O vampiro criado pelo escritor irlandês Bram Stoker em 1897 não tem sossego: toda hora é retirado de seu caixão. Em cartaz a partir desta quinta-feira (24) nos cinemas, o terror Drácula: A Última Viagem do Demeter (The Last Voyage of the Demeter, 2023) vem se juntar a um punhado de produções recentes, como a minissérie Drácula (2020), a animação Hotel Transilvânia: Transformonstrão (2022) e a comédia sanguinolenta Renfield (2023).
Escrito por Bragi F. Schut (de Escape Room) e Zak Olkewicz (de Trem-Bala), A Última Viagem do Demeter tem direção do norueguês André Øvredal, do excelente e claustrofóbico A Autópsia (2016), e é baseado no diário do capitão presente no livro de Stoker.
Ator popularizado como o Davos Seaworth da série Game of Thrones (2011-2019), Liam Cunningham interpreta o capitão Eliot, incumbido de transportar da Romênia para a Inglaterra uma carga misteriosa — misteriosa só para os personagens, porque todos os espectadores conhecem o mal que aquelas enormes caixas escondem. A previsibilidade da trama é um problema incontornável — sabemos inclusive que o navio vai naufragar na costa inglesa, como mostra a abertura —, mas ao longo do filme Øvredal vai tomar pelo menos uma decisão que rompe com clichês, gerando duas cenas de forte impacto.
Por falar em clichês, a tripulação do Demeter vive em 1897, mas tem a cara de 2023. O elenco atende aos parâmetros de diversidade da Hollywood atual. Além de um personagem idoso, o capitão Eliot, temos um negro, o médico Clemens (Corey Hawkins, de Em um Bairro de Nova York); um oriental, o cozinheiro religioso Joseph (o filipino Jon Jon Briones, da série Ratched); uma mulher, Anna (Aisling Franciosi, de Imperdoável); e até uma criança, Toby (papel do encantador Woody Norman, de Sempre em Frente).
Já a ambientação e o roteiro vão remeter a filmes icônicos. Há um quê de Titanic (1997) no modo como Toby apresenta o Demeter para Clemens e no conhecimento prévio de seu destino. Por sua vez, o desenvolvimento da história faz lembrar de Alien: O 8º Passageiro (1979). O Drácula vivido por Javier Botet, ator espanhol com 2m05cm visto na franquia Rec, em Mama e em Slender Man, é uma combinação de maquiagem e computação gráfica que alude à caracterização do alemão Max Schreck em Nosferatu (1922), adaptação clandestina do romance de Bram Stoker, mas em alguns momentos pareceu o Gollum da trilogia O Senhor dos Anéis (2001-2003). Uma cena que envolve um machado e uma porta homenageia O Iluminado (1980), e, claro, há referências ao Drácula (1992) de Francis Ford Coppola.
A reciclagem de ideias é bem feitinha e sublinhada pela tensa música composta por Bear McCreary, mas A Última Viagem do Demeter morre na praia. O susto maior vem no final: a pretensão de virar uma franquia. Pobre Conde Drácula.