diálogos entre Dallagnol e Moro. Na sessão desta terça-feira (11) do colegiado, Gilmar e Ricardo Lewandowski, o presidente da turma, trocaram gracejos ironizando "o último escândalo da República de Curitiba". Antes da sessão, Gilmar fez questão de dizer que a eventual ilegalidade da forma como as mensagens foram obtidas não invalida o seu uso como prova caso a defesa do petista tente anular sua condenação.
- Não necessariamente (anula). Porque se amanhã (alguém) tiver sido alvo de uma condenação, por exemplo, por assassinato, e aí se descobrir por uma prova ilegal que ela não é autor do crime, se diz que em geral essa prova é válida - afirmou.
Alvo de protestos nas redes sociais e nas manifestações de rua em apoio ao governo, a Moro e à Lava-Jato, Gilmar e Lewandowski estariam enxergando no julgamento do hábeas uma forma de revidar os ataques e mostrar que os supostos abusos cometidos na condenação do petista não seriam tolerados na mais alta instância do Judiciário.
O pedido da defesa de Lula começou a ser julgado na 2ª Turma em dezembro, mas foi interrompido por um pedido de vista (mais tempo para avaliar o caso) de Gilmar. Na segunda-feira, um dia depois de o site The Intercept Brasil sacudir o cenário político e jurídico com o vazamento das conversas entre Moro e Dallagnol, o ministro informou que estava pronto para retomar a análise do habeas corpus.
Gilmar e Lewandowski são computados como votos favoráveis à soltura de Lula. O colegiado tem ainda outros três integrantes: Cármen Lúcia, Edson Fachin e Celso de Mello. Relator da Lava-Jato, Fachin é tido como voto certo pela manutenção da prisão, assim como Cármen Lúcia. A incógnita repousa no voto de Celso de Mello, decano do Supremo e considerado um dos ministros que mais preservam os direitos dos réus.
Quem frequenta o gabinete de Gilmar diz que a demora na liberação do processo é justamente para tentar atrair a simpatia de Celso de Mello. A defesa de Lula cita como prova da suspeição de Moro o fato de ele ter ingressado na política e ter aceito convite do presidente Jair Bolsonaro para ocupar o Ministério da Justiça.
Agora, Gilmar estaria esperando que novas reportagens do The Intercept revelem ações mais graves do juiz na condução das ações penais da Lava-Jato, em especial que envolvam Lula. O desgaste de Moro, calcula o ministro, poderia tisnar a legitimidade da condenação a ponto de motivar um voto de Celso de Mello pela liberdade do petista.
Como a partir desta quarta-feira (12) Cármen Lúcia assume a presidência da turma, Gilmar estuda apresentar o hábeas "em mesa", instrumento jurídico pelo qual o ministro responsável pelo caso pode pautar o processo sem permissão prévia do comando do colegiado. Seria uma forma de evitar que Cármen Lúcia deixasse o pedido dormitando, tal como fez com a revisão das prisões em segunda instância durante o período em que presidiu o STF.
Na sessão desta terça-feira do colegiado, a última à frente da Segunda Turma, Lewandowski aceitou um habeas corpus coletivo que decreta a suspensão de todas as prisões dos condenados em segunda instância detidos a partir de súmula do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). O ministro fez questão de pautar o julgamento para esta terça-feira justamente porque temia que sua sucessora engavetasse o caso.
O voto de Lewandowski beneficia Lula e outros condenados como o ex-ministro José Dirceu, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e o ex-deputado Eduardo Cunha. Apesar da posição do ministro, o colegiado decidiu levar a decisão para o plenário, envolvendo assim os 11 ministros do STF. Não há previsão para esse julgamento.