Dois dias após terminar a eleição para a prefeitura de Porto Alegre em terceiro lugar, a ex-deputada Juliana Brizola (PDT) se pronunciou a respeito do resultado. Em entrevista de 20 minutos concedida a Zero Hora na tarde desta terça-feira (8), Juliana avaliou a campanha, agradeceu aos apoios recebidos e recomendou uma autocrítica ao seu partido. A despeito da votação expressiva da candidata a prefeita (19,69%), a legenda encolheu na Câmara de Vereadores e conquistou apenas uma cadeira.
Sobre a disputa de segundo turno, Juliana disse que a decisão do partido deverá ser anunciada apenas na quarta-feira (9), mas admitiu a tendência de apoiar Maria do Rosário (PT).
— Minha decisão vai ser a decisão do partido — disse a pedetista.
Juliana ressaltou que há diferenças entre seu partido e o PT, indicou que o apoio a Rosário não será engajado e negou ter recebido mensagem da candidata petista. Por outro lado, se disse contrária à liberação dos filiados ou à neutralidade.
A seguir, os principais trechos da entrevista concedida por Juliana Brizola a Zero Hora:
Qual a sua avaliação sobre a eleição de domingo e por que a demora em se pronunciar?
Na verdade, no domingo eu não pensei em nada e ontem (segunda) foi um dia de resguardo. As crianças (os filhos José Inácio, 14 anos e Angelina, 10) se envolveram muito e tive de explicar para elas. Nenhum dos dois foi na escola, porque fizeram muita campanha e estavam com vergonha. Tive de explicar que faz parte e que nem sempre a gente ganha na vida. Ontem fiquei o dia todo com eles e conversando com pessoas do partido.
Faço uma avaliação positiva em relação ao nosso crescimento. Começamos com 7% e acabamos com quase 20%.
Nossa campanha veio para dar uma alternativa às pessoas que não se sentem identificadas nem com um lado nem com o outro, e não é fácil romper a polarização. Acho que as pessoas votam muito mais pela negação do que por acreditar num projeto. Me sinto satisfeita de ter apresentado uma campanha bonita, leve, com propostas. Lamento que a gente não tenha conseguido chegar, mas é bola pra frente. Respeito totalmente a decisão das pessoas que escolheram levar as outras duas candidaturas ao segundo turno.
Qual será sua posição sobre o segundo turno?
Ontem ainda conversei bastante com o presidente Lupi (Carlos, presidente nacional do PDT). Eles (dirigentes do PDT) estão todos conversando, inclusive comigo. Minha decisão vai ser a decisão do partido. Acredito que amanhã (quarta) eles já vão ter uma decisão. Parece que a Maria do Rosário ligou para ele (Lupi) e também iria conversar com o atual presidente, o Romildo, com o Pompeo (de Mattos) e com o Afonso Motta, que é líder da bancada federal. Acredito que no máximo amanhã a gente terá uma decisão e vai anunciar.
A tendência é de apoiar Maria do Rosário, que foi quem os procurou?
A tendência é pelo campo, pela aproximação do campo, pela participação do próprio ministro no governo Lula. A gente passou a campanha toda mostrando os equívocos da atual gestão. Mas há um distanciamento do PT aqui no Rio Grande do Sul e em Porto Alegre, tanto é que não estávamos juntos. Se a gente fosse próximo, teria construído essa aliança desde o primeiro turno, o que não se consolidou por essas diferenças. Acho que não será um apoio como talvez o PT espere.
Mas não sou da opinião de liberar os pedetistas ou optar pela neutralidade, acho que as pessoas esperam um posicionamento.
Agora, exatamente o que vai acontecer, o quanto vamos entrar na campanha, isso tudo não sei ainda mencionar. Eu, particularmente, ainda não fui procurada por ninguém do PT.
A Maria do Rosário disse que lhe mandou uma mensagem. A senhora viu? Respondeu?
Mas não mandou. Eu vi a matéria, mas não mandou. Não mandou mesmo. Ela pode também estar sendo aconselhada a ter esperado esse primeiro dia, não sei exatamente, mas eu não falei com ninguém do PT.
Se pudesse, a senhora teria mudado algo em sua campanha? O que faltou para chegar ao segundo turno?
Olha, se a gente tivesse mais umas duas semaninhas... (risos) talvez a gente conseguiria, porque era uma onda crescente. Acho que a gente estava acertando em tudo. Fomos acertando aos poucos, tivemos um crescimento e, talvez, se houvesse mais umas duas semanas a gente poderia ter rompido a polarização. Mas essa é minha primeira análise, ainda não me debrucei sobre a totalidade dos votos em cada uma das regiões do mapa eleitoral.
O que a senhora tira dessa campanha?
Já fui deputada e vereadora e nunca tinha recebido uma votação tão expressiva. Em 2020 a gente fez uma votação bem abaixo dessa (6,41%). Isso mostra que ainda tenho muito trabalho para fazer por Porto Alegre. Não sei exatamente por onde vou caminhar, mas vou continuar trabalhando por Porto Alegre. E mostra que o nome do meu avô ainda é muito forte, porque ele já é falecido há mais de 20 anos — digo isso pelo que escutei na cidade sobre ele.
E mostra que precisamos nos debruçar sobre as abstenções, a falta de confiança que as pessoas têm de que o voto vai mudar alguma coisa.
Penso que existe um caminho, uma brecha, para resgatar essas pessoas que não acreditam mais na política. Um caminho a ser trilhado que possa sair dessa polarização, mas tem que ser construído, e a gente precisa conversar mais com as pessoas.
A gente entende que ninguém pensa igual, que tem divergências, que tem oposição, tudo isso é muito salutar para a democracia. Mas fico assustada com esse grau elevado de ódio e quando vejo um vereador ser eleito com o nome Ustra. Acho que se perdeu completamente a noção em algumas questões. Fico pensando sobre qual motivo as pessoas votaram nessa pessoa. Foi porque fazem uma apologia à ditadura, à tortura? Fico bastante preocupada.
Esperava um engajamento maior do governador Eduardo Leite em sua campanha?
Não, sempre imaginei que seria da forma como foi. Ontem recebi uma mensagem dele muito carinhosa, dizendo que se sentiu honrado em me apoiar. Estou muito satisfeita com ele, acho que entrou da forma certa, no momento certo, e inclusive essa votação eu devo bastante a ele.
O PDT esperava ao menos manter a bancada de dois vereadores, chegou a sonhar com três, mas elegeu apenas um. Como o partido pode recuperar a força que já teve em Porto Alegre?
Ah, essa é uma tarefa árdua, que inclusive estou me propondo a ajudar, por ser a maior liderança do partido em Porto Alegre. Agora estamos no momento de lamber as feridas, mas o partido precisa sentar e estudar como vamos fazer. E esse pensamento tem que começar agora, não dá para ser na véspera da eleição.
O que aconteceu conosco foi isso: não se tinha uma certeza de como a gente iria e não se fez o trabalho adequado para se ter uma boa nominata. Sei que não é fácil, porque não é um partido que dispõe de grandes recursos, mas vamos ter que nos adequar. O PDT tem que olhar para dentro, fomentar lideranças jovens, abrir mais para a participação feminina e fazer uma autocrítica.
Como fica seu futuro político? Quais os planos para as próximas eleições?
Acho que ainda é cedo. Vou voltar para minha missão partidária, sou secretária de Relações Internacionais do PDT nacional, e em seguida vai chegar o momento de os partidos começarem a pensar em 2026. Não em composições ou em quem vai ser cabeça de chapa, porque isso é um pouco mais para frente, mas na construção de nominatas. Nosso partido precisa crescer sua bancada federal. A questão eleitoral vamos avaliar, sou soldado do partido, se for para ajudar, vou ao que eles quiserem, seja deputada estadual, deputada federal ou ficar sem mandato também.
A senhora tentou três vezes chegar à prefeitura, antes como vice e duas vezes como prefeita. O sonho ainda está vivo?
Está muito vivo, porque eu tenho um amor muito grande por Porto Alegre. Não deu dessa vez, quem sabe não pode dar da próxima.
O que tem a dizer para quem votou na senhora?
Eu quero agradecer. Agradecer meu vice, Doutor Thiago, ao governador Eduardo Leite, ao Carlos Lupi, que foi o padrinho dessa candidatura, ao meu partido e a outros que coligaram. E agradeço a todos que estiveram com a gente, que acreditaram. Sei que são muitos e que estão bastante tristes, mas quero que ergam a cabeça e que a gente olhe para frente. Porto Alegre precisa de todos nós, porque quem faz a cidade são as pessoas. E vamos em frente, ainda tem muita coisa para acontecer.