O avanço de 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, no segundo trimestre, é uma surpresa positiva, mas aponta que dificuldades seguem no país, avalia Rafael Cagnin, economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). Na entrevista a seguir, Cagnin cita sinais de alívio e de preocupação na economia brasileira.
Como avalia o desempenho da economia nacional no segundo trimestre?
A alta de 0,4% do PIB é uma surpresa positiva, mas não reverte o quadro de reação fraca e insuficiente para recompor tudo o que foi perdido na crise.
O que destaca no resultado?
O que puxou para cima foi a construção, que antes não dava sinais de recuperação. Essa melhora veio do segmento habitacional, da construção urbana, principalmente em grandes centros. Ao que parece, é uma reação muito concentrada em regiões maiores, focada em segmentos de faixa de renda mais elevada. O dado que surpreende, por causa da magnitude, é o da indústria de transformação, que cresceu 2%.
O que mais preocupa?
O consumo das famílias andou de lado (avanço de 0,3%). Está relacionado ao desemprego e ao trabalho informal, que gera vagas com rendimento incerto. O perfil dos empregos que estão sendo criados não ajuda a evolução do consumo e da economia como um todo. As linhas de juro a pessoas físicas no Brasil são exorbitantes. Isso também freia a demanda por bens de maior valor. O quadro talvez melhore um pouquinho com o novo ciclo de cortes na taxa Selic. O problema é que esse processo é lento.
A turbulência externa aumentou nos últimos meses. O quanto isso afeta a retomada da economia brasileira?
Tudo depende da gravidade do que vai acontecer. Por ora, há uma apreensão. O comércio internacional vem desacelerando. O Brasil, inclusive, protagoniza uma das tensões geopolíticas, na questão da Amazônia. O quadro faz com que não possamos contar com a demanda externa para acelerar nossa recuperação. É um fator preocupante.
E quais são os impactos da crise na Argentina?
Prejudica muito a indústria. A Argentina é o principal parceiro do Brasil no comércio de produtos manufaturados, principalmente da cadeia automobilística. Toda a situação externa joga para o setor interno a responsabilidade de acelerar a recuperação da economia. Os investimentos de empresas em máquinas e equipamentos, medidos pelo indicador de formação bruta de capital fixo (FBCF), deram passo à frente no segundo trimestre (alta de 3,2%). Agora, é importante que não recuem. O ruído com o governo no setor externo não ajuda a criar ambiente mais propício para retomada consistente dos investimentos. Também é preciso ter linhas de crédito mais acessíveis no país. A aprovação da reforma da Previdência e a melhor comunicação do governo ajudariam a reduzir incertezas, mas não resolveriam toda a equação.
O que mais é necessário para que a retomada ganhe fôlego?
O país também precisa de investimentos em infraestrutura, com concessões à iniciativa privada e resgate de investimentos públicos. É preciso encontrar espaço no orçamento. Uma opção ao investimento público é usar parte dos recursos de privatizações para o término de obras que começaram e foram deixadas de lado. Essas obras gerariam demanda para muitos setores da economia e avanços em logística.