Não é difícil entender o fascínio provocado pelos dinossauros, principal atração de uma franquia que já arrecadou US$ 5 bilhões e que chega ao fim com Jurassic World: Domínio (2022), em cartaz a partir desta quinta-feira (2) nos cinemas. Assim respondeu o professor e paleontólogo paulista Luiz Eduardo Anelli, autor do livro O Guia Completo dos Dinossauros Brasileiros (editora Peirópolis, 2010), em uma entrevista concedida em 2014:
— Dinossauros nos transportam, em uma longa viagem pelo tempo, a um mundo totalmente diferente do que conhecemos. Foram animais exuberantes, alguns enormes, de anatomia esquisita, com armaduras, chifres, longas caudas e pescoços harmoniosamente projetados. O fato de não conhecermos completamente sua aparência e seus hábitos os revestem com mistérios e enigmas. E seus esqueletos estão escondidos nas rochas, o que torna o trabalho do paleontólogo fascinante, comumente realizado em regiões desérticas, selvagens e distantes, envolvendo perigos e desafios, além de jipes Land Rover estacionados em magníficos acampamentos empoeirados.
Quase todos esses elementos estão presentes na série iniciada por Jurassic Park (1993), versão do diretor Steven Spielberg para um romance do escritor Michael Crichton. Na trama, o bilionário personagem interpretado por Richard Attenborough planeja criar um parque temático em uma ilha na América Central com diferentes espécies de dinossauros revividos por meio de engenharia genética. Visitam o lugar um paleontólogo (Sam Neill), uma paleobotânica (Laura Dern) e um matemático (Jeff Goldblum), que, juntamente com os netos do dono, entram em uma perigosa aventura quando um empregado sabotador faz os bichos escaparem. O filme fez US$ 1,1 bilhão nas bilheterias e ganhou três Oscar: som, efeitos sonoros e efeitos visuais, graças a uma combinação de computação gráfica e bonecos animatrônicos.
Depois vieram O Mundo Perdido (1997), também dirigido por Spielberg e com US$ 618,6 milhões arrecadados, e Jurassic Park 3 (2001), assinado por Joe Johnston e dono do pior desempenho, tanto de público (US$ 368,7 milhões) quanto de crítica — chegou a "concorrer" ao Framboesa de Ouro de pior sequência ou refilmagem. A franquia foi reiniciada com Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros (2015), de Colin Trevorrow, trazendo novos protagonistas: Claire (Bryce Dallas Howard), gerente do parque, e Owen (Chris Pratt), tratador amigo dos dinos. O filme tem a sétima maior bilheteria de todos os tempos — US$ 1,67 bilhão — e abriu caminho para Jurassic World: Reino Ameaçado (2018), de J.A. Bayona, que faturou US$ 1,3 bilhão.
Dirigido por Trevorrow, Jurassic World: Domínio começa de onde Reino Ameaçado terminou: os dinossauros estão espalhados por terra, água e ar, dividindo todo o ecossistema com a humanidade e os outros animais. O filme navega na mesma onda de nostalgia que trouxe Ghostbusters: Mais Além (2021) e Top Gun: Maverick (2022), fazendo uma ponte entre o presente e o passado ao introduzir na nova trilogia os personagens de Neill (Alan Grant), Dern (Ellie Sattler) e Goldblum (Ian Malcolm). O estopim para reunir os três ao trio formado por Howard, Pratt e Isabella Sermon (a menina Maisie, adotada pelo casal) são as ações de um empresário à la Elon Musk, Lewis Dodgson (encarnado por Campbell Scott). À frente da BioSyn Genetics, ele montou um santuário para dinossauros nas Dolomitas, nos Alpes Italianos, onde também pode estar engendrando uma praga de supergafanhotos para ter o monopólio da alimentação no planeta.
O "pode estar" é retórico: desde a primeira aparição sabemos que Dodgson é o vilão. Não há mistério em Domínio (embora haja uma revelação surpreendente que envolve clonagem humana e modificações no DNA), os diálogos são extremamente expositivos, e a música, intrusiva. Salvam-se as cenas de ação com dinossauros que nunca pareceram tão reais — talvez porque nunca tenhamos visto um de verdade para poder comparar...
Pensando bem, o espectador de Domínio pode se ver às voltas com um enigma: como o fascínio pelos dinossauros transformou-se em uma mistura de desprezo e crueldade? Por um lado, os dinos são coadjuvantes de luxo ao longo dos 146 minutos de projeção. Dá vontade de ter à disposição uma tecla de fast-forward, para pular as partes com atores e evitar sentir vergonha alheia pela atriz DeWanda Wise, protagonista da série Ela Quer Tudo (2017-2019) e a Eleanor Love do faroeste negro Vingança & Castigo (2021). Na pele da aviadora e contrabandista Kayla, ela foi penalizada com algumas das piores piadas e frases de efeito da temporada hollywoodiana. Vide "Eu também adoro cabelos ruivos" (cortesia do roteiro escrito por Trevorrow e Emily Carmichael).
Por outro lado, avançar até as cenas de ação seria compactuar com uma postura contraditória e sádica. Este é um filme que discursa sobre a coexistência, mas que vê os dinos quase sempre como ameaças mortíferas e vociferantes, e o tempo todo pela perspectiva humana. Este é um filme em que os "animais exuberantes" citados pelo paleontólogo Anelli são condenados a correr sem parar na caça às pessoas e a uma constante rinha de galo. Predadores como o giganotossauro, que tinham quatro metros de altura e viviam na Argentina durante o período Cretáceo, e o fictício Indominus Rex só existem para nossa perversa diversão, ora devorando bandidos, ora brigando um contra o outro. Essa carnificina espetacularizada não deixa de ser uma resposta enviesada ao que Dodgson afirma na abertura de Jurassic World: Domínio: "Dinossauros podem ensinar mais sobre nós".