A crise na Venezuela ganhou um novo capítulo nesta terça-feira (30). O país amanheceu sob tensão, com o líder opositor Juan Guaidó afirmando que tem o apoio da ala militar contra o governo de Nicolás Maduro. Autoproclamado presidente interino da Venezuela, Guaidó disse estar participando da "fase final da Operação Liberdade" e convocou os venezuelanos para irem às ruas para o "fim da usurpação" do poder de Maduro.
Ao lado de Leopoldo López, um dos principais opositores ao regime chavista, Guaidó foi até a base militar de La Carlota, na capital Caracas, acompanhado de militares dissidentes. López estava em prisão domiciliar, impedido de sair de casa. Sua liberdade é um dos indícios do apoio de ao menos parte das Forças Armadas aos opositores.
O governo Maduro denunciou uma "tentativa de golpe de Estado". O vice-presidente de comunicações do país confirmou militares dissidentes, mas que seria um "grupo reduzido".
Entenda a crise na Venezuela:
Preço do petróleo
A queda de mais de 50% nos preços do petróleo, em 2014, marcou o início da crise econômica na Venezuela, inflamando as tensões entre o governo e uma oposição empenhada em tirar Maduro do poder. A commodity representa a maior parte da renda do país.
Protestos e prisão de Leopoldo López
Junto ao abalo econômico, a oposição liderada por Leopoldo López se voltou às ruas para exigir a renúncia de Maduro, em protestos que deixaram 43 mortos entre fevereiro e maio. Acusado de incitar a violência, López foi preso e condenado a quase 14 anos de prisão. Desde 2017, ele cumpria prisão domiciliar.
2015
Oposição conquista vitória nas urnas
A oposição ao governo de Maduro conquistou vitória histórica nas eleições parlamentares em dezembro de 2015. O trunfo marcou o fim de 16 anos de hegemonia chavista com a maioria de pelo menos três quintos da Assembleia Nacional. Como manobra para enfraquecer a oposição, Maduro começou a usar a Suprema Corte e a Justiça Eleitoral do país para garantir hegemonia política, diminuindo os poderes do Parlamento.
2016
Fim de diálogo
A coalizão oposicionista, que controlava o Legislativo venezuelano, suspendeu o diálogo com o governo, que não teria cumprido acordos envolvendo o cronograma eleitoral e a libertação de opositores. O grupo contrário a Maduro pressionou por referendo revogatório contra o presidente, mas o processo foi descartado pelo Executivo. Os opositores, então, pediram a antecipação das eleições presidenciais, marcadas para 2018, o que também foi rejeitado.
2017
Suprema Corte assume o Parlamento
O Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) da Venezuela assumiu as competências do Parlamento em março. A decisão, segundo analistas, representou mais um passo rumo a modelo autoritário. O Congresso, de ampla maioria opositora, considerou a manobra um desacato. Após forte pressão internacional, o TSJ voltou atrás e revogou a decisão um mês depois.
Mortes em protestos
Mesmo com o recuo, a ação do Supremo foi o estopim para uma onda de protestos em todo o país. Com manifestações quase diárias, marcadas por confrontos entre manifestantes e forças de segurança, mortes, prisões de opositores e cenário de guerra, a crise política no país ficou ainda mais inflamada. A violência vinculada às manifestações entre abril e julho de 2017 deixou 125 mortos.
Invasão no Parlamento
Partidários de Maduro invadiram o Parlamento em julho de 2017. Vinte pessoas, entre elas sete parlamentares, ficaram feridas nos confrontos durante o ato.
O então presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, o opositor Julio Borges, disse que a ação foi ordenada pelo governo. Na época, Maduro condenou o ataque e pediu investigação dos fatos.
Constituinte
Em 30 de julho, mais de 8 milhões de venezuelanos votaram para definir os integrantes da Assembleia Nacional Constituinte (ANC), órgão que seria considerado por Maduro como legítimo detentor do poder legislativo. O dia da eleição foi violento e terminou com 10 mortos – dois deles adolescentes.
A oposição e vários governos rejeitaram o resultado, considerando a votação "fraudulenta". A maioria votou de acordo com o Conselho Nacional Eleitoral (CNE). A oposição diz que Maduro usa a nova constituinte para garantir sua supremacia no poder. Em agosto, a ANC decidiu, por unanimidade, assumir as competências do Parlamento, deslegitimando a Assembleia Nacional, controlada pela oposição.
Com a manobra, o cenário político no país ficou mais tenso. Os opositores consideram a decisão ilegítima e como um instrumento do governo de Maduro para consolidar uma ditadura no país.
2018
Maduro reeleito
Em maio de 2018, Maduro foi reeleito presidente da Venezuela. Em um processo marcado por denúncias de fraude, abstenção de eleitores — o sufrágio não é obrigatório, e apenas 46% dos venezuelanos aptos votaram — e falta de reconhecimento de opositores e da comunidade internacional, o polêmico sucessor de Hugo Chávez obteve um mandato de mais seis anos, a partir de janeiro de 2019.
Crise migratória
Com o cenário caótico no país, alto índice de inflação, falta de produtos básicos e taxa elevada de desemprego, parte da população da Venezuela decidiu tentar a sorte em países vizinhos. Entre os destinos escolhidos, estão Brasil e Colômbia. Como Roraima não dá conta de absorver o alto fluxo de migrantes, o governo federal intensificou processo de interiorização, transferindo venezuelanos para outros Estados, como o Rio Grande do Sul.
Janeiro de 2019
Posse de Maduro
Em 10 de janeiro de 2019, sob críticas e suspeitas internacionais, Maduro tomou posse para um novo mandato, que irá até 2025. Ele conta com o respaldo das Forças Armadas e da Suprema Corte, mas sofre resistência interna da Assembleia Nacional, que é comandada pela oposição. Países como o Brasil e os Estados Unidos não reconhecem o novo mandato de Maduro.
Presidente do Congresso contesta mandato
Um dia após a posse de Maduro, o presidente do Congresso venezuelano, Juan Guaidó, anunciou que assumiria a presidência interina do país, não reconhecendo o novo mandato do sucessor de Chávez. Guaidó afirmou que vai comandar a Venezuela com o apoio da população e do Exército para "convocar uma processo de eleições livres e transparentes que facilitem uma transição pacífica e democrática no país". Guaidó afirma que a decisão segue a Constituição do país.
Guaidó se declara presidente interino
Cumprindo a promessa, Guaidó fez um juramento constitucional e se proclamou presidente interino da Venezuela. O gesto foi reconhecido pelo Brasil, pelos Estados Unidos, pelo Canadá e pela Organização dos Estados Americanos (OEA). Apoiadores e opositores do governo Maduro realizam protestos em Caracas. Os tumultos no país deixam saldo de pelo menos quatro mortos. Uma estátua de Hugo Chávez foi queimada.
Maduro chama Guaidó de golpista e rompe relações com os EUA
Em um discurso inflamado no Palácio de Miraflores, sede do governo venezuelano, em Caracas, Maduro rechaçou qualquer possibilidade de deixar o cargo. Para o presidente, Guaidó tenta um golpe de Estado semelhante ao de Pedro Carmona, que tentou derrubar Chávez em 2002. Em retaliação, Maduro ordenou que todas as missões diplomáticas dos Estados Unidos deixassem o país.
— Aqui há dignidade, c... — afirmou.
Crise econômica
O embate político na Venezuela tem como pano de fundo a intensa crise econômica que afeta o país. A instabilidade provocou escassez de comida e remédios e, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), a inflação em 2019 vai chegar a 10.000.000%. Conforme a ONU, 2,3 milhões de pessoas deixaram o país desde 2015.
Fevereiro de 2019
Ajuda humanitária
O Brasil preparou operação para fornecer ajuda humanitária em "cooperação com o governo dos Estados Unidos" à Venezuela. Conforme o governo federal, caminhões com medicamentos e alimentos seriam enviados para cidade de Pacaraima, em Roraima, na fronteira com o país vizinho.
O envio de ajuda humanitária se tornou novo foco de embate entre Maduro e Guaidó. O sucessor de Chávez temia que a entrega poderia facilitar a intervenção dos Estados Unidos e pediu aos militares que impeçam a entrada das mercadorias. Guaidó, por sua vez, discursou a favor da entrada dos produtos.
Fechamento de fronteira com Brasil
Com a tensão formada em torno da ajuda humanitária, o posto de fronteira entre o Brasil e a Venezuela foi fechado no dia 21 de fevereiro, após determinação de Maduro. A manutenção da medida provocou a revolta de grupos que buscavam permitir a entrada de mantimentos no país. Em confronto com indígenas, no Estado de Bólivar, na fronteira com o Brasil, militares venezuelanos mataram pelo menos duas pessoas.
Militares dissidentes
Militares venezuelanos desertaram e pediram refúgio no Brasil após o fechamento da fronteira com a Venezuela. Utilizando uniforme, afirmaram que participaram da repressão aos protestos. Ainda em fevereiro, a Colômbia informou que 60 militares venezuelanos pediram refúgio no país.
Março de 2019
Guaidó visita o Brasil
Em março, Guaidó visitou o Brasil, onde foi recebido pelo presidente Jair Bolsonaro. O chefe do Executivo brasileiro recebeu o venezuelano como chefe de Estado. Guaidó deixou a Venezuela em 22 de fevereiro, apesar da proibição de deixar o país, incorrendo no risco de ser preso em seu retorno, advertiu Maduro. Após a visita ao Brasil, Guaidó visitou o Paraguai.
Apreensão no retorno
Em 4 de março, Guaidó retornou à Venezuela após ter desobedecido uma ordem judicial que o proibia de deixar o território nacional e visitar vários países latino-americanos. Havia a apreensão de uma eventual prisão do líder opositor. Ele entrou no país normalmente pelo Aeroporto Internacional Simón Bolívar, em Maiquetía. Ele foi recebido por vários militantes. Havia possibilidade de cruzar pelas fronteiras com Colômbia e Brasil. Guaidó optou pelo ponto mais difícil, em desafio ao regime de Nicolás Maduro. Sem confronto, ele se encontrou com apoiadores durante ato.
Apagão
Um apagão deixou Caracas e grandes regiões da Venezuela no escuro em 7 de março. O regime Maduro rapidamente denunciou a falta de energia como "sabotagem" contra a principal barragem de geração de energia elétrica no país. Dois dias depois, situação e oposição organizaram protestos no país. A promotoria pública venezuelana abriu uma investigação contra Guaidó, acusando-o de estar envolvido em uma "sabotagem" do sistema elétrico.
Aliado de Guaidó é preso
Agentes do Sebin (a agência de inteligência da Venezuela) detiveram na madrugada do dia 21 de março Roberto Marrero, diretor do escritório de Guaidó. Em uma ação que começou às 2h (3h em Brasília), cerca de 15 homens encapuzados invadiram primeiro a casa do deputado Sergio Vergara, no bairro de Las Mercedes, na capital Caracas. A oposição criticou a ação do governo.
Novo apagão
Um novo apagão afetou pelo menos 15 dos 23 Estados da Venezuela, incluindo Caracas, em 25 de março. Novamente, o governo de Nicolás Maduro atribuiu o problema a um "ataque contra o sistema elétrico nacional".
Sanção contra Guaidó
Em 28 de março, o controlador-geral da Venezuela, Elvis Amoroso, afirmou que o líder opositor Juan Guaidó está proibido de ocupar cargos públicos por 15 anos. De acordo com Amoroso, Guaidó teve inconsistências em suas informações financeiras, e seus gastos não correspondem ao seu nível de rendimentos, o que, segundo ele, indicaria corrupção.
Abril de 2019
Supremo contra Guaidó
O Supremo Tribunal de Justiça (TSJ) da Venezuela, controlado pelo governo do ditador Nicolás Maduro, pediu em 1º de abril à Assembleia Nacional, de maioria opositora, que retire a imunidade parlamentar de seu presidente, o líder opositor Juan Guaidó. O pedido foi feito no âmbito de uma suposta investigação contra Guaidó, que violou a medida que o proibia de deixar o país sem autorização.
Perda de imunidade parlamentar
Em 2 de abril, Guaidó teve cassada a sua imunidade parlamentar. O julgamento foi realizado pela Assembleia Constituinte do país, organismo reconhecido pelo presidente venezuelano Nicolás Maduro como poder legislativo legítimo — o que é contestado pela oposição. A Assembleia Constituinte venezuelana foi escolhida em 2017, sob protestos da oposição e de diversos países — entre eles o Brasil.
Grupo de Lima contra Maduro
O Grupo de Lima divulgou uma nota oficial, no encerramento de reunião em 15 de abril, em Santiago do Chile, em que reconheceu que a Venezuela vive "uma crise humanitária, política, econômica e moral, gerada pelo regime ilegítimo e ditatorial de Nicolás Maduro, que constitui uma ameaça para a paz e a segurança internacionais, com efeitos regionais e globais". O grupo exigiu ainda a saída imediata de Maduro.
Outro aliado de Guaidó preso
O deputado da oposição venezuelana, Gilber Caro, foi detido por agentes da Inteligência do governo em 26 de abril, quase um ano depois de ter sido solto. O parlamento de maioria opositora responsabilizou o governo do presidente Nicolás Maduro "pela vida e pela integridade" do deputado de 45 anos.
Guaidó diz ter apoio de militares
Na manhã desta terça-feira (30), Guaidó afirmou que se encontra com as principais unidades das Forças Armadas do país para dar início ao que chamou de "fase final da Operação Liberdade". Ele também convocou os venezuelanos para irem às ruas para o "fim da usurpação" do poder de Nicolás Maduro. López foi solto e acompanha Guaidó nesta terça-feira. A liberação do opositor reforça o apoio dos militares, citado por Guaidó.