Senadores de vários partidos afirmaram ter votos suficientes para aprovar, nesta terça-feira (28), a manutenção do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sob o controle do ministro da Justiça, Sergio Moro. Caso isso seja confirmado, haverá um impasse com a Câmara, que sob a liderança do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do centrão, aprovou na semana passada a migração do órgão para o Ministério da Economia.
A medida provisória (MP) 870, que trata da reestruturação ministerial feita pelo governo Jair Bolsonaro, precisa ser votada pelo Congresso até a próxima segunda-feira (3), caso contrário perde a validade.
Se houver alteração no Senado, a MP volta para a Câmara — que, na prática, tem até esta quinta-feira (30) para se posicionar, já que nas sextas e segundas os políticos não costumam estar em Brasília.
O texto diminuiu o número de ministérios de 29 para 22. Caso a MP caduque, a configuração da Esplanada terá que voltar aos moldes do governo Michel Temer (MDB).
Na conta mapeada pelo governo, há 44 dos 81 votos do Senado para aprovar a manutenção do Coaf com Moro. Esse cenário chegou ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que levaria a situação a Bolsonaro.
Nos bastidores, o Palácio do Planalto já havia fechado acordo com os principais partidos da Câmara para abrir mão de manter o órgão com o ministro da Justiça. No entanto, boa parte das legendas no Senado sinalizam não ter interesse em continuar com esse acordo.
Líder do partido do presidente no Senado, Major Olimpio (PSL-SP) é um dos principais defensores da decisão que contraria a nova posição de Bolsonaro. Com isso, parlamentares de outras legendas se sentiram livres também para escolher seus votos, sem precisar seguir o governo, que tem articulação precária no Congresso.
— O presidente fez uma manifestação, mas o líder do partido fez outra e diz que o Coaf tem que voltar para a Justiça. Esse é o governo — afirmou Otto Alencar (PSD-BA), líder do partido no Senado. — O que o governo não pode querer é que a gente resolva a vida deles. Isso que não pode querer. O PSD não quer cargos, não quis. Os aliados é que precisam resolver a vida do governo — completou, dizendo que não vai voltar atrás em seu voto.
O senador Espiridião Amin (PP-SC) afirma que aguarda uma posição formal de Bolsonaro, mas que seu voto no momento é para o Coaf ficar com Moro:
— Live de Facebook não é o processo legislativo adequado. Havendo votação, esse será o meu voto (para voltar para o Moro). Se o governo mudar de posição formalmente, a gente avalia.
Um dos vice-líderes do governo no Senado, Eduardo Gomes (MDB-TO), diz que vai tentar reverter a situação:
— Sou operário do governo. Não faz sentido eu encaminhar algo de forma diferente. O que existe é uma maioria preocupada em destravar a agenda. Talvez tenha maioria pelo Coaf com Moro, mas vamos tentar desconstruir isso. Acho que não vai ser um drama.
Major Olímpio diz ainda que há uma outra questão de fundo, a de que o Senado não pode ser uma mera "casa carimbadora" de decisões dos deputados:
—Estamos (senadores) literalmente com saco cheio (da Câmara). É um desrespeito. Que a Câmara seja a Casa revisora. A gente tem que votar assim e pronto? Não é assim. A capacidade escrotal está repleta, assim fica politicamente correto.
Amin diz concordar:
— Eu não posso admitir isso. Se eu admitir que o Senado não pode deliberar porque a Câmara não tem prazo, eu tenho que me demitir. Eu não posso admitir isso.
Recuos e derrotas de Moro
Perda do Coaf
Criado em 1998, o Coaf Conselho de Controle de Atividades Financeiras é um órgão de inteligência financeira que investiga operações suspeitas. Ao assumir a Presidência, Bolsonaro tirou o Coaf do Ministério da Economia e o colocou na pasta de Moro, a Justiça. O ex-juiz acabou derrotado depois que a Câmara devolveu o Coaf à Economia, o que ainda precisa passar pelo Senado
Pacote anticrime parado
Principal iniciativa de Moro no ministério, proposta pouco avançou no Congresso, em meio a atritos com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que disse que projeto era "copia e cola" e Moro, um "funcionário de Bolsonaro" depois de o ex-juiz cobrar agilidade na tramitação do pacote.
Decreto das armas
Seu primeiro revés foi ainda em janeiro. O ministro tentou se desvincular da autoria da ideia de flexibilizar a posse de armas, dizendo nos bastidores estar apenas cumprindo ordens do presidente. Teve sua sugestão ignorada de limitar o registro por pessoa a duas armas: o decreto fixou o número em quatro.
Laranjas
No caso do escândalo de candidaturas de laranjas, enquanto Moro deu declarações evasivas, dizendo que a PF iria investigar se "houvesse necessidade" e que não sabia se havia consistência nas denúncias, Bolsonaro determinou, dias depois, a abertura de investigações para apurar o esquema.
Caixa 2
Por ordem do Palácio do Planalto, a proposta de criminalização do caixa 2, elaborada pelo ministro da Justiça, vai tramitar separadamente do restante do projeto anticrime.
Ilona Szabó
Moro teve de demitir a especialista em segurança pública por determinação do presidente, após repercussão negativa da nomeação. Ilona Szabó já se disse contrária ao afrouxamento das regras de acesso a armas e criticou a ideia de ampliação do direito à legítima defesa que está no projeto do ministro.