Para valorizar o acordo que permitiu o congelamento do orçamento de 2021 nos níveis de 2019, o governador Eduardo Leite atravessou a Rua Duque de Caxias acompanhado do vice, Ranolfo Vieira Júnior, e de secretários para entregar pessoalmente à Assembleia o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias. Com ele estavam os secretários Otomar Vivian, da Casa Civil, e Leany Lemos, do Planejamento, além do procurador-geral do Estado, Eduardo Cunha da Costa, e do líder do governo, Frederico Antunes, todos devidamente protegidos por máscaras.
O que permitiu o acordo inédito foi a consciência dos chefes de poderes e órgãos autônomos de que a receita sofrerá uma queda brutal neste ano e que os efeitos do coronavírus na economia se estenderão para além de 2020. Pesou, também, a mudança no comando do Tribunal de Justiça, hoje presidido pelo desembargador Voltaire de Lima Moraes. O procurador-geral de Justiça, Fabiano Dallazen, e o presidente da Assembleia, Ernani Polo, trabalharam ombro a ombro para viabilizar o entendimento.
No ano passado, quando Leite propôs o congelamento dos gastos dos outros poderes, nas discussões da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), não encontrou receptividade. Mesmo sabendo que a receita seria insuficiente para cobrir as despesas, os poderes e órgãos autônomos resistiram.
A principal oposição veio do Tribunal de Justiça, à época presidido por Carlos Eduardo Duro. Apenas a Assembleia Legislativa comprou a ideia. Os deputados aprovaram o orçamento com reajuste zero e com um déficit escancarado em vez de usar o artifício das “receitas extraordinárias”, que historicamente mascarava o rombo.
Em ação encaminhada pelo Ministério Público, defendendo também os interesses de Tribunal de Justiça, Tribunal de Contas, e Defensoria Pública, o congelamento caiu por decisão judicial. O governo recorreu, mas não teve alternativa senão encaminhar a proposta de orçamento de 2020 prevendo reajuste de 4,06%, equivalente à reposição da inflação. A Assembleia emendou a proposta e restabeleceu o congelamento.
De novo, o Ministério Público recorreu e o Judiciário deu liminar obrigando o Executivo a repassar o duodécimo dos poderes, com exceção do Legislativo, corrigido em 4,06%. Ainda em 2019, o governo recorreu ao Supremo Tribunal Federal, que em vão tentou um acordo entre as partes. Como a decisão não saiu até agora, nos primeiros meses deste ano o governo repassou as parcelas com a correção de 4,06%. Foi assim a pandemia derrubar as receitas do Estado e obrigar os chefes de poderes e órgãos autônomos a sentarem para rediscutir o orçamento deste ano e o de 2021.
Depois de uma série de reuniões, chegou-se a um valor de R$ 150 milhões de contribuição dos poderes para o enfrentamento ao coronavírus. Proporcionalmente, a Assembleia entrou com a maior parte, já que só ela não tivera correção no seu orçamento. O valor global que os poderes toparam abrir mão ainda era inferior à correção envolvida na disputa judicial.
Na discussão das diretrizes para a elaboração do orçamento de 2021, chegou-se ao acordo de congelamento dos valores nos níveis de 2019, o que significa, em tese, dois anos sem aumento de despesas. Judiciário, Ministério Público, Defensoria e Tribunal de Contas concordaram em devolver mais uma parte de 2020 para, enfim, restabelecer o congelamento que o governador tentara em 2019.
A projeção de déficit de R$ 7,9 bilhões é otimista. Se o cenário econômico piorar e se concretizar o cenário mais crítico, os valores terão, obrigatoriamente, de ser revistos. Não há mais como o Executivo suportar sozinho a frustração de receita, como vem suportando há cinco anos, com atrasos no pagamento de servidores e fornecedores.
Mão de seis dedos
Empolgado com o pacto entre os poderes, o presidente da Assembleia, Ernani Polo (PP), fez uma analogia inusitada em seu discurso na entrega da LDO:
— Eu poderia fazer uma comparação desse momento que estamos vivendo com a mão. Uma mão de seis dedos, que representam nossos poderes e instituições – declarou, em referência aos órgãos com autonomia financeira.
Polo ainda fez uma elucubração citando que alguns objetos podem ser carregados com os dedos, enquanto outros apenas com uma ou mais mãos, para elogiar o espírito de solidariedade do ato:
— Todas as mãos juntas, com todos os dedos que cada mão possui, fazem a diferença para que a gente possa fazer essa travessia (da crise) da melhor forma possível.