Greta Gerwig é um nome da hora em Hollywood. A atriz, roteirista e diretora de 34 anos é a responsável por Lady Bird: A Hora de Voar, filme que estreia nesta quinta-feira (15/2) e que é um dos azarões na corrida do Oscar. Em era de zebras, que se sucedem ano a ano desde o momento em que os votantes do maior prêmio da indústria perderam o que restava do pudor em eleger as chamadas produções menores em detrimento dos blockbusters dos grandes estúdios, trata-se de um posto significativo. Mas a ponto de repetir Moonlight, vencedor no ano passado, e Spotlight, no retrasado?
Não é o cenário mais provável. Falta estofo dramático a Lady Bird, que tem mais a cara daqueles filmes independentes simpáticos que angariaram indicações ao retratar de maneira agridoce uma história mais amarga do que propriamente açucarada – quase um clichê do maior prêmio da indústria, que no entanto andava ausente desde a década passada, quando títulos como Juno (2007) e Pequena Miss Sunshine (2006) cumpriram trajetória semelhante.
O que não falta é carisma a Saoirse Ronan, que aos 23 anos alcança a sua terceira indicação, a segunda a melhor atriz (a outra foi com Brooklyn; houve ainda a indicação a atriz coadjuvante, como a pequena delatora arrependida de Desejo e Reparação). Em Lady Bird, a jovem intérprete encarna uma menina de 17 anos, cabelos ruivos e crise adolescente acentuada a ponto de renegar o próprio nome – pede para todos a chamarem não de Christine, mas de Lady Bird, personagem ficcional inventada por ela que sintetiza seu desejo de fugir do contexto em que está inserida.
Esse contexto é o mesmo que a própria Greta Gerwig vivenciou antes de firmar carreira em Hollywood: a provinciana cidade de Sacramento, incompatível com seu desejo cosmopolita por oportunidades e sofisticação. A narrativa se passa em 2002, seu último ano de Ensino Médio, e acompanha seus preparativos para entrar na universidade, além das idas e vindas com amigos, familiares e os primeiros namorados. Os EUA como um todo ainda vivenciavam a crise econômica da virada do século, o que fazia as portas parecerem mais fechadas para ela, aumentando, consequentemente, a sua sensação de inadequação e insegurança quanto ao futuro.
A relação com a mãe (Laurie Metcalf, indicada a melhor atriz coadjuvante), é bastante turbulenta e parece mais determinante para o seu comportamento rebelde, mas é importante prestar atenção também ao tipo de comunicação que ela desenvolve com o pai (Tracy Letts), desempregado, pacato, antissocial e, por isso, o "perdedor" que a indomável garota enxaqueca admira. Beanie Feldstein, uma revelação como a intérprete da melhor amiga, encarna aquele que é o maior dos clichês de Lady Bird: a parceira com a qual ela divide o desgosto pelo culto aos "vencedores", tão presente no ambiente escolar, mas de quem vai se afastar quando ceder ao apelo de tornar-se amiga das meninas mais populares do colégio.
É claro que esse apelo não vai durar muito. A previsibilidade da história, no entanto, é compensada, além do ótimo trabalho de direção de atores, com um roteiro ágil, de poucas elipses, e uma montagem recheada de comentários irônicos – as situações que poderiam causar estranhamento são naturalizadas com o uso de cortes muito rápidos, que abreviam seu tempo de absorção por parte do espectador.
Trata-se de um truque espertinho, que dá um ar de comédia dramática à história, tornando-a mais leve. É, talvez, a principal marca de um certo cinema independente norte-americano deste século 21 e, especialmente, da obra do namorado de Greta Gerwig, Noah Baumbach (de A Lula e a Baleia), com quem ela trabalhou em Frances Ha (2012) e Mistress America (2015) – em ambos como atriz e corroteirista. Antes, Greta já havia dirigido Nights and Weekends (2008), em parceria com Jon Swanberg (da série Easy), que vem a ser um dos pais do chamado mumblecore, rótulo um tanto desabonador de parte desse cinema independente – é usado para identificar os filmes do que seria a "geração do resmungo".
Faz sentido aplicar esse rótulo a Lady Bird. Mas não deixa de ser redutor e, por isso, injusto para com esse simpático primeiro longa-metragem solo de Greta Gerwig, que tenta burilar um estilo próprio pescando referências ao redor de si. Talvez fosse mais interessante seguir a própria Lady Bird e alçar voos mais altos, soltando as amarras para vislumbrar referências mais distantes e menos óbvias.
Lady Bird: A Hora de Voar
De Greta Gerwig.
Drama/comédia dramática, EUA, 94min.
Estreia nesta quinta-feira (15/2) no Brasil.
Em Porto Alegre, pode ser visto no Espaço Itaú e no GNC Moinhos.
Cotação: 3 estrelas (de 5).