Quando subir ao palco do Dolby Theatre, em Hollywood, neste domingo (4) para comandar a simbólica 90ª edição da cerimônia de entrega do Oscar, o apresentador e comediante Jimmy Kimmel seguirá o tradicional roteiro que busca imprimir no rígido protocolo um tanto de graça, espontaneidade e aquele improviso de risco prévia e providencialmente discutido e calculado.
Assuntos para arrancar da estrelada plateia risos — largos e constrangidos — não lhe faltarão. Das espetadas no presidente americano Donald Trump, passando pelo vexame que marcou o desfecho da festa passada — quando a leitura do envelope errado por Faye Dunaway e Warren Beatty deu a La La Land o Oscar de melhor filme que, segundos depois, foi corretamente entregue a Moonlight —, devem entrar na pauta do apresentador as denúncias de assédio sexual que abalaram os pilares da indústria audiovisual e arruinaram carreiras de personalidades como o produtor Harvey Weinstein e o ator Kevin Spacey — não se falou ainda se as atrizes engajadas na campanha #MeToo usarão novamente o figurino preto como forma de protesto, a exemplo das cerimônias do Globo de Ouro e do Bafta britânico.
A fábula fantástica A Forma da Água entra na disputa de melhor filme com o maior número de indicações (13) entre os nove concorrentes, seguida pelo épico de guerra Dunkirk, com oito, e o drama Três Anúncios para um Crime, com sete. São os três títulos que se candidatam aos principais prêmios em um grupo de produções, que, a exemplo dos último anos, ilustra uma maior diversidade de temas e orçamentos e também mescla entre seus realizadores profissionais consagrados e talentos emergentes (veja abaixo quem tem as melhores chances de se destacar na premiação).
Na TV, duas opções para acompanhar. O canal pago TNT transmite a festa ao vivo a partir das 20h30min — a cerimônia começa às 22h —, com apresentação de Domingas Person e comentários do crítico Rubens Ewald Filho. Carol Ribeiro e Hugo Gloss conduzem as entrevistas no tapete vermelho estarão — movimentação de bastidores que também pode ser vista a partir das 19h no canal E!. A RBS TV entra com a transmissão após o Big Brother Brasil.
Melhor filme
A Forma da Água ganhou a disputa do sindicato dos produtores dos EUA, termômetro quase sempre fiel para medir a temperatura do Oscar — tem na bagagem ainda o prestigiado Leão de Ouro no Festival de Veneza. Três Anúncios para um Crime recebeu o Globo de Ouro em drama, também uma premiação relevante na temporada. Salvo uma espetacular reviravolta, a estatueta vai para um desses, com Dunkirk correndo por fora representando as grandiosas produções que já foram mais valorizadas no Oscar.
Melhor diretor
A entrega, domingo (04), do prêmio do sindicato dos diretores, pode deixar mais claro quem é o favorito. O mexicano Guillermo del Toro, com A Forma da Água, desponta e pode igualar as conquistas recentes de seus grandes amigos e conterrâneos Alfonso Cuarón e Alejandro Gonzalez Iñárritu. Sua ficção cientifica romântica aborda de forma alegórica temas quentes como racismo e intolerância às diferenças. Se a Academia quiser fazer história, pode consagrar Jordan Peele, de Corra!, que seria o primeiro diretor negro a erguer o Oscar da categoria.
Melhor ator
As categorias de atuação, apontam as principais premiações prévias, são favas contadas no Oscar 2018. Encarnando em O Destino de uma Nação o primeiro-ministro britânico Winston Churchill em momento decisivo da II Guerra, Gary Oldman já levou, entre outros prêmios, o Globo de Ouro em drama e os troféus dos sindicatos dos atores e dos críticos. É um grande trabalho, sem dúvida, mas o Oscar também ficaria em boas mãos se fosse entregue, pela quarta vez, a Daniel Day-Lewis, literalmente assombroso em Trama Fantasma, que anunciou ser sua despedida do cinema.
Melhor atriz
Assim como Oldman, Frances McDormand, com Três Anúncios Para um Crime, é uma papa-prêmios da temporada. Seu papel de mãe coragem que luta por justiça, mulher guerreira que se lança contra o sistema, é muito caro aos votantes da Academia. Frances, porém, faz um tipo recorrente em sua trajetória. Sally Hawkins, como a faxineira muda que se apaixona pela criatura anfíbia de A Forma da Água, apresenta uma personagem mais rica. Meryl Streep está nessa briga como intérprete mais vezes indicada na história do Oscar, concorrendo pela 21ª vez com The Post: A Guerra Secreta.
Coadjuvantes
Sam Rockwell, como o policial violento e aparvalhado de Três Anúncios Para um Crime, e Allison Janney, na pele da mãe megera de Eu, Tonya, já ganharam os principais troféus prévios e também devem estar ensaiando uma reação de surpresa para subir ao palco na derradeira e mais importante premiação da temporada. Torcer pelo improvável é o que resta a concorrentes que estão ótimos em seus filmes, como Willem Dafoe (Projeto Flórida) e Richard Jenkins (A Forma da Água) e Lesley Manville (Trama Fantasma) e Laurie Metcalf (Lady Bird — É Hora de Voar).
Filme estrangeiro
A categoria dos bons filmes que fazem o mundo olhar além do umbigo de Hollywood no Oscar não tem este ano um grande favorito. O alemão Em Pedaços, ganhador do Globo de Ouro, ficou de fora da disputa. The Square (Suécia), vencedor da Palma de Ouro em Cannes, é o mais badalado, o que pode ser uma vantagem contra dois fortes concorrentes: Corpo e Alma (Hungria, país que ganhou em 1982, com Mephisto, e em 2016, com O Filho de Saul) e Sem Amor (Rússia, do mesmo diretor que concorreu em 2015 com Leviatã). Completam o grupo Uma Mulher Fantástica (Chile) e O Insulto (Líbano).
Longa de animação
Bem que a Academia poderia tornar menos rotineira a premiação nesta categoria da Pixar/Disney e de outros grandes estúdios, dando maior visibilidade a projetos inventivos de menor porte mercadológico. Contra o favoritismo de Viva: A Vida é uma Festa, da Pixar/Disney, concorre o belíssimo Com Amor, Van Gogh, coprodução entre Polônia, Grã-Bratanha e EUA que recria os traços do pintor holandês sobre atores. Os outros indicados são O Touro Ferdinando, dirigido pelo brasileiro Carlos Saldanha, O Poderoso Chefinho e The Breadwinner.