Polêmica nenhuma fica sem resposta de Renato Portaluppi. O técnico que completou três anos no comando do Grêmio ininterruptamente nesta semana, conversou com a reportagem de GaúchaZH durante 50 minutos na quarta-feira, no CT Luiz Carvalho, e falou sobre permanência para 2020, nível do futebol brasileiro, técnicos estrangeiros, favoritismo do Flamengo, entre outros detalhes relacionados ao Tricolor.
Ainda dolorido pela eliminação na Copa do Brasil, lembrou que o time ainda tem duas frentes importantes para focar neste ano: Brasileirão e Libertadores. Ele entende que o adversário no torneio continental tem a obrigação de vencer sua equipe pelo investimento que fez na temporada. Mas, ressalta:
— Vai passar pelo Grêmio? Aí é outra história, aí é outra novela.
Como costuma fazer em suas entrevistas, o treinador elogiou o grupo de jogadores que tem à disposição, mas não se omitiu ao falar que serão precisos reforços para a próxima temporada — caso ele continue, claro. Até mesmo sobre isso, apesar de dizer que ainda não está pensando no ano que vem, salientou a felicidade que sente por comandar o clube do coração e ter uma relação próxima com o presidente Romildo Bolzan Júnior, a quem considerou um "irmão", e disse facilitar sua vida dentro do clube.
— Foram três anos que pareceram seis meses, porque o ambiente é o melhor possível — destacou.
Aliás, sobre seus atletas, respondeu sem pestanejar aos questionamentos sobre o rendimento de Luan, a troca de André por Tardelli, o comportamento de Patrick e a ascensão de Jean Pyerre e Matheus Henrique. Também criticou a metodologia de alguns técnicos do futebol brasileiro e, apesar de elogiar os trabalhos dos gringos Jorge Sampaoli e Jorge Jesus, questionou:
— Eles acrescentam alguma coisa? Só se ganharem.
O certo é que o técnico gremista respondeu aquilo que podia. Sem rodeios. O resto, como ele próprio costuma dizer, "só uma hora antes do jogo". Veja a entrevista, dividida em tópicos:
Os três anos no clube
"Não tenho palavras. Você vai botar na balança e, como jogador, ganhei praticamente tudo aqui no Grêmio. Aí voltei como treinador e ajudei, nesses três anos, a conquistar seis títulos. Fora as outras competições, que chegamos a semifinais importantíssimas da Libertadores e da Copa do Brasil, coisa que há muito tempo não acontecia no Grêmio.
É um trabalho de um todo, de todos os departamentos do clube. Aqui eu me sinto em casa. Então, é difícil até de explicar a emoção que sinto, porque acima de tudo eu sou gremista, minha família toda é gremista. Trabalhar num ambiente em que me sinto em casa e ter ajudado o Grêmio a sair de uma fila de 15 anos sem um título nacional, que eu acho uma coisa inadmissível um clube grande não conquistar um título nacional em 15 anos.
Aqui eu me sinto em casa. Então, é difícil até de explicar a emoção que sinto, porque acima de tudo sou gremista"
RENATO PORTALUPPI
Técnico do Grêmio
Então, na minha volta, com esse grupo, com essa diretoria, com o presidente e a força da nossa torcida nós retomamos o caminho dos títulos. E títulos importantíssimos. Hoje o Grêmio, novamente, está num patamar bem alto devido a esses títulos que nós conquistamos nesses últimos três anos. Posso até ter errado em algum momento. Ninguém é perfeito, mas sempre busco o melhor. Se acertasse todas, seria o gênio do planeta. Ninguém acerta todas. Mas aí me perguntam: 'onde você errou?'. É difícil, porque sempre tentei fazer a coisa certa.
O problema é que às vezes você erra e tem o resultado, aí vai achar que tomou a decisão certa. Da mesma forma que você toma uma decisão certa e não tem o resultado. Aí as pessoas falam que foi uma decisão errada. Procuro ver sempre o que é melhor para o clube. Não vejo o que é melhor para mim ou só para o fulano, beltrano e sicrano. Vejo o que é melhor para o grupo. Mas nem sempre a gente consegue o resultado que quer".
Permanência no Grêmio
"Se depender do presidente, da diretoria, do grupo, da torcida, sim. Da minha vontade, sim. Mas a minha cabeça está voltada ao Campeonato Brasileiro e à semifinal da Libertadores. Nesses últimos três anos, chega nessa época e o pessoal começa: 'o Renato vai ficar, o Renato não vai?'. Sempre falei para vocês, como falo aqui dentro do clube, minha preocupação agora é com o time, com o Campeonato Brasileiro e com a semifinal da Libertadores.
Depois, como todos os anos eu faço, vejo se chego em um acordo ou não. Nem parei para pensar nisso ainda. Mas tenho um relacionamento com o presidente aqui como se fosse de irmão. Meu relacionamento com ele é o melhor possível. Tenho linha direta com ele, falo praticamente dia sim, dia não com o presidente. Resolvo um monte de problemas na linha direta com ele. E foi assim todos os anos. Na hora de sentar, conversar, senta o meu procurador, a diretoria e qualquer coisa sento com o presidente e a gente resolve.
Já tive duas propostas excepcionais do Flamengo, fora de outros clubes que vocês não ficaram sabendo. Mesmo assim, continuei no Grêmio. Não é que não me veja fora daqui, é que me sinto tão em casa no Grêmio, que nem parei para pensar em me ver fora daqui.
Aqui estou muito bem. Foram três anos que pareceram seis meses, porque o ambiente é o melhor possível. Eu, quando acordo no hotel, sinto o maior prazer em vir para o CT trabalhar, porque o nosso ambiente é muito bom. Os próprios jogadores falam. Isso é fundamental para que você possa trabalhar bem e conquistar. A pior coisa é você acordar e ter de ir para um trabalho em que você não se sente bem, porque aí as coisas não andam".
Momentos mais amargos
"Os amargos são quando você não consegue ter os objetivos que, no caso, foram o Estadual de 2017, que nós perdemos nos pênaltis para o Novo Hamburgo, no ano passado, a semifinal contra o River, e a desclassificação agora contra o Athletico-PR. São coisas doloridas. Por outro lado, perdemos um Mundial. Mas aí você vê o outro lado também, o Grêmio tinha mais qualidade, com todo respeito ao Novo Hamburgo, o Grêmio tinha de ter passado pelo Novo Hamburgo e fomos desclassificados. Aí doeu bastante.
Contra o River, nós fomos desclassificados numa semifinal dentro de casa. Mas aí o que me deixa um pouco mais tranquilo é que nós não perdemos dentro de campo, nós perdemos fora de campo. O gol que o VAR deu, com o braço, é dolorido por causa disso. Converso até hoje com o presidente sobre isso, com a diretoria. Não pode.
E agora com a desclassificação de novo contra o Athletico-PR, não tirando os méritos do Athletico, que foi melhor do que a gente dentro do campo. Agora, nós tivemos um pênalti. E eu vejo cada pênalti que tem acontecido por aí, e o árbitro não ter dado aquele pênalti pra gente, é inacreditável. Porque mudaria a história do jogo.
Mas, no Mundial, nós perdemos para um dos melhores, se não o melhor time do mundo. Nosso time todo quebrado, e mesmo assim nós perdemos o jogo apenas de 1 a 0 e com uma falha nossa. Mas são coisas que quando você não consegue todos objetivos, é logico que dói".
O melhor Grêmio com Renato
"Todas as vezes em que trabalhei no Grêmio, os grupos foram maravilhosos. Aí, uma diferença ou outra são as opções do treinador e o tempo que tive para trabalhar. Em 2010, cheguei aqui e duvido que qualquer outro ídolo do clube aceitaria. O Grêmio estava em 19º no Brasileiro. O Grêmio tinha grandes chances de cair para a Segunda Divisão. Coloquei tudo em risco, o que eu já tinha feito dentro do clube como jogador. Voltei, peitei e naquele ano, no meio do tiroteio, o Grêmio chegou à Libertadores. Então, foi um trabalho maravilhoso. O nosso grupo era muito bom também. Mas não tive tempo suficiente para trabalhar.
A mesma coisa em 2013. Peguei basicamente o trem andando e, mesmo assim, o Grêmio foi vice-campeão brasileiro. Agora, não. Formamos alguns atletas aqui dentro, descobrimos alguns talentos lá da base, tive tempo para trabalhar, tive sequência, fui conhecendo melhor o grupo, fui trazendo peças importantes, e tive tempo de colocar em prática o esquema de jogo que eu queria com as peças que eu tinha no grupo.
Sempre gostei de jogar ofensivamente, mas não adianta você só atacar, atacar, atacar, e não ter os teus cuidados defensivos e a posse de bola"
RENATO PORTALUPPI
Técnico do Grêmio
Então, todas as minhas passagens aqui foram maravilhosas. Eu destaco essa justamente pelos títulos e pela sequência, que é importante no nosso trabalho. Mas o Grêmio que quero como modelo é o atual, sem dúvida alguma. Justamente por isso: tive tempo, descobri talentos aqui dentro, pude mesclar juventude e experiência, e colocar em prática o que sempre tive na minha cabeça.
Sempre gostei de jogar ofensivamente, mas não adianta você só atacar, atacar, atacar, e não ter os teus cuidados defensivos e a posse de bola, que é importante. Então, hoje, o Grêmio encanta o Brasil há três anos. É lógico que o Grêmio não joga todos os jogos bem. Seria uma coisa impossível. Nem o melhor time do mundo vai jogar sempre bem. Agora, que encanta o futebol brasileiro o estilo de jogo do Grêmio, encanta. E isso é fundamental, porque aqui no Sul a maioria das pessoas acha que antigamente se jogava muito fechado, muitas faltas, muitos chutões e o Grêmio mudou esse estilo. Me sinto orgulhoso de ver.
Tenho muitos amigos do Rio, São Paulo, no Brasil todo, que falam que só param para ver na televisão, a não ser, lógico, o time deles, o Grêmio, porque dá prazer de ver jogar. E o Grêmio não só joga bonito como conquista títulos. Uma coisa é você só jogar bonito e não conquistar".
Nível do futebol brasileiro
"O que me preocupa, e eu respeito a opinião de todo mundo, cada técnico trabalha de sua forma, mas eu já falei lá no curso da CBF, um ano atrás, praticamente, e eu vou repetir aqui: estou muito preocupado com o futebol brasileiro. Porque a gente vem tendo aí uma geração de treinadores que me preocupa pela maneira que eles colocam o time deles para jogar. Volto a repetir: cada um põe da maneira que quer, cada um trabalha o seu time da maneira que quer, porque cada um é o treinador. Agora, me preocupa em termos de futebol brasileiro.
Vejo hoje no futebol brasileiro os treinadores engessando os jogadores. O que é engessar um jogador? É você tirar a qualidade dele, de repente não trabalhar em cima da qualidade dele e fazer com que ele faça um tipo de trabalho dentro do campo que é somente se defender e entregar a bola para o adversário. O futebol brasileiro nunca foi assim. O futebol brasileiro sempre encantou o mundo por ser um futebol alegre, divertido, mas com responsabilidade. E eu não tenho visto mais isso no Brasil.
Assisto aos jogos porque sou treinador, preciso saber o que está acontecendo, preciso ver os adversários. Agora, a maioria dos jogos não me encanta. Vejo mais por obrigação. Mas o futebol brasileiro não tem me encantado. Então, por isso que eu destaco aí: o Santos, que gosta de jogar mais ou menos como o Grêmio; o Flamengo, até pelos atletas que tem.
O Flamengo tem um grupo que é uma seleção. Até falei com meus jogadores que, hoje, se você pegar a Seleção Brasileira e fizer um amistoso contra o time do Flamengo, é jogo duro. Então, o Flamengo tem sim obrigação de jogar bonito e de ganhar. Porque se você for ver os jogadores que o Flamengo contratou, além do dinheiro, você vê de onde esses jogadores vieram. Vieram de times fortíssimos da Europa. Então, o Flamengo gastou dinheiro, contratou bem e tem a obrigação de jogar bem".
Favoritismo do Flamengo
"O Flamengo é o favorito e tem a obrigação de ganhar, sim. Bota na balança: o Grêmio gastou R$ 7 ou 8 milhões, o Flamengo gastou quase R$ 200 milhões. Então, tem a obrigação de ganhar. Até pelo grupo do Flamengo. Eu sempre falo: os grupos do Palmeiras e do Flamengo são os melhores do Brasil. O Flamengo hoje vem jogando um futebol bonito? Sim, vem jogando um futebol bonito. Tem encantado? Sim. Mas é obrigação. É obrigação pelo que o Flamengo gastou e pelo que tem no elenco. Você não pode gastar o que o Flamengo gastou, ter a qualidade de jogadores que o Flamengo tem, e não jogar bem.
O Flamengo é o favorito e tem a obrigação de ganhar, sim. Bota na balança: o Grêmio gastou R$ 7 ou 8 milhões, o Flamengo gastou quase R$ 200 milhões. Então, tem a obrigação de ganhar"
RENATO PORTALUPPI
Técnico do Grêmio
Agora, não adianta nada se você não conquistar também. O Flamengo vem fazendo isso há quatro meses, o Grêmio vem fazendo isso há três anos. Só que o Grêmio forma jogadores dentro de casa, o Flamengo vai e contrata. Cada um no seu estilo, cada clube usa as armas que tem. O Flamengo vem encantando, mas é aquilo que eu falei, pela qualidade dos jogadores que o Flamengo tem no elenco. Mas o Flamengo só vai firmar isso tudo se ganhar. O Grêmio, não.
O Grêmio vem jogando dessa forma, vem encantando o Brasil, há três anos. São dois grandes clubes, duas grandes torcidas. Agora, se você botar na balança, pesa muito mais para o lado do Flamengo justamente pela folha de pagamento que tem, pelo dinheiro que investiu, que eu não tenho nada contra, pelo contrário. Tem dinheiro, tem que gastar, tem que buscar. E o Flamengo formou um grupo forte, justamente para ganhar. Vai ganhar? Não sei. O Flamengo é o favorito contra o Grêmio? O Flamengo é o favorito, justamente por tudo que ele gastou, pelo grupo que ele formou. Vai passar pelo Grêmio? Aí é outra história, aí é outra novela".
Técnicos estrangeiros no Brasil
"O Sampaoli veio fazer um trabalho bom no Santos. Aí você tem que colocar uma coisa, que as pessoas se descuidam nesse sentido. Vou dar alguns exemplos aqui: São Paulo, Atlético-MG, Santos, principalmente o Santos e o São Paulo. Eles têm obrigação de brigar pelo título brasileiro. Porque quando os outros grandes clubes estavam se matando na Copa do Brasil e na Libertadores, jogando com time totalmente alternativo, o São Paulo, Atlético-MG... Atlético-MG nem tanto porque estava na Sul-Americana, mais o Santos, eles estavam jogando uma vez por semana.
Então, perderam a grande chance de dispararem, de colocarem uma gordura. Eles não colocaram. O Sampaoli vem fazendo um bom trabalho? Sim, o Sampaoli vem fazendo um bom trabalho. Aí eu te pergunto: ganhou alguma coisa? Não, pelo contrário, em todas as competições o Santos saiu. Na Sul-Americana, foi eliminado por uma equipe que eu nem tinha ouvido falar. Em casa. Depois, foi desclassificado na Copa do Brasil, em casa também. E só ficou no brasileiro. Então, é aí que eu falo. Está fazendo um bom trabalho? Sim, mas o trabalho é bem feito quando você ganha.
O Jorge Jesus ganhou dois, três títulos portugueses só. E saiu de Portugal e foi pra Arábia. Ele nunca treinou fora de Portugal um grande clube da Europa"
RENATO PORTALUPPI
Técnico do Grêmio
Aí nós vamos pro Jorge Jesus. Está fazendo um bom trabalho? Sim, está fazendo um bom trabalho. Mas é obrigação, pelo que ele tem em mãos. Aí você vai falar assim: 'não, mas o Flamengo está jogando que nem o Grêmio, o melhor futebol do Brasil'. Concordo. Mas o Jorge Jesus ganhou dois, três títulos portugueses só. E saiu de Portugal e foi pra Arábia. Ele nunca treinou fora de Portugal um grande clube da Europa. E nunca conquistou nada. Ele está com 65 anos. Está com uma seleção nas mãos. Ele é obrigado a fazer exatamente o que ele está fazendo, o Flamengo jogando um futebol bonito, mas tem que ganhar.
Aí você vai ver se ele tem capacidade, se ele é um bom treinador, se ele ganhar. Ou você tira ele do Flamengo e tira do Palmeiras, que são os dois melhores grupos no Brasil, e bota ele em outro clube no Brasil: "ó, é esse grupo aqui que você tem, agora me dá resultados". Aí você vai ver se o cara é bom. Com uma seleção nas mãos, você é obrigado a ganhar. Não só ele, qualquer outro treinador. Aí você pergunta: 'eles acrescentam alguma coisa?' Só se ganharem. Colocar o time do Flamengo para frente é obrigação. Aí é que eu falo, tinha de pegar, não o Sampaoli, mas o Jorge Jesus, e pôr ele num clube que não seja Flamengo e Palmeiras. Esse aqui é o grupo, agora faz jogar e ganha. Aí você vai mostrar que você é bom".
Existe Evertondependência?
"O Grêmio não é dependente do Everton, mas o time precisa do Everton. Mas não depende somente do Everton. Ele acrescenta bastante, tanto é que quando tomou o terceiro cartão amarelo aqui, contra o Athletico-PR, num lance infantil, ele foi multado. Eu multei ele, eu disse: 'pô, você não pode tomar um cartão amarelo, sabendo que está pendurado, naquele lance. Deu um carrinho bem no campo do adversário, estava com a cabeça onde?' Multei ele. Fez falta. Mas o Grêmio quando o Everton não joga, é o Grêmio. Continua encantando.
Agora, lógico que ele acrescenta bastante. O Grêmio, por ser grande, não pode ficar dependendo de um jogador apenas. Hoje, o Everton nosso, o Bruno Henrique e o próprio Everton (Ribeiro) do Flamengo, na minha opinião, são os melhores jogadores do Brasil. Então, ele sabe que teve na Seleção Brasileira agora, merecidamente, ajudou bastante o Brasil.
Ele sabe da importância dele. Nós sabemos que o Everton fez muita falta contra o Athletico-PR, sem dúvida alguma. Agora você vai dizer assim: 'se o Everton não jogar, o Grêmio não vai ganhar'. Não, não é assim. Ele é um jogador muito importante no nosso esquema. E eu espero que continue assim, até pra ele continuar sendo chamado para a Seleção".
Tardelli como centroavante
"Não é que eu demorei pra ver. Agora, vocês vão ver com o tempo, tenho conversado bastante com o Tardelli justamente por isso. O que acontece é que o Grêmio joga de uma maneira, que cria bastante. A bola passa sempre ali próxima do gol do adversário, dentro da área do adversário. Então, eu preciso ter um homem ali. Justamente para incomodar os zagueiros e para estarem ali no momento em que a gente criar as chances para tentar fazer o gol.
O Tardelli é diferenciado. O Tardelli tem mais qualidade que o André? Sim, o Tardelli tem mais qualidade que o André. Só que o Tardelli nunca jogou ali. Então, se você notar, o Tardelli, quando ele joga, é um jogador que sai muito da área. E o Grêmio tem umas jogadas rápidas, que chega rapidamente no fundo para fazer a jogada, e eu preciso desse homem dentro da área, e muitas vezes o Tardelli não está ali. Justamente porque ele não está acostumado a jogar naquele local.
Então, muitas vezes, eu colocava o André porque todas as jogadas o André estava lá dentro da área. Bem ou mal, ele estava lá, estava incomodando os zagueiros. Então, é uma característica totalmente diferente, e é isso que estou tentando colocar na cabeça do Tardelli, para ele jogar mais próximo da área do adversário. Ali ele vai estar com mais perna para não se desgastar muito, até porque ele sempre jogou pelos lados. Agora ele está se acostumando a jogar numa posição que, basicamente, ele nunca jogou. Então, essa que é a diferença.
O Tardelli é diferenciado. O Tardelli tem mais qualidade que o André? Sim, o Tardelli tem mais qualidade que o André. Só que o Tardelli nunca jogou ali"
RENATO PORTALUPPI
Técnico do Grêmio
A gente tem o Tardelli, que tem uma qualidade a mais do que o André, mas em compensação o André conhece mais o local do atacante. É isso que as pessoas as vezes não enxergam. Porque muitas vezes a gente vai fazer a jogada e a gente não vai ter o homem dentro da área para concluir a gol, pra fazer o gol, entendeu? Essa que é a diferença.
Tive uma conversa franca com ele. Falei: 'olha só, a idade chega pra todo mundo, você ainda quer continuar correndo atrás de lateral? Vai correr uma, duas, três, na quarta já não vai conseguir mais, e toda vez que for atrás, não vai ter condições de chegar lá na frente. Não é você, é qualquer um na sua idade'. Tenho uma coisa na cabeça, o jogador diferenciado, quem tem de correr atrás é o adversário. Então, disse pra ele: 'quem sabe eu começo a te colocar mais aqui por dentro, como 9. Você vai se desgastar menos e toda vez que a bola chegar em você, vai estar com mais força e muito mais próximo do gol'.
Ele gostou da ideia. Não adianta eu falar isso e o jogador dizer 'ah, não, não gosto, não vou me adaptar, não quero jogar aqui'. Pelo contrário, ele gostou muito da ideia. Tanto é que agora tenho conversado com ele e ele falou 'pô, aqui é muito melhor de jogar'. Respondi: 'agora é contigo, só não quero que quando você jogue daqui a pouco saia 50 metros da área'".
Carência na lateral direita
"Foi que nem de zagueiro. Aí algumas pessoas falavam: 'ah, o Grêmio não se preparou, não contratou zagueiros'. Gente, o Grêmio tinha zagueiros. Agora, qualquer clube e qualquer treinador não pode achar que ninguém vai machucar. Infelizmente, nós perdemos o Marcelo (Oliveira), que era um zagueiro, ele operou. O Paulo Miranda ficou três meses no departamento médico. Como que nós iríamos imaginar isso?
"Ah, tem que buscar zagueiro". Eu não busco qualquer zagueiro. Não vamos trazer um zagueiro para o cara vir aqui e não ser do nível do grupo do Grêmio. Aí não adianta trazer. Quem travava os zagueiros era eu mesmo. Dizia: "não, não traz". Até eu achar um zagueiro. Aí eu achei o David Braz e disse que podia trazer. Não adianta trazer um zagueiro aqui para dizer "ah, contratei um zagueiro". Daqui a pouco tem que botar o cara para jogar, o cara vai lá e não dá conta do recado. Quem é o burro da história? Então, não adianta contratar um jogador para mostrar pra todo mundo. Eu não trabalho dessa forma. Trabalho com jogador que eu sei que é do nível do grupo do Grêmio. Senão, vou improvisar, como improvisei.
Agora, você vai me falar assim "ah, na lateral direita, o Léo (Gomes) vai ser operado". Pô, a gente não contava com isso. Mas o Grêmio tem mais dois laterais, o Grêmio tem o Galhardo e tem o Léo Moura. Tem três atletas para a posição. O Léo Moura está voltando, mais uma semana ele está voltando, e tem o Galhardo que está jogando bem.
Aí me perguntam: "e o Paulo Miranda?". Numa emergência. Tenho dois jogadores da posição, não posso ficar improvisando. Por que eu vou improvisar? Então, por que eu tenho esses dois jogadores no grupo? Até porque o Léo Moura, quando joga, dá aula de futebol. O Galhardo teve a oportunidade dele agora e vem jogando bem. Por que eu vou improvisar? Então, vou pegar o Léo Moura e o Galhardo e mandar embora. São jogadores da posição? Quem vai jogar são eles.
Agora, numa emergência, o Paulo Miranda? Pode ser. Tenho dois jogadores da posição, ou joga um ou joga o outro. Senão, tem que mandar embora o jogador. A não ser que não estivessem dando conta do recado. Aí tudo bem, vou improvisar, o que não é o caso. O Léo Moura joga muito bem e o Galhardo, nesses últimos jogos, foi muito bem. É simples o futebol, não tem que inventar. Se inventa, tenta alguma coisa, quando não está dando certo".
Grupo para 2020
"O Grêmio tem um grupo maravilhoso. Não precisamos de muito mais gente, não. Algumas peças. Então, fica muito fácil. Só que na minha cabeça já sei as peças que eu preciso caso fique aqui. Pronto, é simples. O Grêmio tem um grupo maravilhoso, uma juventude maravilhosa. O Grêmio, vocês estão vendo aí o que a gente descobre de talentos.
O Grêmio teve um time muito forte em 2016. Quando descobriu o Arthur, os cara ficaram tudo 'pô, o Arthur'. Jogador espetacular, tanto é que está na Seleção Brasileira e é titular do time do Barcelona. Saiu, 'pô, Arthur saiu', aí a gente descobriu o Matheusinho. Descobrimos o Jean. O Grêmio vai renovando o grupo dele. Quando não tem essas peças aqui dentro de casa, a gente vai lá e busca.
Na minha cabeça, já sei as peças que eu preciso caso fique aqui. Pronto, é simples. O Grêmio tem um grupo maravilhoso"
RENATO PORTALUPPI
Técnico do Grêmio
Aí duas, três peças, quatro peças, até porque é muito difícil segurar um Everton no final do ano. Então, é um local em que a gente vai precisar de uma peça, sem dúvida alguma. Mas são coisas mínimas, pelo grupo de jogadores que temos. O Grêmio vem trocando duas, três, quatro peças, perdendo três, quatro peças todo ano e está ali o Grêmio. O Grêmio não é um time que vai lá e tem que contratar 10, 12 jogadores, então se torna mais fácil. Tem alguns nomes na minha cabeça já para o ano que vem? Tem, mas não vou falar os nomes agora. Uma que não sei se vou ficar, mas se ficar, já tenho, já estou me articulando por fora".
Lapidação dos garotos
"O Jean Pyerre, eu falo para ele: 'se quer ganhar dinheiro, se quer ficar milionário, me escuta'. Tem uma coisa que é fundamental e que ele fez muito bem nesse último jogo, que é chegar próximo da área e chutar. Ele é um dos melhores caras do nosso grupo que chuta no nosso gol, se não for o melhor. Então, eu falei: 'por que que você não vai usar essa tua característica? Tem que chegar na área'.
Antigamente, ele pegava a bola, tocava e ficava assistindo para ver o que ia acontecer na jogada. Não chegava nem próximo da área do adversário. Hoje em dia, não. Ele chega, chuta e faz gol. Falei: 'meu amigo, na posição em que você joga, que eu te coloco e te dou liberdade, você tem que chutar a gol, tem que fazer gol, porque senão vou botar outro. Todo mundo fala você é clássico, você é técnico, você joga bonito, concordo com tudo isso, mas e o resultado? Você tem que dar resultado. Não adianta só pegar a bola, tocar e ficar assistindo'.
Era essa mania que ele tinha quando chegou ao profissional do Grêmio. Hoje não, ele se movimenta, faz o time jogar, chuta e faz gol. Ele tem de chegar na área, fazer jogada de fundo. Porque senão, com outro treinador, você não vai jogar, nunca vai jogar na Europa. E nesses últimos jogos ele tem chutado e tem feito gols. É isso que eu quero dele, entendeu? Não adianta você só tocar, dar um passe bonito, dar um lançamento bonito e não chegar na área, não chutar, não fazer gol. Ele sabe que é pro bem dele.
É a mesma coisa o Matheusinho. Ele evoluiu muito, mas pergunta pra ele quantos defeitos eu não tirei dele? Mas ele tinha o que era mais importante, a qualidade dele. Então, trabalhei em cima da característica dele. Eu não ensinei o Matheusinho a jogar. Não ensinei o Jean a jogar. Isso eles já têm. Eu corrijo o que eles têm de errado, e esses erros que eles têm, que são coisas normais, são fundamentais para o crescimento deles.
Tanto é que alguém conhecia o Matheusinho e o Jean? Ninguém conhecia. Não adianta você pegar um jogador da base e dizer "toma a camisa e joga". Tem que corrigir o jogador, senão ele vai cometer um monte de erros dentro do campo e ele não é o culpado. O culpado é o treinador que não corrige.
O treinador tem que corrigir, porque a tendência é ele evoluir cada vez mais, acrescentar muito mais. Então você vê o Jean e o Matheusinho, é questão de tempo pra eles chegarem à Seleção Brasileira (Matheus Henrique foi convocado por Tite nesta sexta-feira). É questão de tempo. Não é porque são jogadores do Grêmio, pô, é só ver os garotos jogarem".
O comportamento de Patrick
"É, muito complicado. Mas muito puxão de orelha, muito dinheiro na caixinha, muita chicotada. Faz merda, volta lá para a baixo (base), ficou lá quase um ano. Tem qualidade, então quando você melhorar a cabeça, quiser jogar futebol, te trago aqui para cima. Melhorou, trouxe ele e tem nos ajudado. Está com outra cabeça.
O problema desses garotos é o extracampo. Qualidade eles têm. Então, a gente procura resolver o problema deles lá fora para chegarem aqui e jogarem. Eles têm talento, só que o tempo passa, meu garoto. Há quanto tempo você está lá embaixo? O primeiro garoto que eu trouxe para o profissional foi ele. Fez um monte de merda, volta. É assim que banda toca comigo. Não vou passar a mão na cabeça de ninguém. Ah, são garotos. Eu ensino.
Aí que é o trabalho fundamental dos pais também e do procurador desses garotos também, que eu nem conheço nem quero saber. Mas a maioria deles chegam aqui só na hora de renovar o contrato e pegar o dinheiro. Agora, dar conselho e orientar a garotada lá fora eles não querem. Não são todos, é a maioria. Eles querem vir buscar o dinheiro na hora da renovação do contrato. 'Ah, isso é problema do treinador'. Não, não é problema do treinador. Pelo contrário, o treinador tem que estar com esses garotos com a cabeça boa, que é trabalho da família e do empresário".
Luan vai voltar a ser o de 2017?
"Vai depender dele. Aí eu te pergunto, vocês viram o Luan jogando em 2017, né? Foi o melhor jogador da América, chegou à Seleção Brasileira merecidamente. Aí eu te pergunto, alguém desaprende? Ninguém desaprende a jogar futebol. Ninguém desaprende.
Estou fazendo tudo para ele voltar a ser o Luan. Se ele voltar a ser o Luan, ele pode jogar na Seleção, pode ser vendido para a Europa e vai nos ajudar bastante aqui. E vocês veem o que eu estou dando de oportunidade para ele. Estou conversando com ele, dando conselhos, melhorando a parte física dele. Da minha parte, tudo que eu posso fazer, estou fazendo. Agora, quem entra em campo é ele. Quem entra em campo é o Luan. Espero que ele volte a ser o Luan".