Próximo ao Templo Lama, maior centro budista tibetano de Pequim, ruelas dão uma amostra da China do passado. As chamadas hutongs ainda preservam casas sem banheiros e cozinhas, com moradores compartilhando espaços públicos e fazendo necessidades a céu aberto. A menos de quatro quilômetros, a vívida e iluminada Wangfujing recebe por dia quase 1 milhão de pessoas – ávidas por consumir na principal zona comercial da capital chinesa.
Em 40 anos, as duas Chinas, a antiga, das mercadorias baratas, e a moderna, dos produtos inovadores, ficaram ainda mais distantes por um presente e futuro construídos na velocidade de trens-bala – que somam hoje 27 mil quilômetros de linhas.
Em 1978, Deng Xiaoping, o grande protagonista da abertura econômica da China ao Ocidente, previu que seriam necessários 40 anos de “estabilidade” para superar as dificuldades e conquistar os níveis de qualidade de vida que o povo chinês merecia. Em quatro décadas, a projeção do líder do Partido Comunista não apenas se confirmou, com a retirada de 850 milhões de pessoas da pobreza, como fez nascer a segunda maior economia do mundo.
Há quase 10 anos, o país asiático é o principal parceiro comercial do Brasil, tornando-se recentemente também uma das principais fontes de investimento estrangeiro direto em solo brasileiro.
Alcançado o que muitos chamam de maior feito econômico da história, ao crescer 35 vezes em 40 anos, a China acelera para levar a reforma e abertura até o fim – tornando-se a maior potência econômica até 2049. Se depender da ambição do presidente Xi Jinping, eleito o homem mais poderoso do mundo pela revista britânica The Economist, e das transformações vistas até agora, é difícil duvidar de que a projeção vai virar realidade.
O caminho escolhido para chegar ao topo passa pelas inovações tecnológicas. A China abraça a inteligência artificial, com a geração de dados por todos os lados. São cerca de 200 milhões de câmeras espalhadas pelo país, em todos os lugares possíveis, monitorando a população constantemente com softwares de reconhecimento facial. O banco de dados gerado pelo governo é compartilhado com empresas — que conseguem virar gigantes explorando apenas o mercado interno de quase 1,4 bilhão de clientes.
A ideia de que o desenvolvimento deixaria a China mais aberta e democrática é contraditória quando o assunto é acesso à informação. No país são bloqueados endereços como Facebook, WhatsApp, Gmail, Google, YouTube e Uber — “imitados” em versões próprias. A explicação para a censura vem em formato de analogia.
— O governo é como se fosse o pai da população. Ele controla o uso da internet por entender que alguns sites não são boa influência para seus filhos — afirma Zen Qingjun, gerente-geral da China Rádio e Televisão Network, estatal que administra a maioria dos principais veículos de comunicação.
Mesmo com a restrição, milhões de chineses burlam o sistema com uso de redes virtuais particulares (VPN, na sigla em inglês), serviço que permite aos usuários trocarem a localização e, dessa forma, acessar sites estrangeiros bloqueados.
— Como em qualquer família, existem filhos obedientes e desobedientes. Mas os pais são os pais — completa Qingjun.
Durante 22 dias, a reportagem viveu o dia a dia dos chineses na capital Pequim, onde milhões de pessoas que há 15 anos não conheciam cheques nem cartão de crédito hoje pagam tudo por QR Code no celular — em comércios físico e virtual efervescentes.
— A China tem 5 mil anos de história. E a economia só se desenvolveu nas últimas décadas. Há menos de 10 anos eu era um homem pobre — conta Yan Cheng Sheng, vice-diretor de Colaboração do Ministério do Comércio da China.
No país onde os avanços são quase instantâneos, há muito ainda a conquistar em questões sociais, ambientais e econômicas. Mas a China parece saber exatamente onde, como e quando quer chegar.
* A repórter viajou a convite do Ministério do Comércio da China
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Com marcas próprias, empresas chinesas passaram a buscar seu espaço fora do Oriente, tendo um enorme mercado interno como garantidor de lucro. Agora, é a China que está indo ao mundo.
Propagado big data já é realidade no país asiático, onde o e-commerce é o maior do mundo – representando 40% das transações eletrônicas.
Plataforma digital, criada pela Tencent em 2011, é usada para troca de mensagens, como mídia social, para pagamento de contas via QR Code, marcação de consultas médicas e até para enviar currículos.
China é o principal parceiro comercial do Brasil desde 2009, além de ser o maior investidor direto estrangeiro no país. Cerca de 80% das exportações são de petróleo, minério de ferro e soja.
A revolução econômica chinesa tem um dos principais trunfos calcados em educação, ciência e tecnologia. Somente em 2018, a previsão de novos formandos é de 8,2 milhões de pessoas.
Abundância simboliza o fim da fome, que castigou milhões de chineses no século passado. Os chineses voltaram a conhecer o conceito de propriedade de terra somente após a morte de Mao Tsé-Tung.