Pressionada por liminar do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), a Petrobras suspendeu nesta terça-feira (3) a venda de 60% de quatro refinarias no país, incluindo a Alberto Pasqualini (Refap), em Canoas, na Região Metropolitana.
Conforme analistas do setor de combustíveis, o impasse coloca em xeque o avanço do processo de privatização, anunciado pela estatal em abril. A avaliação dos especialistas é de que a insegurança jurídica em torno do projeto tende a diminuir o interesse de eventuais investidores.
— Com a manifestação do STF, as dificuldades ficaram maiores. O avanço do processo, que já era difícil, não deve ocorrer neste ano – projeta o sócio-fundador da consultoria MaxiQuim, João Luiz Zuñeda.
Anunciada na semana passada, a decisão de Lewandowski proíbe a privatização de empresas estatais sem a autorização prévia do Congresso. O texto tem caráter liminar (provisório) e, por isso, pode ser revertido pelo plenário do STF. A data para a avaliação dos 11 ministros ainda não está definida.
A análise deverá ocorrer a partir de agosto, devido ao recesso das cortes superiores do Judiciário, que se estende durante todo o mês de julho. Em sua manifestação, Lewandowski também convocou audiência pública relacionada ao assunto, sem data confirmada.
— A suspensão da venda pela Petrobras não surpreendeu. Está de acordo com a determinação do ministro Lewandowski. O que surpreendeu, na semana passada, foi a própria liminar — lembra o analista André Henrique Trein, da Fundamenta Investimentos.
A paralisação da venda de refinarias foi divulgada no mesmo dia em que estava previsto o fim do prazo para assinatura de acordo de confidencialidade. A etapa permitiria que possíveis investidores tivessem acesso a dados sigilosos dos complexos envolvidos no processo.
Em junho, a Petrobras havia anunciado a prorrogação desse prazo em 15 dias. A medida foi tomada após a criação de subsídio para o óleo diesel – uma das saídas do governo para encerrar a greve dos caminhoneiros – levantar dúvidas sobre a atração de investidores externos. Ainda no mês passado, a estatal afirmou que havia pelo menos cinco interessados no projeto.
— Quem investe em refino precisa de clareza. Neste momento, o país não tem isso. O subsídio para o diesel bagunçou a política de preços da Petrobras. É natural que haja recuo de possíveis investidores — avalia o diretor da consultoria ES Petro, Edson Silva.
O Sindicato dos Petroleiros do Rio Grande do Sul (Sindipetro-RS) comemorou a suspensão da venda da Refap. Presidente da entidade, Fernando Maia da Costa declara que a privatização criaria riscos à geração de empregos no complexo gaúcho.
— Uma empresa privada não teria compromisso com o desenvolvimento da indústria gaúcha — defende o sindicalista.
Consultada por GaúchaZH, a Petrobras relatou que se manifestaria apenas por meio de fato relevante endereçado a investidores. No texto, a estatal mencionou que as negociações das refinarias "fazem parte do reposicionamento estratégico no segmento de refino, transporte e logística, em linha com o seu Plano Estratégico e Plano de Negócios e Gestão 2018-2022".
Refinaria já teve sócio privado
A Refinaria Alberto Pasqualini (Refap) iniciou suas operações em 1968. Se confirmada, a participação de um sócio privado não seria novidade em Canoas. No começo dos anos 2000, a Repsol adquiriu 30% do complexo gaúcho, em uma troca de ativos entre as companhias. Mais tarde, em 2010, a estatal brasileira recomprou a participação da empresa espanhola por US$ 850 milhões, em valores da época.
— A venda de 60% da Refap não deveria causar alterações na produção de combustíveis. Hoje, sem um sócio privado, a refinaria já consegue atender à demanda por gasolina e diesel no Rio Grande do Sul. Nos últimos anos, a Refap também recebeu investimentos em tecnologia — sublinha o diretor da consultoria ES Petro, Edson Silva.
O projeto que busca parceiros privados para a Petrobras também engloba a paranaense Presidente Getúlio Vargas (Repar), a baiana Landulpho Alves e a pernambucana Abreu e Lima. A intenção da estatal seria criar, nas regiões Sul e Nordeste, duas subsidiárias – cada uma responsável por duas das quatro refinarias. O processo estaria aberto somente a interessados com receita anual de pelo menos US$ 5 bilhões (em torno de R$ 19 bilhões), o que dificultaria a participação de companhias nacionais.
— É um projeto mais voltado a estrangeiros — define o analista André Henrique Trein, da Fundamenta Investimentos.
Além de paralisar a privatização dos quatro complexos, a Petrobras informou, nesta terça-feira, por meio de fato relevante, a interrupção da venda de participações na fábrica de fertilizantes Araucária Nitrogenados, no Paraná, e na Transportadora Associada de Gás (TAG), com ativos nas regiões Norte, Nordeste e Sudeste — o processo da TAG já estava suspenso desde junho devido a uma decisão judicial.
Entenda o que foi suspenso
- A Petrobras interrompeu o projeto de privatização de quatro refinarias: Alberto Pasqualini (Refap), no Rio Grande do Sul, Presidente Getúlio Vargas (Repar), no Paraná, Landulpho Alves, na Bahia, e Abreu e Lima, em Pernambuco.
- A suspensão ocorreu após liminar concedida pelo ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF). O texto proíbe que o governo privatize estatais sem autorização do Congresso.
- Com o projeto de privatização, a Petrobras deseja vender 60% da participação nas quatro refinarias. A parcela dos outros 40% permaneceria com a estatal.
- Segundo a Petrobras, os possíveis interessados deveriam apresentar receita anual mínima de US$ 5 bilhões. A exigência dificultaria a participação de companhias nacionais.
- A estatal buscaria a criação de duas subsidiárias, uma no Sul e outra no Nordeste. Cada uma ficaria responsável por duas refinarias.
- A Petrobras ainda suspendeu a venda de participações na fábrica de fertilizantes Araucária Nitrogenados, no Paraná, e na Transportadora Associada de Gás (TAG), com ativos no Norte, no Nordeste e no Sudeste.