Assunto que tem mobilizado empresas que gerenciam aplicativos de transporte, como Uber, Cabify e 99Pop, nos últimos meses, o projeto de lei 28/2017, que regulamenta a atuação desses apps, entrou na pauta de urgência do Senado Federal. Os parlamentares podem decidir nesta terça-feira (31) se aprovam a proposta do deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP), que, entre outros pontos, exige que os carros que trabalham para aplicativos utilizem emplacamento vermelho (semelhante a táxis, ônibus e caminhões que prestam serviços a terceiros) e condiciona a atuação dos apps à prévia autorização dos municípios.
O teor do PL desagradou aplicativos e motoristas. Desde setembro, as plataformas têm enviado aos usuários mensagens convocando a se posicionarem de forma contrária ao projeto. No entendimento dos empresários, alguns pontos excederiam a burocracia, tornando a atuação dos apps inviável. Representantes dos aplicativos e dos motoristas também argumentam que o projeto não foi discutido com a sociedade antes de ir à votação.
"A Uber é a favor da regulamentação do transporte individual privado prestado por meio de aplicativos. No entanto, o PLC 28/2017 não regula essa atividade; ele traz uma proibição velada a todos os apps, pois cria um nível de burocracia tão alto para os motoristas parceiros que torna impossível que continuem servindo as pessoas do jeito que fazem hoje", defendeu a Uber, que declarou ter 500 mil parceiros em todo o Brasil – 30 mil no Rio Grande do Sul –, em nota.
Para o 99Pop, o PL representa "uma proibição disfarçada de regulação" por impor o uso de placa vermelha e condicionar a atividade privada a uma licença municipal – esta semelhante ao que é praticado atualmente –, proibir viagens intermunicipais e o aluguel de veículos. "A 99 entende que a proposta acaba com a oportunidade de geração de renda de centenas de milhares de motoristas e limita o direito de escolha de 17 milhões de usuários de aplicativos. Defendemos uma regulamentação equilibrada e apoiamos o amplo debate sobre a regulamentação de aplicativos com a participação de toda a sociedade de forma democrática", disse a empresa, por e-mail.
Para empresários, há "entraves burocráticos"
Pagamento de tributos, exigência de inscrição do motorista como contribuinte individual do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e de outros documentos relacionados à habilitação e à contratação de seguros estão entre as regras do PL, que se propõe a atualizar a Lei nº 12.587, de 3 de janeiro de 2012, sobre o transporte de passageiros – atualmente, o regramento é feito apenas por municípios, caso de Porto Alegre.
Os pontos polêmicos, na visão de empresários, são os considerados "entraves burocráticos". O mais sensível deles é a exigência de emplacamento vermelho, que "limitaria" a atuação de parceiros, segundo os aplicativos, porque para parte dos motoristas serve de renda complementar, não valendo a pena investir em uma nova placa, além de que há motoristas que alugam veículos para circular. Mas também há críticas à liberação prévia pelos municípios, uma vez que as regras podem mudar de um lugar para outro, e à "falta de diálogo" na elaboração do projeto.
O projeto de regulamentação que deve ser apreciado pelos senadores também mexeu com os ânimos de motoristas que trabalham para as plataformas de transporte, atualmente distribuídos em 48 associações pelo Brasil. Assim como os proprietários dos aplicativos, motoristas acreditam que a exigência de emplacamento específico irá afugentar os profissionais, além de aumentar o custo da operação – o que seria repassado aos passageiros. GaúchaZH tentou contato com o presidente da Associação de Motoristas Privados e de Tecnologias (Ampritec), Reinaldo Ramos, mas ele não atendeu às ligações até o fechamento desta edição.
Em resposta ao PL, que, em abril, foi aprovado pelos deputados federais, empresários dos aplicativos se uniram em torno da campanha #JuntospelaMobilidade, convidando motoristas parceiros e usuários a se mobilizarem e coletando assinaturas em apoio a outro modelo de regulamentação. Pelo menos entre os usuários, o lobby parece ter funcionado: em pesquisa aberta no site do Senado, mais de 200 mil pessoas se disseram contrárias ao PL, contra pouco mais de 40 mil favoráveis. Atualmente, não há regras específicas para a atuação de aplicativos de transporte no país. A regulamentação do serviço é feita pelos municípios.
Senadores gaúchos querem meio termo
Os três senadores gaúchos buscam um meio termo para o projeto que regulamenta os aplicativos de transporte particular, como Uber e Cabify. O senador Acyr Gurgacz (PDT-RO) foi escolhido para ser o relator de plenário, e promete apresentar uma proposta de regulamentação que não prejudique os aplicativos.
O documento a ser apresentado pelo relator seria defendido por Ana Amélia Lemos (PP), Lasier Martins (PSD) e Paulo Paim (PT). Se houver modificação no texto enviado pela Câmara, o projeto volta para análise dos deputados. Como a semana é de feriadão, outra possibilidade é que não tenha quórum para análise de um assunto tão polêmico.
Onde atuam os principais aplicativos de transporte no RS
Cabify: Porto Alegre.
99Pop: Porto Alegre, Canoas, Alvorada, Viamão, Gravataí, Guaíba, Cachoeirinha, Eldorado do Sul, Novo Hamburgo, São Leopoldo.
Uber: a empresa diz que atua em mais de 130 cidades do Estado.
Vennux: Porto Alegre.
O projeto de lei (PLC 28/2017) a ser votado hoje estabelece:
— Que os aplicativos de transporte são um serviço de natureza pública e precisam de autorização municipal para funcionar;
— Que caberá às prefeituras regulamentar ou não os aplicativos;
— Que caberá às prefeituras fiscalizar os aplicativos de transporte;
— Que as prefeituras, ao regulamentar os aplicativos, devem adotar diretrizes mínimas para funcionamento do serviço, como cobrança de tributos municipais, exigência de seguros APP e DPVAT, inscrição dos motoristas no INSS, estabelecer idade máxima e características mínimas para os veículos, exigir que o motorista só circule com autorização municipal, inscrição do veículo na categoria "aluguel", o que exige o uso da placa vermelha.
Como funciona o serviço em Porto Alegre
A relação entre o poder público e os aplicativos na Capital é pontuada por momentos de polêmica. Veja os principais, desde a apreensão de veículos pela EPTC até a regulamentação da lei municipal
Novembro de 2015
— Uber, o primeiro dos aplicativos de transporte individual de passageiros a chegar a Porto Alegre, começa a operação. A EPTC reage, apreendendo veículos sob a alegação de que o serviço é clandestino.
— A Câmara Municipal aprova a proibição dos aplicativos.
Outubro de 2016
— O assunto volta ao Legislativo. Desta vez, para legalizar as plataformas. O texto estabelece, entre outros itens, pagamento de uma taxa mensal por veículo, contratação de seguros, compartilhamento de dados com a prefeitura e limitação a apenas um condutor por carro cadastrado.
Dezembro de 2016
— O então prefeito José Fortunati sanciona a lei e faz alguns vetos, como à emenda dos vereadores do PSOL que previa pelo menos 20% de mulheres motoristas no serviço.
Março de 2017
— O decreto de regulamentação é publicado já na gestão de Nelson Marchezan, prevendo necessidade de credenciamento pela EPTC, carros com identificação visual, entre outras exigências.
Julho de 2017
— Quatro meses depois da publicação do decreto, a prefeitura encaminha à Câmara Municipal um projeto de lei que reitera exigências previstas no decreto e, entre algumas alterações, determina uma cobrança ao motorista de uma taxa por viagem, em vez de um valor fixo por mês, e acaba com o pagamento em dinheiro.
As exigências da legislação municipal
— Regulamentação da lei aprovada pelos vereadores ocorreu em março
— Empresas que forem prestar o serviço deverão protocolar na Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) um requerimento para outorga de autorização
— Carros usados pelos motoristas deverão ter dois tipos de identificação visual: adesivo externo aprovado pela EPTC e adesivo interno referente ao selo de aprovação na vistoria, que também passa a ser obrigatória
— Entrega da relação de veículos que efetivamente prestaram o transporte na Capital no mês anterior.