Cartaz do Cinemaço da RBS TV na virada deste domingo (7) para segunda-feira (8), à 0h55min, Diamante de Sangue (2006) é um dos muitos filmes de Hollywood que, nos primeiros anos do século 21, adotaram a África como cenário. Mas não como o continente do Nilo e do Kilimanjaro, dos leões e dos gorilas. A aventura com cara de Sessão de Tarde deu lugar a um híbrido de filme-denúncia com entretenimento — o exotismo e a vida selvagem foram substituídos por fome, seca, aids, corrupção, guerra, especulação econômica.
De partida, títulos como Hotel Ruanda (2004), A Intérprete (2005), O Jardineiro Fiel (2005), O Senhor das Armas (2005), Diamante de Sangue e O Último Rei da Escócia (2006) lidam com um dilema: em que pesem suas boas intenções, não estariam os mesmos inseridos num mecanismo de exploração da pobreza, uma vez que seu objetivo maior é o lucro nas bilheterias? (Leia mais sobre os outros cinco filmes logo abaixo.)
O diretor de Diamante de Sangue, o estadunidense Edward Zwick, diz que diversão não exclui conscientização. Ele está certo, como indicam obras de sua própria autoria: Nova York Sitiada (1998), thriller que anteviu a paranoia anti-islâmica dos americanos pós-11 de Setembro, ou O Último Samurai (2003), épico que valorizava a resistência cultural às invasões colonialistas como as perpetradas pelos EUA.
Indicado em cinco categorias do Oscar, incluindo melhor ator (Leonardo DiCaprio), ator coadjuvante (Djimon Hounsou) e edição, o filme que será exibido pela RBS TV se passa durante a guerra civil em Serra Leoa, no fim dos anos 1990. Zwick busca alertar o consumidor de joias de que seu dinheiro pode estar financiando genocídios — conflitos em Serra Leoa e na Libéria mataram 400 mil pessoas entre 1989 e 2003. O diretor também mostra para o grande público a brutal realidade dos exércitos infantis, já comuns nos morros brasileiros dominados pelo tráfico.
Durante as filmagens realizadas em Moçambique e África do Sul, DiCaprio afirmou ter ficado profundamente tocado pelo que viu:
— Se não tivesse visto isso com meus próprios olhos, não poderia imaginar o alcance da miséria. Percebi o indescritível luxo em que vivemos no Ocidente.
Na trama, Danny Archer (DiCaprio), um mercenário sul-africano, e Solomon (Hounsou), um pescador local, têm seus destinos cruzados na busca por um raro diamante cor de rosa. No meio da ação trepidante e de alguns vilões caricatos, entre o romance e a regeneração do protagonista, Edward Zwick aborda o sentimento de culpa que os países ricos têm em relação à África, dilapidada e envenenada — com a insuflação do ódio entre os povos — à época da colonização.
Quem personifica esse sentimento é a repórter americana Maddy (Jennifer Connelly), veterana de coberturas na Bósnia e no Afeganistão. Ela quer revelar para o mundo a trilha sanguinária das pedras, que envolve governos corruptos, empresários imorais, forças paramilitares e nativos escravizados. Mas a destemida Maddy também já está desencantada. Quando Danny insiste em que ela auxilie Solomon, ela diz:
— De que adianta ajudar só uma pessoa?
Diante de um campo de refugiados, ela conta que a TV dos EUA vai mostrar "um minuto entre os esportes e a previsão do tempo".
Para ver também
Hotel Ruanda (2004)
Durante os conflitos políticos entre hutus e tutsis que mataram quase um milhão de ruandenses em 1994, o gerente de hotel Paul Rusesabagina decide abrigar mais de mil refugiados. Com direção de Terry George, concorreu aos Oscar de melhor ator (Don Cheadle), atriz coadjuvante (Sophie Okonedo) e roteiro original. (Amazon Prime Video)
A Intérprete (2005)
Sydney Pollack dirige este thriller estrelado por Nicole Kidman e Sean Penn. Ela faz o papel de uma tradutora da ONU que, acidentalmente, descobre que o presidente de Moboto, um fictício país africano, correrá risco de vida se discursar na Assembleia Geral marcada para daqui a três dias. (Disponível para alugar em Amazon Prime Video e Apple TV)
O Jardineiro Fiel (2005)
Baseado em romance de John Le Carré e protagonizado por Ralph Fiennes, o filme de Fernando Meirelles mostra a África como um laboratório de testes para a indústria farmacêutica. Ganhou o Oscar de melhor atriz coadjuvante (Rachel Weisz). (Disponível para alugar em Amazon Prime Video, Apple TV, Google Play e YouTube)
O Senhor das Armas (2005)
Assumidamente cínico, o filme dirigido por Andrew Niccol e estrelado por Nicolas Cage, Ethan Hawke e Jared Leto retrata o continente africano como um mercado em expansão para a indústria armamentista. (Amazon Prime Video)
O Último Rei da Escócia (2006)
O filme de Kevin Macdonald revê o governo sanguinário e esdrúxulo do ditador de Uganda Idi Amin, nos anos 1970, pelos olhos de um jovem médico escocês (James McAvoy). No papel principal, Forest Whitaker venceu o Oscar, o Bafta, o troféu do Sindicato dos Atores e o Globo de Ouro. (Star+)